Os trabalhadores da Cinemateca Brasileira fazem esta sexta-feira uma paralisação, em protesto pela falta de pagamento de salários, no dia em que termina o prazo para a rescisão voluntária de contratos e em que a gestão decide o seu futuro.
“A caminho do terceiro mês sem pagamentos, decidimos paralisar nossas atividades”, esta sexta-feira, dia em que se realizará “uma reunião do Conselho Administrativo da ACERP [Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto], empresa gestora da Cinemateca e da TV Escola, que decidirá o futuro da associação”.
Esta sexta-feira corresponde também à “data limite arbitrariamente estabelecida pela ACERP para a demissão voluntária de seus trabalhadores, sem o efetivo pagamento da rescisão”, lê-se no comunicado divulgado na quinta-feira pelos funcionários da Cinemateca Brasileira, com sede em São Paulo, fundada em outubro de 1946, e que detém o maior acervo audiovisual da América Latina.
Os trabalhadores da Cinemateca Brasileira contratados pela Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (…) estão com dois meses de salários e notas de prestação de serviços atrasadas, e três meses sem os benefícios essenciais, como vales de refeição e alimentação. Não há, inclusive, dinheiro para a rescisão dos trabalhadores, tão pouco houve o recolhimento do FGTS [Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, descontos para fundo de pensões] desde março deste ano”, lê-se no comunicado.
A ACERP é uma organização social, contratada pelo Ministério da Educação do Brasil, para a gestão e produção de conteúdos da TV Escola, e que mantinha, desde 2018, a gestão da Cinemateca Brasileira, acordada com a Secretaria Especial da Cultura, que entretanto passou da tutela do Ministério da Cidadania para o Minsitério do Turismo.
“No final de 2019”, no entanto, “o vínculo da ACERP para gerir a TV Escola foi encerrado bruscamente pelo Ministério da Educação”. Assim, a adenda relativa à Cinemateca Brasileira “também se extinguiu”, embora a associação tenha mantido a intenção de revalidar o contrato, recordam os trabalhadores, no comunicado de quinta-feira.
No passado dia 4, porém, o Ministério do Turismo anunciou ter em curso a “reincorporação pela União” da Cinemateca Brasileira, pondo de lado a hipótese de qualquer parceria com a associação Roquette Pinto.
Para os trabalhadores esta “reabsorção da Cinemateca pelo Estado” também não é bem-vinda, pois entendem abrir caminho para o desemprego, para a perda do acervo e para o fecho definitivo da instituição, até 2021.
Em 20 de maio, a demissão da atriz Regina Duarte de secretária de Cultura, do Governo de Jair Bolsonaro, só publicada em diário oficial na quarta-feira, foi acompanhada da sua indicação para a Cinemateca Brasileira, o que ainda não se concretizou.
Em maio, dezenas de artistas e associações culturais assinaram um manifesto de apoio à Cinemateca Brasileira, que se mantinha desde janeiro sem receber o seu orçamento anual, cujo montante é da ordem de 12 milhões de reais (cerca de 1,9 milhões de euros).
O manifesto, que enumerava vários problemas da instituição, como o incêndio de fevereiro de 2016, as inundações deste ano e “a indiferença com o futuro do património audiovisual brasileiro”, dos atuais responsáveis, contava com subscritores como a escritora Lygia Fagundes Telles, Prémio Camões, ex-presidente da Cinemateca Brasileira, o cineasta Walter Salles, realizador de “Central do Brasil”, a diretora da Cinemateca Nacional do Chile, Mónica Villarroel, e o diretor do arquivo português de Imagens em Movimento (ANIM), Tiago Baptista.