Mais de 820 milhões de pessoas no mundo passam fome ou insegurança alimentar, enquanto o desperdício de alimentos resulta em custos ambientais de 700 mil milhões de dólares e despesas sociais de 900 mil milhões, segundo a WWF.

Reduzir o desperdício de alimentos representa uma oportunidade crucial para aliviar a pressão ambiental no nosso planeta”, defende a organização de conservação da natureza no relatório Planeta Vivo 2020, esta quinta-feira divulgado.

A WWF (World Wide Fund for Nature) alerta que a perda e o desperdício de alimentos também contribuem para as alterações climáticas, com uma responsabilidade estimada em “pelo menos 6% do total de gases com efeito de estufa”, três vezes mais do que as emissões globais da aviação.

“Quase um quarto – 24% – de todas as emissões do setor alimentar vem de alimentos que são perdidos nas cadeias de abastecimento ou desperdiçados pelos consumidores”, lê-se no relatório.

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As mudanças na utilização dos solos são atualmente o mais importante vetor na perda de biodiversidade, de acordo com a WWF, seguindo-se as alterações climáticas, a sobre-exploração de recursos, a poluição e as espécies invasoras, “não muito atrás”.

Até um quinto das espécies selvagens estão em risco de extinção neste século devido apenas às alterações climáticas”, segundo a organização.

A Associação Natureza Portugal (ANP) e a WWF preconizam um Novo Acordo para a Natureza e as Pessoas, destinado a proteger e restaurar a natureza até 2030, como suporte aos objetivos de Desenvolvimento Sustentável. O relatório foi apresentado em Portugal na quarta-feira, numa conferência online sob embargo até esta quinta-feira.

As três metas deste novo acordo são “zero perda de habitat”, “zero extinção de espécies” e “reduzir para metade a pegada ecológica da produção e do consumo”.

Pandemia espelha rutura provocada pelo homem no ambiente

O desprezo pela natureza coloca em risco a saúde da população mundial, sendo a pandemia de Covid-19 um exemplo da rutura provocada pelo Homem no ambiente, defende o diretor-geral da WWF, no relatório.

A natureza está a diminuir globalmente a taxas sem precedentes em milhões de anos. A forma como produzimos e consumimos alimentos e energia e o flagrante desprezo pelo meio ambiente, enraizado no nosso modelo económico atual, levou o mundo natural aos seus limites”, escreve Marco Lambertini.

A Covid-19, considera, é “uma manifestação clara” da rutura na relação com a natureza.

É hora de respondermos ao SOS da natureza. Não apenas para garantir o futuro de tigres, rinocerontes, baleias, abelhas, árvores e toda a incrível diversidade de vida que amamos e com a qual temos o dever moral de conviver, mas porque ignorá-lo também coloca a saúde, o bem-estar e a prosperidade, na verdade o futuro, de quase oito mil milhões de pessoas em jogo”, adverte o responsável pela WWW (World Wide Fund for Nature).

O documento defende que  única forma de reduzir o impacto humano no planeta é “consumir menos” e procurar alcançar o objetivo zero na extinção de espécies.

De acordo com o relatório, o índice global do planeta vivo continua em declínio, com uma redução média de 68% na população de mamíferos, aves, anfíbios, répteis e peixes entre 1970 e 2016.

“Uma redução de 94% para as sub-regiões tropicais das Américas é a maior queda observada em qualquer parte do mundo”, lê-se no relatório anual da organização de conservação da natureza WWF. Para os anfíbios, as doenças e a perda de habitat são as maiores ameaças.

A Mata Atlântica no Brasil perdeu 87,6% da vegetação natural desde 1500, principalmente durante o século passado, o que levou a pelo menos duas extinções de anfíbios e 46 espécies ameaçadas de extinção.

Mais de 2.000 espécies de anfíbios estão ameaçadas de extinção, segundo os números apurados pela WWF. Quase uma em cada três espécies de água doce estão igualmente ameaçadas de extinção.

Em 3.741 populações monitorizadas — representando 944 espécies de mamíferos, aves, anfíbios, répteis e peixes — o Índice do Planeta Vivo em Água Doce diminuiu em média 84%, o equivalente a 4% ao ano desde 1970.

“A maioria dos declínios observam-se em anfíbios de água doce, répteis e peixes e são registados em todas as regiões, particularmente na América Latina e nas Caraíbas”, lê-se no relatório. “A influência da humanidade no declínio da natureza é tão grande que os cientistas acreditam que estamos a entrar numa nova época geológica, a Antropoceno”, frisa a WWF.

Agenda de Inovação para Agricultura contempla alterações climáticas e demografia

A agenda de inovação para a agricultura na próxima década, a apresentar na sexta-feira, terá em conta as alterações climáticas e o “desafio demográfico”, afirmou a ministra Maria do Céu Antunes.

“Ao construirmos uma estratégia de médio prazo, tivemos em consideração aquilo que são as condições de base que influenciam fortemente a vida dos cidadãos”, disse a Ministra da Agricultura ao intervir na sessão de apresentação do relatório Planeta Vivo 2020 e do Novo Acordo para a Natureza e as Pessoas.

A agricultura, referiu, é “particularmente sensível” às alterações climáticas sentidas no dia a dia por todos os cidadãos.

Por outro lado, o cenário demográfico aponta para uma diminuição da população em Portugal, mas de aumento a nível mundial e de concentração nas cidades: “Isso leva a que, inevitavelmente, continuemos a assistir a uma mudança dos padrões de consumo”.

Os recursos são “cada vez mais escassos”, sublinhou a ministra, referindo-se à água, aos problemas associados ao solo e à biodiversidade.

Maria do Céu Antunes recordou as declarações do secretário-geral da ONU, António Guterres, que esta semana advertiu que as alterações climáticas são um perigo maior do que a atual pandemia de Covid-19.

“Se os portugueses se uniram no processo de contenção da Covid-19, também vamos ter de estar juntos para podermos mitigar os efeitos do aquecimento global e precisamos todos sentir que precisamos de respostas alternativas e que cada um tem de fazer a sua parte, em concreto”, disse a ministra.

Para Maria do Céu Antunes, é necessária uma transição justa e rápida. “Isto é um desafio que é para ontem, não é para daqui a 10 anos”.

A ministra indicou que serão retirados contributos do relatório da WWF (World Wid Fund for Nature) e do Novo Acordo para a Natureza, no âmbito da estratégia que o governo prepara.

O que queremos verdadeiramente é que isto seja um plano em que os cidadãos, os produtores, os agentes do território e o Estado, encontrem forma de atingir os objetivos a que nos propomos”, que passam por “garantir qualidade de vida às pessoas”, indicou.

A apresentação da agenda vai acontecer na Lezíria do Tejo. O objetivo é ter um documento que ajude a fazer uma gestão mais eficiente dos recursos naturais, com “maior respeito pela natureza e pela preservação da biodiversidade”, combatendo a degradação dos solos e o desperdício em todo o processo produtivo.

Pretende-se um modelo agrícola sustentável, que assegure uma alimentação de qualidade e em quantidade, “muito assente em produtos frescos, da época, locais”, em cadeias curtas, por forma a reduzir a pegada ecológica, avançou a governante.

O Governo tenciona também alcançar uma melhor gestão da energia: “Queremos reforçar muito a energia verde e o consumo sustentável neste setor, mas também sabemos que para isso precisamos de fazer mais investimento em investigação”.

A agenda foi pensada a uma década e será ajustada em função de novas realidades e oportunidades. “Queremos começar a ter dados que nos permitam afinar a todo o tempo a nossa estratégia”, declarou.

De acordo com a ministra, no que respeita a gases com efeito de estufa, a agricultura e a pecuária são responsáveis por cerca de 10% das emissões atualmente, valor que há 10 anos era de 14%.