No que resta já do final da comício do Vox, arrumado a um canto da Praça de Colombo — mais precisamente na Praça Margaret Thatcher —, um grupo de jovens, cada um com uma bandeira de Espanha pelos ombros, olha compenetradamente para os seus telemóveis. E, quando os levantam, não é com boa cara.

“Esperava mais, confesso”, diz Miguel Sánchez Esteban, estudante de gestão, de 19 anos. Vestido de camisa, calças bege e ténis no mesmo tom, Miguel agarra com a mão esquerda na bandeira que leva aos ombros e usa a direita para gesticular enquanto fala. E o que leva do resultado que o Vox obteve este domingo — 10,3% e 24 deputados, abaixo do que previam as sondagens — é que, para a próxima, o partido de Santiago Abascal terá de ser diferente. “O Vox tem as ideias certas, mas apresenta-as de forma agressiva. Isso assustou muita gente, tenho a certeza disso.”

Ainda assim, Miguel assegura que os próximos tempos “vão ser muito bons para o Vox”. O jovem estudante de gestão crê que o partido vai, a partir de agora “acalmar-se”. “Vai ter um tom mais moderado e, com isso, vai tomar a dianteira da direita”, explica.

O Vox ficou com 10,3% dos votos e 24 representantes no Congresso dos Deputados — um salto para se tornar no quinto maior partido de Espanha, mas, ainda assim, um resultado aquém das sondagens

Esta foi a primeira vez que votou — e já há cerca de um ano que sabia que, quando houvesse eleições, seria o Vox a sua escolha. “Quem me deu a conhecer o Vox foram uns amigos, que me mostraram umas páginas de Instagram. Quando vi como eram, percebi logo que era aquilo que eu queria”, diz. Para Miguel, explica, o Vox era mesmo o partido de que ele estava à espera:

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“E não era só eu. São todos os jovens ‘bem’ de Espanha, todos os jovens de direita de Espanha queriam um partido destes para poderem finalmente votar num partido que defende Espanha. Espanha acima de tudo!”.

Sobre Santiago Abascal, sublinha a sua estratégia de redes sociais. “Ele sabe falar connosco. Ele sabe a importância do Instagram. Sabia que o Santiago Abascal é o líder político espanhol com mais seguidores no Instagram?”. (Na verdade, não é: o líder do Vox tem 250 mil seguidores naquela rede, mais do que Sánchez, Rivera, Iglesias ou Casado. Mas menos do que os 270 mil de Carles Puigdemont.)

A batalha da rua do PSOE contra o prédio do Vox, em dia de eleições

Ao lado, Miguel tem o seu amigo e colega de curso Jaime López Ibor, que demonstra também alguma frustração com o resultado do Vox. “Prometia muito mais, prometia muito, muito mais”, diz, também ele com a bandeira pelas costas, calças também bege, camisa e uma camisola atada à cintura. Jaime, apesar da desilusão, logo procura realçar o que é para si o lado positivo: “Fico contente por entrarmos agora no Congresso dos Deputados, onde vai passar a ser dito aquilo que ninguém ousava dizer. E não nos esqueçamos da Andaluzia, sim? Na Andaluzia, o Vox conseguiu formar um pacto de governo. É um orgulho chegar a esse ponto, em tão pouco tempo, na região que tem mais trabalhadores em toda a Espanha”.

Enquanto Jaime fala, alguns dos resistentes do comício — quando já é quase meia-noite, não estão ali mais do que 20 pessoas — vão ter com o seu amigo Miguel e passam-lhe a palavra: “Vamos todos para o Arts Club”. É lá que é o after do Vox.

Jaime e Guillermo, a caminho do “after” do Vox

“Vamos lá?”, pergunta Miguel. De telemóvel na mão, vê que não estamos longe. Assim que começa a ir a pé, junta-se outro jovem, amigo e eleitor do Vox. Guillermo Ramos Morales tem 18 anos e raramente tira o telemóvel da mão. No ecrã, saltam-lhe notificações a cada momento. É ele o criador da conta de Instagram Patriotismo Fiel, cujos posts a favor dos três partidos da direita — mas sempre com destaque para o Vox — são vistos por mais de 15 mil seguidores todos os dias.

Story no Instagram de Guillermo, onde mostra o momento em que votou

“Se o Vox teve o resultado que teve na Andaluzia, foi por causa da minha conta de Instagram”, diz, notando que metade dos seus seguidores estão naquela região.

Guillermo caminha a passo acelerado pelas ruas do bairro de Salamanca, um dos mais abonados de Madrid. É a este ritmo que faz a análise dos resultados do Vox em relação ao que as sondagens previam. “Penso que manipularam as sondagens, de forma a dar a entender que o Vox era muito forte e para depois chegarmos a este ponto e parecermos mais fracos”, diz. Ainda assim, garante, a força continuará:

“Este partido é muito recente, mas viste como já mudou o país e a maneira como se fala de política? Os jovens, como eu, já falam de política sem medos. Já falamos à vontade, sem medo de sermos prejudicados pelas nossas ideias”.

Estamos a chegar ao Arts Club, número 96 da Rua de Velázquez. Os seguranças abrem-lhes a passagem e eles passam. E, quando olham à volta, ai junto à porta, parecem apanhar a segunda desilusão da noite. “Não está ninguém…”, lamenta Miguel. Além de uma mesa corrida, com umas dez pessoas, e outras poucas que bebem um copo encostados ao balcão, não há ninguém. Os empregados do bar, que está enfeitado com luzes verdes à Vox, estão longe de estarem atarefados. “Vamos embora?”, sugere Jaime. “Vamos”, respondem os dois amigos.

Já quando estão voltar para trás, veem outro grupo de apoiantes do Vox, que conhecem de vista. Ao contrário de Miguel, Jaime e Guillermo, este grupo opta por uma indumentária menos “juventude partidária de direita” e mais “claque de futebol”. “Podemos juntar-nos?”, pergunta Miguel. “Claro, claro, venham”, responde José, um dos membros deste novo grupo. E entramos todos de novo no bar.

José está chateado com isto tudo. Quando lhe perguntamos o que pensa dos resultados, responde apenas: “Uma merda”. Respondemos-lhe que é um facto que os resultados estão aquém do que indicavam as sondagens, mas que também é factual que o Vox entra no Congresso dos Deputados com algum estrondo — e pela primeira vez. Copo meio vazio ou copo meio cheio, afinal? “Eu preferia mesmo era que ele estivesse a transbordar. E agora quem está a festejar são os cabrões do PSOE.”

Perguntamos a José porque votou no Vox. “Porque é um partido que me representa.” Perguntamos-lhe porquê. “Representa as minhas ideias.” Quais? “Todas.” E, depois, despede-se: “Um prazer”.

Enquanto isto, lentamente, abre-se uma espécie de clareira à nossa volta, com várias pessoas a afastarem-se. Alguns olham-nos com desconfiança. E eis que, por fim, aparecem os seguranças do bar. “Tem de sair, a organização não quer cá jornalistas.”