Este treino tinha hora certa e local. Às três da tarde em ponto. No Jamor. Acabaria por ser adiado na véspera, uma hora e 45 minutos adiado.
E chegada a hora, lá se avistaram as camisolas de treino, de um distinto verde-Sporting, a ascender pouco a pouco ao relvado. No começo eram poucas, duas mãos-cheias. “Ui, mas tu queres ver que…” Afinal não. Todos ascenderiam. Todos. O plantel completo, sem nenhuma ausência à primeira vista — e a primeira vista era uma vista lá de longe, distante dos jornalistas (e fotógrafos, e os obturadores de fotógrafos a disparar incessantes, e câmaras, tantas câmaras em direto) que no Estádio Nacional se acotovelavam, entrincheirados numa porção exigia de tartan.
Bas Dost não foi o primeiro a ser avistado. Mas destacava-se dos restantes. Por ser matulão, sim, mas sobretudo por ter a cabeça envolta em ligadura. Podence, esse, há muito que não vai a jogo. Mas recuperou de lesão e nas últimas semanas já vai a treino. Logo se apoderou da bola, Podence. Um malabarismo aqui, um chuto para o alto depois, para descomprimir, outro malabarismo, que ele é disso. Os restantes também a queriam tocar. Havia “fome” de bola, depois de uma semana sem treinos (pelo menos entre o plantel) após a violência que invadiu a Academia. Enquanto se saciavam, e antes mesmo de o treino começar “à séria”, Jesus aproximou-se de Dost, que evidenciava postura cabisbaixa, tinha o rosto cerrado, e pergunta-lhe — o que perguntou e como perguntou não se ouviria mas o gesticular do treinador assim o indiciava — se está OK. O holandês acena afirmativamente e o treino lá segue.
E segue como se fosse só mais um treino. Não era só mais um. Depois de tudo o que se passou — e pode ainda passar –, não era. Mas parecia.
Aquando da corrida em volta do relvado, ou corridas, uma, duas, três, quatro voltas completas só para início de conversa e aquecimento da musculatura, havia conversas entre jogadores, Montero com Battaglia, Coentrão e Rúben Ribeiro. E estes últimos não só conversavam como gargalhavam. Dost não. Dost seguia o grupo mas corria por fora, sem expressão, ainda “vazio” — como o próprio se descreveria após o ataque onde foi aquele que mais (e mais visíveis) mazelas guardou. Nos restantes não existiam quaisquer mazelas. Não nos rostos — e dizia-se que Montero e Jesus as tinham. Ou em parte alguma. Talvez por dentro. Só aí.
A corria parou e o plantel (Rafael Leão, André Pinto e Bruno César treinaram à parte, limitados, Piccini e Doumbia, lesionados, nem treinariam) continuaria o aquecimento num canto (mais distante dos olhares de todos) do relvado. Jesus, acompanhado do roupeiro Paulinho, começaria a colocar barreiras para os exercícios que se seguiram — e os olhares não assistiram, porque o treino aberto só duraria breves 15 minutos. Na última barreira que espetou sobre a relva, já próximo dos jornalista e do tartan, ergueu o polegar esquerdo no ar e soltou apenas uma palavra de cortesia. “Então, boa tarde!” E foi boa. Melhor do que as últimas por certo.