O Governo quer que os contratos de trabalho no setor privado reflitam medidas para a conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional. Para isso, apresentou esta sexta-feira aos parceiros sociais uma “proposta de compromisso” sugerindo, por exemplo, que empresas e trabalhadores negoceiem regimes de horários “favoráveis e flexíveis”. Entre as medidas está ainda a criação de um grupo de trabalho no âmbito da concertação social para discutir o tema da conciliação. Os trabalhos iniciam-se em julho.

Quando, em dezembro do ano passado, foi apresentado o ‘Programa 3 em Linha’ para a conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional – tanto no público como no privado – o Governo comprometia-se a propôr “em sede de concertação social, a aprovação de uma orientação para que os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho prevejam medidas que promovam condições de conciliação”. Seis meses, a proposta chega aos parceiros sociais.

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Há medidas iguais às que o Executivo de António Costa já tinha divulgado no ‘3 em linha’ – nomeadamente a majoração do abono de família em função da idade nos primeiros seis anos de vida ou o reforço em equipamentos sociais, como creches – e há outras, menos concretas, que implicam uma sensibilização dos parceiros sociais junto dos seus associados, para que os contratos coletivos contemplem, por exemplo, “regime de horários favoráveis à conciliação nas diferentes fases da vida e a articulação de diferentes instrumentos de flexibilidade neste plano”.

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Na “proposta de compromisso” que entregou aos parceiros sociais, o Governo apela a uma definição “do horizonte 2019-2021 como anos de promoção da conciliação entre trabalho e vida familiar e pessoal”, nomeadamente na contratação coletiva. Pede ainda aos parceiros que assumam o tema como prioritário “na sua esfera de atuação”, desenvolvendo iniciativas de conciliação e “disseminação destas temáticas na sociedade portuguesa”. E quer que os parceiros sociais sinalizem “esta prioridade junto dos seus associados”. O objetivo é estimular, por exemplo, “horários favoráveis à conciliação” ou “instrumentos de flexibilidade”. Mas não os detalha, nem define a aplicação dos mesmos.

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Há, por outro lado, medidas que serão da competência do Governo. Por exemplo:

  • Reforço do investimento em equipamentos sociais – como creches – para melhorar a cobertura de respostas, “nomeadamente para crianças até 3 anos, nas áreas metropolitanas, bem como outras respostas para pessoas com deficiência ou dependência”.
  • Lançamento de uma campanha nacional de sensibilização “para as questões da conciliação”, em articulação com os parceiros sociais.
  • Melhoria do programa Escola a Tempo Inteiro , com o lançamento de cinco projetos-piloto para o 2.º ciclo, “assegurando horário de atividade entre as 9h e as 17h30”.
  • Prosseguimento da majoração do abono de família nos primeiros 6 anos de vida e alargamento da majoração para os agregados familiares com duas ou mais crianças nos primeiros 12 meses de vida (até agora é aplicada apenas entre os 12 e os 36 meses).
  • Um programa de formação destinado a empresário, gestores e profissionais de recursos humanos sobre a conciliação, em conjunto com os parceiros sociais.

Por fim, o Executivo quer que seja criado um grupo de trabalho para discutir as medidas para a conciliação com os parceiros sociais.

Algumas das propostas apresentadas já tinham sido anunciadas no ‘3 em Linha’, em dezembro – por exemplo, o reforço das creches para crianças até aos 3 anos nas áreas metropolitanas. Questionado pelo Observador no final da reunião da concertação social desta sexta-feira sobre que avanços se verificaram desde o o anúncio, o ministro do Trabalho e Segurança Social, Vieira da Silva, respondeu que essa “não é uma medida que se resolva com um estalar de dedos”. Acrescenta que “tem havido uma política de alargamento do apoio público à rede de creches” existente, nomeadamente no setor social, mas reconhece “lacunas nas áreas metropolitanas”.

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“Há um compromisso de,  num prazo que naturalmente não é de meses, mas num prazo curto, também aqui poder existir uma maior cobertura que permita que os preços de acesso a esses equipamentos sejam mais baixos. Também na região de Lisboa tem havido aumento dos acordos de apoios a esses equipamentos, mas o Governo está a trabalhar para alargamento da rede nessa área”, disse o governante. Mas não avançou datas nem números concretos.

Sindicatos dizem que medidas não respondem aos “problemas nucleares”

Após a reunião da concertação social, João Torres, da comissão executiva da CGTP, disse que as medidas “não respondem aos problemas nucleares”, como a precariedade ou a desregulação dos horários de trabalho. E considera que a ideia de conciliação do Governo é a de que “as mães e os pais não vão estar com os filhos, mas estejam tranquilos que os filhos não ficam na rua nem sozinhos em casa”. “Não são medidas para resolver o problema”, rematou. Ainda assim, a intersindical está disponível para participar no grupo de trabalho.

O mesmo acontece com a UGT. A sindicalista Lucinda Dâmaso diz, porém, que há uma questão “prioritária” para a central sindical: é preciso um apoio às famílias “que ficam em casa a tratar de pessoas com deficiência ou pessoas idosas” e que não têm onde as deixar durante o dia.

Já o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Vieira da Silva, afirmou que “a primeira dimensão para facilitar a conciliação é criar condições para que exista vida profissional”. E acrescentou que “há algumas dimensões que têm de ser mudadas para facilitar a conciliação”, como a “diminuição da instabilidade das relações laborais”. “Sem empregos, sem capacidade de ter uma carreira, o problema da conciliação põe-se de uma forma muito diferente.”