Mulheres violadas em grupo, filhos obrigados a violar as próprias mães, canibalismo. São estas as atrocidades denunciadas por uma equipa de investigadores de direitos humanos das Nações Unidas na República Democrática do Congo, avança a Reuters. O cenário que paira sobre a região de Kasai, no centro do país presidido por Joseph Kabila, é de autêntico terror.
Os peritos que estão a monitorizar o conflito em Kasai acreditam que, tanto a milícia do falecido Kamuina Nsapu, como o grupo armado Bana Mura e as forças governamentais congolesas (FARDC) são responsáveis por estes crimes de guerra e contra a humanidade. O relatório apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU dá conta de uma série de ataques cometidos desde 2016, altura em que ali se iniciaram os conflitos armados.
Entre os testemunhos, há rapazes que foram obrigados a violar as próprias mães, raparigas pequenas a quem foi dito que poderiam utilizar balas em nome de feitiçarias, e mulheres que foram forçadas a escolher entre a violação em grupo e a morte. As descrições feitas são de episódios cruéis: “Uma vítima contou-nos, em maio de 2017, que viu milicianos de Kamuina Nsapu a usar genitais femininos como medalhas“, indica o documento.
Algumas testemunhas contam ter visto pessoas a cortar, cozinhar e a comer carne humana, incluindo pénis cortados de homens ainda vivos e de cadáveres, e a beber sangue humano”, pode ler-se no relatório, referindo que estas atrocidades eram “especialmente cometidas por membros das FARDC”.
O investigador Bacre Waly Ndiaye contou ao Conselho de Direitos Humanos que, só num incidente, 186 homens e rapazes, de uma só aldeia, foram decapitados pelos milicianos de Kamuina Nsapu e que muitas das crianças foram obrigadas a lutar apenas com paus, acabando mortas por armas de fogo. Os corpos foram depois deixados em valas comuns ou amontoados em camiões.
Numa reunião do Conselho dos Direitos Humanos realizada na terça-feira, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, mostrou-se particularmente preocupado pelas situações de violência em “Kivu Norte e Sul e nas regiões de Kasai”. Zeid Ra’ad al-Hussein relembrou que entre janeiro e maio deste ano houve um aumento das violações cometidas, na ordem das 2.858, comparativamente com as 2.332 registadas no mesmo período de 2017 — “e a escala real de violações é certamente muito maior”, reforçou.
Estes crimes não afetam apenas as vítimas: destroem a credibilidade das autoridades responsáveis pela proteção, incitando as pessoas a criar ou a juntarem-se a grupos de auto-defesa”, disse Zeid Ra’ad al-Hussein, apelando ao governo que “tome as medidas necessárias para garantir que os autores destas violações de direitos humanos vão pagar pelos seus crimes”.
Em reação ao relatório apresentado, um porta-voz do governo afirmou, em declarações à Reuters, que as denúncias feitas dizem “claramente respeito uma campanha de imprensa com motivações políticas que nada têm que ver com justiça”.