Os fabricantes chineses não são exímios na concepção e produção de automóveis, pelo menos segundo a bitola europeia. Não andam muito longe, ou pelo menos não estão tão longe quanto estavam há cinco ou 10 anos atrás, mas o standard ainda não é igual aos dos europeus, americanos, japoneses ou coreanos. Agora que foram à Lua na nave Ghang’e 4 e levaram consigo o veículo Jade Hare 2, importa saber como é novo veículo chinês, produzido especificamente para circular do outro da Lua. Será que é melhor do que o utilizado pelos americanos? É que conduzir no único satélite da Terra pode ser tecnologicamente interessante, mas está longe de ser uma estreia, pois a primeira “voltinha” sobre rodas por aquelas bandas foi realizada há quase 48 anos.

A face escura da Lua, não é escura. Apenas nunca é visível a partir da Terra

Os astronautas chineses escolheram o lado mais distante da Lua para alunar. Não por ser mais difícil, mas porque nunca lá ninguém tinha estado – a nave americana Apollo 8 sobrevoou a região em 1968, quando orbitou o satélite – e porque se alguém pretender montar um rádio-telescópio, é provável que ali esteja mais protegido das rádio-interferências provenientes da Terra. Mas, ao contrário do que se pensa, em parte por causa do álbum publicado em 1973 pelos Pink Floyd, The Dark Side of the Moon, o lado menos visível da Lua não é necessariamente menos iluminado, pois ambos gozam de duas semanas de luz solar, seguidas de outras tantas de noite.

A diferença é que a Lua orbita em torno da Terra e a cerca de 385.000 km de distância, oferecendo sempre a mesma região (cerca de 59% do total) virada para o nosso planeta, daí que o restante seja “dark” não por ser mais escura, mas sim por ser mais desconhecida (e sem comunicações a partir da Terra, sempre que as naves espaciais estão “do outro lado”). Ainda assim, o lado mais distante da Lua é conhecido desde que a sonda soviética Luna 3 o fotografou em 1959 (os soviéticos publicaram mesmo o primeiro Atlas da região em 1960), e desde que os astronautas a viram e filmaram em 1968, durante a missão Apollo 8.

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Yutu 2 sucede a Yutu

A nave chinesa Chang’e 4 alunou a 2 de Janeiro, numa cratera (Von Kármán) com 186 km de diâmetro, com o centro espacial chinês a receber informações e fotos através de um satélite de comunicações a fazer de relé, uma vez que não há possibilidade de comunicar por sinais rádio directamente com o nosso planeta. Doze horas depois da chegada da Chang’e 4 à Lua, os chineses retiraram a partir de Terra por controlo remoto – uma vez que tanto a nave como o veículo não são tripulados – o “rover” que viajou no interior do módulo espacial. Baptizado Yutu 2, por ser uma evolução do Yutu utilizado em situações similares na viagem de 2013, o veículo está encarregue de se passear pelo lado mais distante do satélite.

Com um peso de 140 kg, 1,5 metros de comptimento e seis rodas motrizes, obviamente eléctricas e direccionais (as da extremidade), o Yutu 2 vai recomeçar a sua exploração a 10 de Janeiro, estando equipado com câmaras panorâmicas, um espectrómetro por raios infravermelhos e outro para analisar a composição química das amostras através de raio-X de partículas alfa, este último colocado na extremidade de um braço robótico, para colocar o espectrómetro junta do objecto a estudar. À semelhança do Yutu, o seu sucessor está dotado de um radar capaz de penetrar no solo, para estudar a sua composição e estrutura. O aspecto mais curioso é que o Yutu 2 transporta consigo uma pequena estufa , dentro da qual estão sementes de Arabidopsis, para que os cientistas estudem a possibilidade de fazer crescer plantas na Lua, uma tarefa complicada, pois a temperatura durante a fase em que está exposta à luz solar atinge 127ºC, o que dura 13,5 dias, para no período seguinte, já sem a presença do Sol, cair para -180ºC.

Os painéis produzem energia eléctrica para fazer funcionar o Yutu 2, obviamente apenas durante os 13,5 dias da fase diurna, sendo previsível que revele o mesmo desempenho do seu antecessor, que apesar de ter sido concebido para operar durante três meses, a trabalhar numa área de 3 km2, acabou por funcionar durante 31 meses e percorrer cerca de 10 km. Quando finalmente o Yutu 2 deixar de funcionar, vai passar a integrar o grupo de 80 veículos que os humanos já “estacionaram” na Lua.

É o carro lunar chinês melhor do que os outros?

É certo que a tecnologia não pára de evoluir, mas o equipamento a bordo do Yutu 2 não difere muito dos outros veículos, igualmente não tripulados enviados para Marte, como é o caso do Curiosity, que está em funcionamento no planeta vermelho desde 2012, apesar de ter sido inicialmente concebido para uma missão de dois anos. Contudo, este veículo é substancialmente maior, com um peso de 900 kg e 2,9 metros de comprimento.

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Ainda maior do que o Yutu 2 e o Curiosity foi o veículo lunar que serviu nas missões Apollo 15, 16 e 17, que mais parecia um buggy de quatro rodas, alimentado por bateria e com quatro motores de 0,25 kW, um por cada roda. Produzido pela Boeing e General Motors, esta geração de veículos era capaz de transportar dois astronautas, pesavam 210 kg e tinham 3,1 metros de comprimento. Um deles, o utilizado na Apollo 17, detém o recorde da distância percorrida na Lua, com 35,74 km.

Para a China, esta ida à zona menos conhecida da Lua tem tanto de político como de científico. Se, por um lado, permite que os chineses se assumam como a 3ª potência espacial, depois dos EUA e da Rússia, por outro lado, expõe o enorme atraso que têm face aos seus “concorrentes”, que se passeiam pelo satélite terrestre desde 1969 (Apollo 11), enquanto os chineses só pensam ter um dos seus astronautas a caminhar pela superfície da Lua em 2030, ou seja, 61 anos depois.