O despejo que aconteceu na passada sexta feira, dia 28 de fevereiro, na Rua da Fonte Taurina, na Ribeira do Porto, gerou polémica, revolta e uma onda de solidariedade na cidade. Joana Pacheco teve que abandonar a habitação camarária onde vivia com os dois filhos menores, de oito e 12 anos, e ainda não tem um teto definitivo.
Em comunicado, enviado às redações este sábado, o grupo municipal do BE condena o despejo e fala em má fé por parte da autarquia. “São especialmente chocantes e denotam má fé por parte da Câmara as condições em que este despejo ocorreu: a moradora foi chamada à Câmara Municipal para uma reunião com o Provedor do Munícipe por causa do processo em causa e, enquanto estava nessa reunião, a sua casa foi arrombada, os seus pertences retirados e a fechadura alterada.”
Tal como o Observador noticiou na passada sexta-feira, o processo de Joana Pacheco arrasta-se desde 2017, logo após a mãe ter morrido. A antiga moradora da Ribeira viu-se forçada a abandonar a casa onde morava para ir cuidar do pai, que já tinha uma idade avançada. Desde então, tentou solicitar junto do município a sua integração no agregado familiar do progenitor, de quem foi cuidadora informal até ao seu falecimento. “Saí do agregado dos meus pais em 2012. Aluguei uma casa a dez minutos de onde sempre morei com eles. Mas, quando a minha mãe morreu, de imediato regressei para cuidar do meu pai. E esse mesmo ano pedi a minha reintegração no agregado”, contou Joana ao JN.
O pedido de Joana Pacheco foi sucessivamente recusado, “sem qualquer tipo de justificação ou apresentação de alternativa”. Desde a morte do seu pai, em maio de 2018, a Câmara passou a designar como “ocupação ilegal” o uso da habitação onde residia, procedendo à notificação para desocupação da mesma.
“Manifestam assim, Câmara Municipal e Domus Social, uma gravíssima ignorância da Lei de Bases da Habitação 83/2019 de 3 de setembro, onde está expressamente plasmado que ‘o Estado é o garante do direito à habitação’ e que, além da ‘efetiva garantia desse direito a todos os cidadãos’, ‘os imóveis ou frações habitacionais detidos por entidades públicas ou privadas participam, de acordo com a lei, na prossecução do objetivo nacional de garantir a todos o direito a uma habitação condigna’”, lê-se no comunicado do BE.
O partido considera que ao responder negativamente aos pedidos de prorrogação de prazo de desocupação apresentados pela moradora, que continuou a pagar a renda com emissão dos respeitos recibos no seu nome, a autarquia “optou por recusar o direito à habitação desta família e escusa/ou-se, através da força e sem estabelecer qualquer diálogo, a procurar uma solução, indo contra as definições consagradas na Lei de Bases da Habitação”.
Contactado pelo Observador, o gabinete de comunicação da Câmara Municipal do Porto explica que “a ação desta manhã [sexta-feira] foi uma desocupação coerciva por ocupação indevida e abusiva e não um despejo”. Sem querer entrar em grandes detalhes sobre o assunto, a autarquia acrescenta que os casos de despejo na cidade são situações “raras” e “extremas” e “caso as pretensões da requerente fossem atendidas poderia o vereador da Habitação incorrer num crime de prevaricação, passível de perda de mandato”.
Para o BE, este é “mais um exemplo trágico da falta de respostas habitacionais na cidade” e defende que é necessária a intervenção dos poderes públicos – Governo e Município — “na resposta a esta crise habitacional e para tal é indispensável o devido investimento em habitação pública”. “200 novas casas em cinco anos: é isto que vai dar resposta a este flagelo? Quantas tragédias mais serão necessárias?”, questionam os bloquistas.
Desde a passada sexta-feira, o caso de Joana Pacheco gerou uma onda de solidariedade nas redes sociais, tendo sido realizado um protesto nessa mesma noite à porta da Junta da União de Freguesias no Centro Histórico. Esta segunda-feira está agendada uma nova manifestação, desta vez no largo das traseiras do edifício da Câmara Municipal do Porto. O encontro está marcado para as 20h30, precisamente duas horas antes da sessão extraordinária da Assembleia Municipal que irá decorrer na mesma morada.
O Bloco de Esquerda entende que a Câmara Municipal do Porto deve reverter imediatamente o destino desta família. “No nosso entender, a Câmara Municipal deve reverter, com carácter de urgência, este despejo perpetrado em condições atrozes, atuar em conformidade com a Lei de Bases da Habitação e assumir a sua responsabilidade no acompanhamento da situação desta família; e deve proceder-se à revisão urgente da Estratégia Local de Habitação.”