Cerca de 200 antigos políticos acumulam atualmente uma subvenção vitalícia com a sua pensão, num valor superior ao limite legal, devido a um “enredo jurídico” — ou seja, a uma falha na lei que, para o Tribunal de Contas, pode permitir que mais políticos possam continuar a usufruir das subvenções e a acumulá-las com as suas pensões.
O alerta foi feito numa auditoria do Tribunal realizada há um ano e divulgada pela TSF esta segunda-feira. Ao todo, de acordo com dados de 2018 enviados pelo ministério do Trabalho à rádio, 216 dos 322 beneficiários de subvenções vitalícias acumulam-nas com as suas pensões de reforma.
Os políticos em causa podem usufruir dessa acumulação porque requereram a subvenção antes de a lei ser alterada, em 2005. Contudo, o Tribunal de Contas considera que o “enredo jurídico complexo, originado pela fragilidade do processo legislativo”, é de tal forma intrincado que pode permitir que outros titulares de cargos públicos possam vir a requerer a subvenção — e pede por isso à Assembleia da República que clarifique a lei.
A auditoria de 2018 avaliou em concreto os ex-deputados da Assembleia Legislativa da Madeira mas, de acordo com fonte oficial do Tribunal, “as conclusões e observações” do relatório “aplicam-se a todos os titulares de cargos políticos”, como esclareceu à TSF a mesma fonte.
E onde está o vazio legal? O Tribunal de Contas explica que tudo começou em 1987, quando o Parlamento estabeleceu um “limite” à acumulação da subvenção vitalícia com as pensões de reforma. Só que esse limite — correspondente ao ordenado de um ministro — constava de dois decretos de lei que tinham sido revogados duas semanas antes, criando assim um “buraco” na lei.
Esse “buraco” ali permaneceu até 1995, altura em que a Assembleia voltou a inscrever o limite na lei. Contudo, o vazio que durou entre 1987 e 1995 permitiu a vários políticos requerer a subvenção e acumulá-la com a pensão, pois a alteração na lei não teve efeitos retroativos.
Ao longo do último ano, o Parlamento não tem esclarecido à TSF se recebeu a auditoria em causa. De acordo com a estação, a presidência detetou “recentemente” que a auditoria nunca foi enviada aos deputados e requereu-a ao Tribunal, apesar de esta estar disponível no site. A Assembleia da República irá agora avaliar, através das comissões competentes, se a lei deve ou não ser clarificada.