Chegaram a ser mensais, Sócrates tornou-os quinzenais. Há muito que os debates com primeiro-ministro de quinze em quinze dias na Assembleia da República enfrentam resistências. Desta vez, é o líder da oposição a querer acabar com eles. O presidente do PSD anunciou esta terça-feira que no projeto que o partido entregou para a reforma do funcionamento da Assembleia da República é proposto o fim da obrigatoriedade da presença chefe de governo no hemiciclo de 15 em 15 dias. Na proposta social-democrata, o primeiro-ministro só terá de marcar obrigatoriamente presença apenas oito vezes por ano (sessão legislativa) na Assembleia da República: em setembro, janeiro, março, maio, antes dos dois conselhos europeus ordinários, no debate do Estado da Nação e em novembro durante o Orçamento do Estado.
O primeiro-ministro pode ainda, segundo a proposta do PSD explicada por Rio, “participar, se assim o entender, nos quatro debates da nação setoriais“, que o PSD pretende criar e que vão ocorrer em outubro, fevereiro, abril e em junho. A ideia de Rui Rio é que, além do debate final do Estado da Nação em julho, seja debatido “o estado da saúde, o estado da agricultura ou o estado da economia em Portugal”. Nas contas de Rio, isto irá “enobrecer o debate parlamentar” e fará com que haja “todos meses um debate com o primeiro-ministro ou um membro do governo”. Isto, claro, se o primeiro-ministro decidir comparecer nos tais quatro debates da nação setoriais.
Para Rui Rio estes debates setoriais “devem ser marcados logo no início das sessões legislativas”, para que seja um “debate a sério” e não que, por exemplo, “a ministra da Saúde seja chamada para responder a um problema num hospistal”. Paralelamente, Rui Rio quer reduzir os plenários das atuais três sessões por semana, para apenas duas: à quarta-feira e à sexta-feira. Isto diz ser possível com um “reforço do trabalho das comissões”, que irão decorrer às quintas-feiras. Haverá também sempre uma quinta-feira por mês que “ficará livre, uma vez por mês, que fica dedicada a estes debates mais nobres, ou com o primeiro-ministro ou equipa ministerial“.
Comissão de ética passa a Conselho com maioria de não-deputados
Rui Rio pretende ainda “credibilizar o Parlamento” e a comissão de Ética (que atualmente tem o nome de comissão parlamentar de transparência e estatuto dos deputados), fazendo com que ela seja composta por uma maioria de não deputados. Na verdade, Rui Rio propõe o “fim desta comissão” e a “criação de um conselho de transparência e estatuto dos deputados que funciona também na Assembleia da República, que tem exatamente os mesmos poderes desta comissão”, mas composta “maioritarimente por personalidades que não sejam deputados neste momento nem tenham sido deputados na anterior legislatura.”
Para Rui Rio atualmente esta comissão tem atualmente um “problema grave: é constituída apenas por deputados”, o que faz com que sejam estes a decidir “se há incumprimentos ou incompatibilidades” nos seus próprios mandatos ou ações. Assim, segundo o líder do PSD, “estão a ser juízes em causa própria”. E acrescenta: “Muitas vezes vemos relatórios de deputados para aferir se outro deputado está incompatível ou não e às vezes é um relatório feito por um deputado do próprio partido do deputado que está em causa”. O presidente deste conselho também terá de ser uma personalidade “de reconhecido mérito” que não seja deputado em funções.
Comissões de inquérito também com independentes
Rui Rio deu como bom exemplo de uma comissão de inquérito a que analisou o BES, cujo sucesso atribuiu ao facto da comissão “não estar politizada nem partidarizada”. Quando assim não é, “e a maioria das vezes não é”, o que se assiste “é que o partido do governante tenta defendê-lo e o partido da oposição tenta atacar”. Por isso, diz Rio, é necessário “despartidarizar as comissões de inquérito”. E como? “Passando a integrar também personalidades que não são deputados”.
O presidente do PSD admite afinações na constituição, mas garante que a participação de personalidades externas ao Parlamento “não é inconstitucional, como alguns defendem” e diz que ele próprio “pertenceu a uma comissão de inquérito que tinha personalidades que não tinham deputados”. E explicou que participou numa comissão sobre Camarate em que havia representantes das famílias das vítimas e que, por exemplo, “o representante das famílias do dr. Patrício Gouveia era o atual Presidente da República”. Por limitações da Constituição, estes representantes “podem ter todos os poderes que os deputados têm à exceção de um, que é votar”.
Mas há mais alterações ao funcionamento do Parlamento. Relativamente aos projetos de resolução, Rui Rio “lembra que são apenas recomendações ao governo” e, por isso, defende que devem ser “debatidas em sede parlamentar e não em sede de plenário e que para o plenário passe apenas um relatório anual obrigatório, debatido em plenário”. Neste debate, defende Rio, deve ser feito “o balanço daquilo que o governo acolheu e não acolheu em matéria de recomendações da Assembleia da República, as perguntas e requerimentos que os deputados que não foram respondidas e uma coisa muito importante: as leis que não foram regulamentadas”.