Há mais de três anos, no verão de 2016, Portugal realizou todo o período de estágio, de preparação e de recuperação em Marcoussis. A localidade, nos arredores de Paris, tornou-se o principal antro de jornalistas, de curiosos e de apoiantes da Seleção Nacional. Marcoussis, ao longo do mês que durou o Euro 2016 que Portugal acabou por conquistar, tornou-se uma das palavras mais ouvidas nos noticiários, uma das palavras mais repetidas quando se falava de futebol e da Seleção e uma das condições fulcrais para o sucesso da equipa comandada por Fernando Santos. O apoio dos emigrantes portugueses, a ideia sempre presente de que estavam a jogar em casa, o calor de dezenas ou centenas de adeptos que recebiam o grupo logo após os jogos, foi tão importante como o pontapé de Éder.

Este domingo, logo depois de almoço, Portugal entrava em campo contra o Luxemburgo num pequeno estádio da capital do grão-ducado, com um relvado que deixava a desejar e fazia parecer que se assistia a um qualquer jogo das divisões inferiores. Ainda assim, o Stade Josy Barthel era este domingo totalmente português: desde à multidão que se juntou em uníssono ao hino nacional, passando pelo apoio constante durante toda a partida e terminando nas bandeiras, nas tarjas e no vermelho que coloria por inteiro duas bancadas do estádio. Tal como em Marcoussis, Portugal estava em casa. E sentir-se em casa era meio caminho andado para conquistar a importante vitória que valia o apuramento direto para o Euro 2020.

Ficha de jogo

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Portugal-Luxemburgo, 2-0

Qualificação para o Euro 2020

Stade Josy Barthel, em Luxemburgo (Luxemburgo)

Árbitro: Jesús Gil Manzano

Luxemburgo: Moris, Jans, Chanot, Gerson, Carlson, Vincent Thill (Joachim, 82′), Barreiro Martins (Sinani, 74′), Skenderovic, Turpel (Thill, 59′), Rodrigues, Deville

Suplentes não utilizados: Schon, Bohnert, Hall, Malget, Selimovic, Philipps, Martins, Da Mota, Bensi

Treinador: Luc Holtz

Portugal: Rui Patrício, Ricardo Pereira, José Fonte, Rúben Dias, Raphael Guerreiro, Bruno Fernandes (Rúben Neves, 90′), Danilo, Pizzi (João Moutinho, 62′), Cristiano Ronaldo, André Silva (Diogo Jota, 71′), Bernardo Silva

Suplentes não utilizados: José Sá, Beto, Cancelo, Rúben Semedo, Éder, Bruma, Gonçalo Paciência, Domingos Duarte, Mário Rui

Treinador: Fernando Santos

Golos: Bruno Fernandes (39′), Cristiano Ronaldo (86′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Deville (7′), Chanot (16′)

Depois da vitória inequívoca aplicada à Lituânia no Algarve, a Seleção Nacional dependia então apenas de si própria para não ter de depender do playoff de acesso ao Europeu. A positiva exibição global contra os lituanos, onde Bernardo foi magistral e Cristiano Ronaldo afastou os rumores de que estava limitado fisicamente com um hat-trick, fez com que Fernando Santos optasse por apresentar o mesmo 4x4x2. Ainda assim, o selecionador nacional fazia três alterações no onze e lançava Raphael Guerreiro no lugar de Mário Rui, Danilo no lugar de Rúben Neves e André Silva no lugar de Gonçalo Paciência. Em termos táticos, o sistema era então o mesmo: Danilo como peça mais recuada do meio-campo, Bernardo muito solto nas costas de Ronaldo e André Silva mas a trocar de posição muitas vezes com Bruno Fernandes e Pizzi, já que os três jogadores estavam permanentemente em deslocação e mobilidade e não tinham um espaço de ação restrito.

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O que a primeira parte acabou por mostrar tanto a Fernando Santos como à Seleção Nacional foi que o Luxemburgo estava longe de ser a Lituânia. Os espaços concedidos pelos lituanos aos três elementos do meio-campo, tanto a nível interior como mais junto às alas, não apareciam perante os luxemburgueses e Portugal tinha muita dificuldade em chegar perto da grande área de Moris. Por outro lado, o Luxemburgo ia conseguindo criar perigo através do corredor direito, com o lateral direito Jans e o ala Thill a deixarem Raphael Guerreiro em inferioridade numérica: o lateral do Borussia Dortmund ficava com a responsabilidade de defender os dois adversários, já que nem Bernardo, nem Bruno Fernandes nem Pizzi recuavam para ajudar em tarefas defensivas.

O Luxemburgo esteve perto de inaugurar o marcador várias vezes, com especial destaque para um cabeceamento de Gerson Rodrigues que passou muito perto da trave de Rui Patrício (25′), e a Seleção Nacional parecia não conseguir colocar em prática o jogo envolvente e asfixiante que mostrou contra a Lituânia. O estado do relvado era outra contrariedade para os jogadores portugueses, que tinham receio em arriscar passes mais longos e em profundidade porque raramente a bola seguia o percurso desejado. A meio do primeiro tempo, aproveitando uma paragem mais prolongada para assistência médica a um jogador do Luxemburgo, Fernando Santos chamou Bruno Fernandes para dar algumas indicações ao médio do Sporting e ainda empurrou Bernardo mais para a direita, deixando Pizzi a controlar a faixa central e a cair mais vezes nas costas de Cristiano Ronaldo. Este momento acabou por ditar os destinos da primeira parte e estancar as investidas ofensivas do Luxemburgo.

Bruno Fernandes, acompanhado por Bernardo e Pizzi, passou a desempenhar as funções defensivas que estavam a escassear no setor mais recuado da seleção portuguesa e ajudou Raphael Guerreiro a anular Jans e Thill no lado esquerdo — acabando a primeira parte como jogador com mais ações defensivas. O recuar da seleção luxemburguesa para o próprio meio-campo acabou por permitir que a Seleção Nacional chegasse progressivamente à grande área adversária, mesmo que com dificuldades em criar ocasiões de golo ou penetrar em espaços entrelinhas. O golo acabou por surgir através de um lance episódico, quase isolado mas que sempre pareceu a solução para não só contornar a parca exibição portuguesa como também o mau estado do relvado.

Bernardo Silva lançou Bruno Fernandes na profundidade, o médio do Sporting aproveitou o espaço deixado pelos defesas do Luxemburgo que foram arrastados por Cristiano Ronaldo e atirou forte de pé direito para inaugurar o marcador, depois de uma receção quase perfeita (39′). Na ida para o intervalo, Portugal estava a ganhar — resultado que servia as aspirações portuguesas — mas não estava a jogar bem. Exemplo disso era a total ausência de André Silva na grande área, avançado que estava a cumprir um encontro ingrato, perdido e isolado na frente de ataque sem que as bolas lá chegassem.

Na segunda parte, ambas as equipas voltaram do intervalo sem alterações mas Portugal estava a tomar conta da totalidade da iniciativa, resguardando mais a posse de bola do que havia feito no primeiro tempo para ir empurrando, lance a lance, o Luxemburgo para mais perto da própria baliza. José Fonte ficou perto de ampliar o resultado com um cabeceamento depois de um pontapé de canto na esquerda (50′) mas a Seleção estava presa entre a necessidade de segurar a vitória e a fragilidade da vantagem mínima. Tendência que ficou provada já perto da hora de jogo, com a entrada de João Moutinho.

O médio do Wolverhampton entrou para o lugar de Pizzi e o esquema tático português passou do 4x4x2 para o 4x3x3, com Bernardo a juntar-se a Ronaldo e a André Silva na frente e Moutinho a fortalecer o equilíbrio do setor intermédio. Mesmo com o aparente controlo dos destinos na partida, a verdade é que Portugal não conseguia impôr uma superioridade evidente e que descansasse Fernando Santos, já que a bola raramente entrava nos espaços entre os centrais e os laterais e o meio-campo estava cada vez mais afastado do setor mais adiantado. A equipa estava pouco tranquila, a acusar a precariedade do resultado e sem capacidade para exercer uma gestão construtiva e decisiva.

O Luxemburgo reagiu com a entrada de três elementos para o ataque, todos altos e possantes fisicamente, e procurou sempre chegar ao empate através de cruzamentos provenientes das alas que procuravam a superioridade dos avançados em relação aos centrais portugueses. Diogo Jota entrou para o lugar do apagado André Silva mas pouco ou nada conseguiu criar, já que a Seleção Nacional perdeu a posse de bola para o adversário nos últimos dez minutos e passou mesmo os instantes finais a defender o resultado e a vitória. Cristiano Ronaldo ainda ficou perto do segundo golo através de um livre direto (80′), naquele que foi apenas o segundo remate português na segunda parte, mas só conseguiu descansar a Seleção Nacional já a quatro minutos do apito final, depois de um lance de insistência de Diogo Jota (86′).

Portugal conseguiu qualificar-se para o Campeonato da Europa onde vai surgir como campeão em título e evitar o recurso à calculadora. Mesmo sem uma exibição brilhante, a Seleção Nacional conseguiu vencer o Luxemburgo num relvado difícil e que colocou muitos obstáculos e agarrar o segundo lugar do Grupo B do apuramento que vale a sétima fase final de um Europeu consecutiva. A jogar em casa, a seleção portuguesa quer e pode ter começado o início de outra história bonita.