A auditoria externa ao BES e ao Novo Banco revelou esta terça-feira perdas líquidas de 4.042 milhões de euros no Novo Banco e, segundo o governo, o “relatório descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves” até 2014.

“O relatório descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves de controlo interno no período de atividade até 2014 do Banco Espírito Santo no processo de concessão e acompanhamento do crédito, bem como relativamente ao investimento noutros ativos financeiros e imobiliários”, de acordo com o comunicado, divulgado esta madrugada, pelo Ministério das Finanças.

Devido à grande abrangência temporal, “que incide sobre um período muito alargado da atividade do Banco Espírito Santo até 2014 relativamente ao qual estão em curso processos criminais, e à necessidade de salvaguarda dos interesses financeiros do Estado, o relatório será remetido pelo Governo à Procuradoria-Geral da República considerando as competências constitucionais e legais do Ministério Público”, indicou o Governo português.

O relatório, elaborado pela empresa de auditoria Deloitte e entregue hoje ao Governo, analisou atos de gestão no Banco Espírito Santo e no Novo Banco, desde 01 de janeiro de 2000 até 31 de dezembro de 2018, e incidiu sobre “283 operações que integram o objeto da auditoria, abrangendo, portanto, quer o período de atividade do Banco Espírito Santo, quer o período de atividade do Novo Banco”.

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Este conjunto de operações originaram perdas de 4.042 milhões de euros para o Novo Banco entre 4 de agosto de 2014 (um dia após a resolução do BES) e 31 de dezembro de 2018. De acordo com o quadro síntese divulgado pelas Finanças, a maior fatia das perdas resultou de cerca de 200 operações de crédito, no valor de mais de dois mil milhões de euros.

Perdas geradas em operações no BES/Novo Banco

“O relatório da auditoria especial evidencia que as perdas incorridas pelo Novo Banco decorreram fundamentalmente de exposições a ativos que tiveram origem no período de atividade do Banco Espírito Santo e que foram transferidos para o Novo Banco no âmbito da resolução”, acrescentou.

O comunicado não explicita quando foram geradas estas perdas, nem de que forma as decisões da gestão do banco já pós-resolução e venda a privados potenciaram ou minimizaram estes prejuízos, ainda que indique que o relatório da Deloitte descreve “também os progressos realizados nestas matérias no período de atividade do Novo Banco”. Entre as operações escrutinadas estão vendas de carteiras de crédito e imóveis realizadas em 2018, como os projetos Viriato e Nata 1, e a alienação da seguradora GNB, a valores de desconto face ao balanço que geraram perdas.

Compromissos com o Novo Banco. Fundo de Resolução deve avaliar situações

Um dos objetivos desta iniciativa era o apurar de que forma a gestão do Novo Banco tem vindo digerir o legado do antigo BES e se as vendas aceleradas de ativos — imóveis, créditos e participações — estão a aumentar as perdas associadas, resultando em prejuízos que são cobertos pelo Fundo de Resolução. Se fossem identificadas falhas ou irregularidades nessas operações, isso poderia por em causa a atribuição dos recursos ainda disponíveis no mecanismo de capital contingente, como chegou a admitir o primeiro-ministro.

Nesta nota, o Ministério das Finanças assinala que, “não obstante a evolução verificada no período de atividade do Novo Banco, o Governo considera imprescindível que sejam desenvolvidas, por todos os intervenientes, todas as ações necessárias para assegurar a rápida e integral correção das questões identificadas no relatório da auditoria especial. Reitera-se a importância do integral cumprimento dos compromissos contratualmente assumidos, designadamente perante o Fundo de Resolução, o qual deverá avaliar quaisquer situações identificadas à luz das respetivas prerrogativas.

“O relatório da auditoria especial é extenso e exigirá uma análise técnica cuidada, objetiva e responsável por parte de todos aqueles a quem foi enviado”, observou o Governo português, acrescentando ser “imprescindível que sejam desenvolvidas, por todos os intervenientes, todas as ações necessárias para assegurar a rápida e integral correção das questões identificadas no relatório da auditoria especial”.

O Ministério das Finanças indicou ainda ter remetido o relatório à Assembleia da República, bem como ao Banco Central Europeu, ao Banco de Portugal, ao Fundo de Resolução, à Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.

O documento foi remetido ao Presidente da Assembleia da República que o terá encaminhado para a Comissão de Orçamento e Finanças do Parlamento, órgão que deverá discutir os termos da utilização da auditoria para o escrutínio político do que se passou no Novo Banco. Os documentos chegaram selados e e tudo indica que terão acesso reservado, pelo que a sua divulgação será sujeita a regras. No entanto, o seu conteúdo será seguramente usado pelos deputados na audição já agendada com o presidente do Novo Banco para o dia 15 de setembro.

Presidente do Novo Banco ouvido no Parlamento a 15 de setembro

Ainda de acordo com o Ministério das Finanças, o relatório da “auditoria especial vai ao encontro da posição sempre sustentada pelo Governo sobre a solidez do sistema bancário e a prevenção de crises:

  • A importância de as instituições de crédito disporem de adequados mecanismos de governo e de controlo interno;
  • A necessidade de uma supervisão eficaz e coordenada das instituições de crédito, que assegure a prevenção e mitigação dos riscos financeiros.

O ministério agora liderado por João Leão recebe a auditoria pedida por Mário Centeno, que a irá receber na qualidade já de governador do Banco de Portugal. Na nota que remeteu às redações destaca também a “importância do objetivo da preservação da estabilidade financeira, a qual tem contribuído, entre outros, para a melhoria das condições de financiamento da economia portuguesa desde 2016 até ao presente.”