Há mais de quatro mil investigadores à espera que a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) divulgue o resultado do concurso ao Emprego Científico na Modalidade de Apoio Individual. Estão à espera e vão continuar, pelo menos mais um mês, porque a FCT falhou o prazo de anúncio dos resultados a que se tinha comprometido.
Joana (nome fictício) — que preferiu não ser identificada nem pelo nome, nem pela instituição de acolhimento — é uma das investigadoras à espera do resultado do concurso. O contrato de Investigador FCT que tinha terminou no final de junho, como o de muitos outros investigadores no país. E tal como aconteceu a muitos outros Investigadores FCT, a instituição não a contratou, nem arranjou uma solução para o problema da investigadora, que continua a trabalhar como sempre, mas agora sem receber por isso.
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Como anunciado no edital, o período de apresentação de candidaturas para o concurso de 2017 no dia 16 de fevereiro de 2018, às 17 horas. O mesmo edital dizia: “Os resultados da avaliação são comunicados aos candidatos e às instituições de acolhimento, no prazo estimado de seis meses, após a data limite de apresentação de candidaturas”. Os seis meses expiraram, mas os resultados da avaliação não apareceram.
Este concurso deveria ter acontecido ainda em 2017, mas foi sendo sucessivamente adiado. Os investigadores que não se candidataram a bolsas de pós-doutoramento (porque estes concursos foram extintos) acabaram por candidatar-se ao Emprego Científico na modalidade individual. Muitos terão acabado o doutoramento há menos de cinco anos, por isso só se podem candidatar à posição de investigador júnior, que representa mais de metade das candidaturas recebidas e admitidas.
A FCT chegou mesmo a anunciar que os resultados seriam conhecidos no final de julho, conforme referiu em reunião com a Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), a 28 de junho, ou segundo o documento do Observatório de Emprego Científico, atualizado a 10 de julho. Mas, a 31 de julho, o que os investigadores encontraram na página da FCT e nos seus emails foi a informação de que “os resultados do CEEC [Concurso Estímulo ao Emprego Científico] Individual 2017 serão divulgados na semana de 17 de setembro de 2018”.
O adiamento do anúncio dos resultados, contrariando aquilo a que se tinha comprometido, foi justificado pela FCT com “elevado número de candidaturas admitidas a concurso” e com o objetivo de evitar “o período em que muitas instituições estão encerradas”. Isto porque as instituições podem ter de intervir no período de audiência prévia, em que os candidatos podem contestar os resultados da avaliação e seriação.
Cláudia Botelho, presidente da Associação Nacional de Investigadores em Ciência e Tecnologia (ANICT), diz que esta justificação não faz sentido, porque os resultados podiam ser anunciados na data prevista e, excecionalmente, o período de audiência prévia, normalmente de 10 dias, podia ser alargado para, aí sim, dar margem às instituições que estão encerradas. Ainda assim, acrescenta, as instituições não vão estar fechadas até 17 de setembro, porque as inscrições dos novos alunos começam logo no início do mês.
A investigadora reconhece que a existência de mais de quatro mil candidatos, para 500 vagas, exige um processo moroso de avaliação, mas se o resultado de outros concursos que estão a decorrer já tivesse sido conhecido, haveria menos investigadores a concorrerem a todas as oportunidades que aparecem, à espera que uma delas resulte num contrato de trabalho. Mais, Cláudia Botelho considera que a FCT deveria ter previsto que haveria muitos investigadores a concorrer e ter-se precavido com aumento o número de pessoas nos painéis de avaliação.
Nesta altura, era suposto que o concurso de 2018 já tivesse sido aberto. No aviso de abertura do procedimento concursal de 2017, é referido que ao concurso de 2017 “se seguirá a abertura de concursos em 2018 e 2019, até julho dos respetivos anos, para o apoio individual para financiamento de contratos para investigadores doutorados no âmbito da presente legislatura”. O documento do Observatório de Emprego Científico, atualizado a 16 de agosto, diz que o “o concurso de 2018 deve abrir até setembro de 2018”.
Pedro Figueira não quis esperar. Depois de um pós-doutoramento e um contrato de Investigador FCT no Centro de Astrofísica da Universidade do Porto foi-se embora para o Chile. “Não houve nenhuma oportunidade de contrato ao mesmo nível — já para não falar de uma proposta de contrato permanente no instituto, como sugerido no contrato de Investigador FCT”, disse ao Observador. “Assim sendo, para continuar a realizar o meu trabalho, pelo menos com as mesmas condições, resolvi candidatar-me a uma posição no ESO [Observatório Europeu do Sul].”
Os contratos Ciência (em 2007 e 2008) e os contratos Investigadores FCT (lançados em 2012) eram contratos por cinco anos, pagos pela FCT, para selecionar os melhores investigadores a nível nacional e garantir-lhes a integração nas instituições onde poderiam desenvolver um grupo de investigação. Para cada um destes programas estava previsto selecionar mil investigadores. Também estava previsto que, findos os cinco anos, os investigadores fossem avaliados e contratados pelas instituições de acolhimento. Mas nem foram avaliados, nem foram contratados. E muitos deles estão agora à procura de um novo contrato com o programa de Estímulo ao Emprego Científico.
Ao contrário de Pedro Figueira, Joana não está preparada para sair do país. Com 43 anos e dois filhos na escola, tem a vida estabilizada na cidade onde vive e onde quer continuar a trabalhar. Enquanto espera (e desespera) pelos resultados, continua o seu trabalho, tem alunos de mestrado e doutoramento que dependem dela, artigos científicos para rever e publicar e projetos de investigação com outros colegas que não podem parar. “Parar de trabalhar é matar a possibilidade de um dia conseguir um contrato.” Mesmo sem salário.
O Observador enviou perguntas à FCT sobre este assunto, mas, até ao momento, não foi possível obter qualquer resposta.