Vinte mulheres nuas dançam em palco ao som de “Bolero”, de Ravel, num trabalho que a encenadora Mónica Calle equipara ao da construção de um caminho ou de uma casa. Trata-se de uma nova etapa de “Ensaio para uma cartografia”, um trabalho iniciado em 2014 e que, em 2017, subiu ao palco da sala Estúdio do Teatro Nacional D. Maria II, e que regressa esta quarta-feira ao mesmo local, numa nova etapa.
“Isto é um trabalho que tem a ver com a duração no tempo”, disse à agência Lusa Mónica Calle, acrescentando que o projeto deverá terminar em 2021. Um trabalho situado a meio de um caminho a percorrer durante sete anos, um caminho que é, simultaneamente, um percurso individual e em conjunto.
“Um caminho que se vai percorrendo como quem constrói uma casa, um lugar de pertença, um lugar de conjunto”, um caminho que se constrói também a partir da falha, do erro e da sua superação, com a resiliência de quem constrói uma vida, um percurso que assenta no conhecimento e superação dos limites e da imperfeição, “ao mesmo tempo que procura o absoluto e o transcendente”, como explicou Mónica Calle.
A música de fundo é “Bolero”, de Ravel, uma obra orquestral do compositor francês, uma melodia que evoluiu em círculos, repetitiva, acumulando instrumentos e tensão, que continua, até ao momento, segundo a encenadora, a ser “estruturante”, nesta fase do trabalho do “Ensaio para uma cartografia”, em que se conjuga “música com ballet clássico”.
Nesta peça onde 20 mulheres se expõem tanto quanto testam os seus limites de resistência, Mónica Calle trabalha também a duração do tempo. “Não apenas o da duração do espetáculo, mas o da duração do próprio tempo”, enfatizou.
Nesta etapa, algumas das atrizes estão a iniciar o trabalho, a “entrar” no “Ensaio para uma cartografia”, acabando também por “contaminar” as que transitavam da primeira etapa, disse ainda a encenadora à Lusa. “Ensaio para uma cartografia” partiu do texto “Os sete pecados mortais”, de Bertolt Brecht, e durará tantos anos a trabalhar quantos os pecados enumerados por Brecht.
Este espetáculo é também a construção de uma família, “a procura de uma religação, através do erro, da falha, da insegurança, da inevitabilidade da imperfeição, da fragilidade e da transformação do corpo, mas também da força, da exigência e do rigor”, afirma a encenadora, que conclui: “Sobretudo, [este espetáculo] visa celebrar a vida”.
Em 2017, Mónica Calle estreou-se no D. Maria II com a primeira parte de “Ensaio para uma cartografia”, um espetáculo que teve três semanas de apresentações esgotadas. A peça vai estar em cena até 29 de abril, com espetáculos às quartas, às 19h30, de quinta-feira a sábado, às 21h30, e, aos domingos, às 16h30.
Com encenação e cenografia de Mónica Calle e direção musical do maestro Rodrigo B.Camacho, a interpretação é de Alexandra Viveiros, Ana Água, Brígida de Sousa, Carolina Varela, Cleo Tavares, Eufrosina Makengo, Inês Pereira, Inês Vaz, Joana Campelo, Joana de Verona, Lucília Raimundo, Mafalda Jara, Maria Inês Roque, Marta Félix, Míu Lapin, Mónica Calle, Mónica Garnel, Roxana Lugojan, Sílvia Barbeiro, Sofia Dinger e Sofia Vitória.
O vídeo é de Marcelo Pereira e Ana Maria Bastos, e a assistência de encenação de José Miguel Vitorino. “Ensaio para uma cartografia” tem coprodução da Casa Conveniente/Zona não vigiada e do Teatro Nacional D. Maria II.