Luís Marques Mendes não poupa nas críticas ao PS e ao PSD nas propostas de alteração do Estatuto do Ministério Público (MP) que apresentaram na Assembleia da República. Classificando as mesmas como “manobras”, o comentador político afirmou na SIC que a “classe dirigente dos dois partidos parece incomodada com o combate à corrupção”. Daí tudo fazer para “tentar ‘controlar’, ‘domesticar’ e limitar os poderes da justiça. Em vez de darem mais meios de investigação às polícias, as cúpulas do PSD e do PS passam a imagem que o que mais desejam é politizar a justiça para a tentar controlar”, afirmou.
O comentador é particularmente cáustico com os socialistas. “O PS, em particular, depois do caso Sócrates, devia ter mais pudor”, censurou.
Na semana em que o Sindicatos dos Magistrados do Ministério Público realizou uma greve de três com uma adesão de quase 100%, em protesto contra as propostas do PS e do PSD, fez um rasgado elogio à atuação de Marcelo Rebelo de Sousa por, a 24 horas do início da paralisação dos procuradores, ter feito questão de divulgar um telefonema de apoio que tinha feito à procuradora-geral Lucília Gago. “Um ataque cirúrgico mas brutal a estas manobras do PS e do PSD. Ao divulgar um telefonema que fez à PGR, Marcelo disse duas coisas essenciais: que o combate à corrupção é essencial; e que, para tal, a autonomia do MP é decisiva”, afirmou Marques Mendes.
Marques Mendes elogiou igualmente a “excelente intervenção de Ramalho Eanes” numa conferência que ocorreu na associação SEDES “sobre a sociedade portuguesa e a “epidemia da corrupção”. E recordou que o Conselho da Europa “puxou as orelhas” a Portugal por “ainda não ter implementado várias recomendações internacionais para melhor prevenir o fenómeno da corrupção.”
A propósito deste relatório do Grupo de Estados contra a Corrupção (GRECO) do Conselho da Europa, uma das instituições mundiais mais prestigiadas sobre este tema, o comentador afirmou que não sabe “se hoje há mais ou menos corrupção que no passado”. Uma coisa é certa, acrescentou:
Ela [a corrupção] está mais visível porque nunca como hoje foi tão forte o combate à corrupção em Portugal. E isso é muito positivo. Mas há duas entidades que, ao contrário, não parecem felizes com a situação: os dirigentes do PS e do PSD.”
A arrogância do PS
Marques Mendes analisou ainda as declarações de Carlos César, líder parlamentar do PS, e de Ana Catarina Mendes, secretária-geral adjunta do PS, sobre as legislativas de outubro. “Foram claros: o PS quer mesmo uma maioria absoluta”, disse
Apesar de entender que argumentos a favor (baixo desemprego e melhores salários, equilíbrio orçamental e incapacidade da oposição”, o ex-líder do PSD considera, por outro lado, que “falta um projeto mobilizador” e que o estado do setor da saúde e a elevada carga fiscal são argumentos que podem dificultar o alcance desse objetivo. Pior mesmo, só os “receios de poder absoluto” e os “tiques de arrogância e insensibilidade” que o PS tem vindo a revelar.
Mendes recordou que quando António Guterres não conseguiu alcançar o objetivo da maioria absoluta em 1999 (ficou apenas a um deputado dos 116 deputados necessários), verificou uma “depressão psicológica nos dirigentes do PS”. Esse é o risco de pedir a maioria absoluta: “se não conseguir ter uma maioria absoluta, a vitória eleitoral do PS vai ter um sabor a derrota.”
Apesar de ter elogiado o facto do PS ter definido esse objetivo ambicioso que lhe permitirá governar sozinho (“a clareza é boa conselheira”), o ex-líder do PSD considera que o fez “da pior maneira possível. Com tiques de arrogância à mistura. E a arrogância mata”, sentenciou.
Para fundamentar a sua opinião, Marques Mendes deu vários exemplos da “arrogância” do PS:
- “As declarações da Secretária de Estado da Justiça, Anabela Pedroso, sobre os atrasos no Cartão do Cidadão. Dar a entender que a culpa dos atrasos é das próprias pessoas não é só insensatez. É arrogância. Só vi destas insensibilidades no fim do cavaquismo. Mas aí foi ao fim de 10 anos de poder!”
- “As declarações de Centeno sobre o caos na Saúde, a dizer: ‘Nunca tivemos tantos médicos e enfermeiros.’ O não reconhecimento de falhas e problemas revela uma insensibilidade social gritante, quando o SNS rompe pelas costuras e tem mais uma greve de médicos à vista. Parece o discurso do oásis de Braga de Macedo nos anos 90.”
- “E, mais grave de todas, as declarações de Carlos César a atacar violentamente o BE e demais parceiros da geringonça. Percebe-se o objectivo: virar as costas à esquerda para ocupar o espaço do centro”.
Neste último caso, Marques Mendes foi particularmente cáustico com Carlos César. “Se o objetivo é falar para os eleitores do centro, o mensageiro é o pior possível. César não é um político respeitado nem considerado pelo eleitorado do centro”, diz. Por outro lado, Mendes considera a mensagem do PS contém “um triplo erro”:
- “é uma mensagem de ingratidão para com BE e PCP que colocaram o PS no poder e aguentaram 4 anos de governo”;
- “depois, é um exercício de cobardia. César diz isto agora, que acabou a legislatura, não tendo tido a coragem de o dizer antes”;
- “é mais um exercício de arrogância”.
Marques Mendes diz que “tudo isto é mortal. Com estes tiros nos pés, o PS não ganha a maioria absoluta. Perde votos ao centro e à esquerda. Uma maioria absoluta exige: humildade, respeito e diálogo.” E deixa um alerta para António Costa: “se o primeiro-ministro não põe ordem na casa, vai ter uma via sacra no futuro”, conclui.
Rui Rio “pode passar uma ideia de medo ou de deserção” ao não ser cabeça-de-lista
Comentando a decisão de Rui Rio de avançar com os nomes de jovens como cabeças-de-lista para Lisboa e Porto, noticiada pelo semanário Expresso, Marques Mendes diz que “as primeira impressões são positivas”. Em primeiro lugar, pelo “efeito surpresa”. Depois pela “ideia de renovação, de refrescamento e de abertura”. E, finalmente, porque os nomes “são bons: Margarida Balseiro Lopes, líder da JSD, é uma jovem competente; Filipa Roseta é uma mulher de qualidade; Hugo Carvalho é outro jovem promissor”, classificou.
Contudo, o ex-líder do PSD não deixou de apontar pontos negativos a estas escolhas, em nome do realismo. “Pode ter um efeito negativo na dinâmica das campanhas, levando á desmobilização da máquina partidária. Estas figuras representam um refrescamento mas não são figuras de primeiro plano”, afirma.
Mas Mendes fez questão de recordar as eleições europeias em maio para enfatizar o seu ponto: “o PSD tinha um bom cabeça de lista e perdeu clamorosamente. O PS tinha um mau cabeça de lista e ganhou com quase 12 pontos de vantagem.”
Por outro lado, podem ser “decisões sem efeitos eleitorais. Em termos de votos, os candidatos pesam pouco. Em eleições legislativas, quase ninguém vota em deputados. A maior parte dos eleitores nem sequer os conhece. Vota-se em partidos e eventualmente num candidato a primeiro-ministro”. Por isso mesmo, considera Mendes, Rui Rio deveria ser o cabeça-de-lista ou por Lisboa ou pelo Porto. “O líder tem de ser o primeiro a dar cara. Esta ideia pode ser boa mas pode passar uma ideia de medo ou de deserção”, diz.