Diz o ponto número 1 do capítulo 24 das regras para o Campeonato do Mundo da FIFA que “a exibição de mensagens políticas, religiosas ou pessoais em qualquer idioma ou forma por jogadores e oficiais durante o jogo, seja nos equipamentos ou no próprio corpo, é proibida”.

Foi esta a imperativa regra que dois futebolistas da Suíça, Granit Xhaka e Xherdan Shaqiri, quebraram na partida frente à Sérvia de onde os suíços saíram vitoriosos por duas bolas contra uma. Ao marcarem os golos que deram a vantagem à seleção helvética, tanto Xhaka como Shaqiri cruzam os polegares um no outro para simularem uma águia com as mãos.

Está longe de ser uma celebração tão inocente como a de um Pauleta a homenagear o açor: a águia destes dois suíços é um símbolo nacionalista albanês. E é uma crítica vincada aos nacionalistas sérvios que pode aprofundar ainda mais as tensões entre os dois países.

Xherdan Shaqiri, filho de pais albaneses, nasceu no Kosovo, uma província anteriormente anexada à Sérvia que há precisamente dez anos declarou independência. Granit Xhaka também nasceu no Kosovo no seio de uma família albanesa. Acontece que a Sérvia, o país que a Suíça confrontou na sexta-feira, não reconhece a independência do Kosovo e isso torna muito tensas as relações diplomáticas entre os dois países e dentro dos Balcãs. Ao homenagearem o país de onde os pais vêm, Xherdan Shaqiri e Granit Xhaka estão a ser acusados pelos nacionalistas de recusar as origens sérvias, o que pode ser considerada uma mensagem política à luz das regras impostas pela Federação Internacional de Futebol para este Campeonato do Mundo na Rússia.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A história pessoal de Granit Xhaka adensa ainda mais essa teoria: o pai deste jogador do Arsenal, cujo irmão está na seleção nacional da Albânia, foi preso e espancado na ex-Jugoslávia por ter participado na luta pela do Kosovo. Foi por causa disso que a família de Granit Xhaka, assim como a de Xherdan Shaqiri fugiram para Suíça, numa altura em que muitas famílias kosovares rumavam à Europa Ocidental em busca de paz.

Quando entrou em campo para defrontar a Sérvia, Shaqiri já estava a fazer uma declaração política que não passou despercebida à FIFA: ele entrou em campo com a bandeira do Kosovo costurada a uma bota e a da suíça costurada na outra. Questionado sobre esse assunto já no final do jogo, Shaqiri respondeu: “Eu penso nisso, mas não quero falar sobre isso. No futebol, vive-se muito as emoções. Pode-se dizer que aquilo que fiz foi apenas uma resposta emocional e que estou feliz por ter marcado o golo. Fiz aquilo, mas não precisamos falar sobre isso.”

Por sua vez, Granit Xhaka explicou: “Francamente, não eram os meus adversários que me interessavam. Aquilo foi para o meu povo, que sempre me apoiou. Para aqueles que não me negligenciam na minha terra natal, onde estão as raízes dos meus pai”.

O treinador da Suíça foi mais longe: “Nunca se deve misturar política e futebol. Deve-se  mostrar respeito sempre”, disse Vladimir Petkovic. E concluiu: “É uma atmosfera maravilhosa e uma experiência positiva e é isso que o futebol deve ser.” Já o treinador sérvio não quis comentar o caso: “Eu não lido com coisas destas. Sou um homem dos desportos e é isso que eu vou continuar a ser.”

Mais claro foi Jovan Surbatovic, secretário-geral da federação sérvia, que assumiu que iria escrever uma carta à FIFA sobre aquilo a que chamou “o caso das chuteiras, uma questão de várias bandeiras polémicas e a comemoração dos dois golos pela Suíça”.

A FIFA ainda não se pronunciou sobre o caso, mas as entrelinhas do regulamento do Mundial dizem que ninguém pode ser diretamente punido por mostrar uma bandeira nacional. Isso pode jogar a favor dos dois futebolistas suíços, mas cai por terra se a Federação achar que aquela ação foi “uma provocação ao público em geral”. Se essa for a leitura do órgão que gere o futebol mundial, Granit Xhaka e Xherdan Shaqiri podem ser condenados a uma suspensão durante dois jogos.