É difícil encontrar aspetos em que o Presidente Marcelo seja parecido com o Presidente Cavaco. Mas Marcelo identifica um: a ideia de celebrar o aniversário do mandato presidencial junto das comunidades não é uma originalidade marcelista, e “o seu a seu dono”. Portanto, “como veem”, “há realidades em que sou cavaquista”, disse o Presidente perante uma vasta plateia de portugueses e angolanos que o ouviam na Escola Portuguesa de Luanda, naquele que foi o último momento da visita de Estado de quatro dias a Angola. Todos riram e aplaudiram porque, de facto, talvez só nisso é que Marcelo Rebelo de Sousa se assemelhe a Cavaco Silva.
E a Eanes, Soares ou Sampaio, de resto. É o próprio que se individualiza. “Em todas as realidades em que está em causa o país e a afirmação de Portugal no mundo, aí todos os Presidentes, de Eanes a Sampaio, a Soares, a Cavaco Silva e a mim próprio, têm uma coisa que nos une e que é muito superior ao que, porventura de estilo, possa separar-nos — o que nos une é Portugal“, disse, distinguindo-se a ele próprio dos restantes em matéria de “estilo”.
É isso que une todos os Presidentes de Portugal, tal como é isso que une toda a plateia ali presente, entre portugueses e angolanos: o amor a Portugal e a Angola. Marcelo faz deste “amor” um trunfo político: é através disso que insta os empresários portugueses a investir em Angola e vice-versa, dizendo-lhes ao ouvido que os “compreende”. Aí dirige-se para aqueles que têm “raízes”, não aqueles que apenas investem para levar dinheiro para Portugal. E para mostrar que os compreende, fala do avô — “que chegou a Angola e aqui ficou e criou raízes, e aqui acabaria por passar o resto da sua curta vida”.
Portanto, “só quem sabe o que é ser-se filho ou neto de quem emigrou é que sabe um bocadinho o que é a vossa maneira de viver Portugal: uma mistura de saudade mas também de orgulho, esperança e amor”, sublinhou do alto de um palco montado para o receber, numa escola onde estudam duas mil crianças, sobretudo portuguesas e angolanas.
Foram essas raízes, que “falam muito fundo no coração”, que permitiram este novo ciclo de relações bilaterais. Não foram os 35 acordos assinados, foi sim a “vontade dos povos” que levou ao desbloquear de todo o processo. E que pena Marcelo tem de não passar mais tempo a percorrer o território angolano. Se pudesse, disse, passava um mês a percorrer todo o território, de norte a sul. “Mas teria de pedir autorização à Assembleia da República, o que duvido que dessem, até porque poderia ser entendido como uma preferência presidencial por Angola”, ironizou. E há coisas que só dizem “ao travesseiro”. A plateia aplaudiu entusiasticamente.
Seguiram-se duas horas de selfies: terminado o discurso, um mar de gente posicionou-se genuinamente em fila indiana para tirar uma fotografia com Marcelo. O cenário parecia o de um casamento: sem beber água nem almoçar, quase a criar “raízes”, o Presidente recebeu um a um todos os que estavam na fila.