Os dois maiores partidos anti-sistema de Itália, o Movimento 5 Estrelas (M5S) e a Liga (ex-Liga Norte), anunciaram esta sexta-feira que chegaram a acordo para governar. O programa comum apresentado propõe impostos reduzidos, deportação de meio milhão de migrantes e fim das sanções à Rússia, entre outras medidas. Terá agora de ser aprovado pelos apoiantes dos dois partidos para ser apresentado ao Presidente, Sergio Mattarella, na segunda-feira.

“Estes foram 70 dias muito intensos”, admitiu o líder do Movimento 5 Estrelas, Luigi di Maio, num post de Facebook onde apresentou o programa conjunto. “No final, conseguimos alcançar o que anunciámos na campanha eleitoral”, disse.

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Posted by Luigi Di Maio on Friday, May 18, 2018

O programa, intitulado “Contrato pelo Governo da mudança’, será agora apresentado às bases dos dois partidos para ser aprovado. O 5 Estrelas conduz esta sexta-feira uma votação online, enquanto a Liga organizará uma votação por todo o país durante o dia de sábado.

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As principais medidas plasmadas no documento incluem uma redução drástica de impostos, passando a Itália a ter apenas dois escalões, de 15% e 20%, aplicado tanto a cidadãos como a empresas. De acordo com o Corriere della Sera, a medida terá um custo líquido de 26 mil milhões de euros, que os dois partidos esperam compensar através de um aumento do consumo que seria estimulado pela redução de impostos.

O mesmo jornal explica que o 5 Estrelas e a Liga propõem uma série de medidas de apoio às famílias, como o IVA zero para produtos relacionados com a gravidez e com crianças. Para além disso, em termos económicos, os dois partidos propõem um rendimento mínimo básico de 780 euros para as famílias mais carenciadas e um recuo na reforma das pensões iniciada em 2011.  E, noutra frente, o programa prevê a deportação de 500 mil migrantes que se encontram atualmente em solo italiano — uma medida que não espanta tendo em conta a posição fortemente anti-imigração da Liga.

Ao contrário do que acontecia numa primeira versão do documento que foi divulgada, este acordo final tem menos críticas à União Europeia (UE). Já não se pede um regresso à Europa “pré-Maastricht” que, explica o Financial Times, foi interpretado por alguns como um desafio às regras fiscais aplicadas após esse tratado. Agora, os dois partidos pedem só um regresso às “origens” da UE: “Acreditamos que é necessário rever a estrutura da governação económica europeia que é assimétrica, baseada no domínio do mercado em vez de se concentrar nas suas dimensões económicas e sociais mais amplas.”

Está por isso afastada, pelo menos para já, qualquer tentativa de abandonar a zona Euro. Mas isso não significa que os dois partidos anti-sistema não naveguem contra a corrente dominante noutras matérias: o programa conjunto propõe o fim das sanções europeias a Moscovo, por exemplo.

Juros da dívida italiana sobem

A UE reagiu às primeiras notícias sobre um possível acordo ainda na quinta-feira, pela voz do vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis, que avisou que o Governo italiano deve manter-se fiel à disciplina fiscal europeia e ao desígnio de redução da dívida. “Esta é a nossa mensagem para o novo Governo. É importante manter o rumo”, disse Dombrovskis.

A reação dos mercados ao programa da Liga e do 5 Estrelas não foi a melhor. Os juros da dívida italiana a 10 anos subiram para 2,2%, o valor mais alto desde outubro. Recorde-se que Itália tem a segunda maior dívida da Europa, ficando apenas atrás da Grécia, que corresponde a 132% do PIB.

A nível interno, uma das principais críticas ao novo programa veio da primeira ministra negra do país, Cécile Kyenge. “É muito difícil para mim ver um partido que aceita que é racista a gerir a lei, que é suposto proteger toda a comunidade”, disse Kyenge referindo-se à Liga. A ex-ministra da Integração — e atualmente eurodeputada — ficou conhecida por uma proposta de lei para atribuir a nacionalidade a cerca de 800 mil menores de idade, filhos de imigrantes, que não foi aprovada. A sua ação valeu-lhe fortes críticas e ataques racistas como o do senador Roberto Calderoli, ex-ministro de Silvio Berlusconi, que a comparou a um orangotango.

As negociações para formar um Governo italiano duram desde 4 de março, dia de eleições legislativas. Os resultados dessa votação não deram uma maioria clara a nenhum partido, razão pela qual o 5 Estrelas e a Liga estiveram em negociações desde então. Oficialmente, os dois partidos não chegaram ainda a acordo sobre quem será o primeiro-ministro.