As defesas dos responsáveis da auditora KPMG-Portugal e KPMG-Angola alegaram esta segunda-feira que estes não poderiam ter sido condenados pelo supervisor por violação de normas relativas à emissão de reservas às contas consolidadas do Banco Espírito Santo (BES).

Nas alegações finais do julgamento dos recursos às coimas aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP), em janeiro de 2019, à KPMG e a cinco dos seus sócios, no valor global de 4,9 milhões de euros, que decorre desde o início de setembro no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), João Matos Viana afirmou que o presidente da auditora, Sikander Sattar, não está inscrito como revisor oficial de contas em Portugal e não fez parte da equipa de auditores externos do BES, pelo que não se enquadra juridicamente na acusação proferida pelo supervisor.

Na sua decisão, o BdP concluiu que houve a violação de normas que determinam o “dever de os revisores oficiais de contas ao serviço de uma instituição de crédito e os auditores externos de comunicarem factos que são suscetíveis de determinar uma emissão de reserva às contas da entidade que auditam”, neste caso o Banco Espírito Santo, e a prestação de informações incompletas e de informações falsas ao supervisor, relativas à situação da filial em Angola (BESA), relativa ao período entre 2011 e 2013.

Numa sessão que decorreu no Tribunal do Cartaxo por falta de salas nas instalações do TCRS em Santarém, Matos Viana frisou que, como mostrou o depoimento prestado por Sikander Sattar durante o julgamento, este “nunca aligeirou as suas responsabilidades”, assumindo todos os procedimentos que adotou durante o processo, mas, do ponto de vista jurídico, o responsável da KPMG não se enquadra no conceito de autor em relação aos factos em causa.

O advogado, que, juntamente com Duarte Santana Lopes, representa ainda a KPMG e os associados Fernando Antunes e Inês Neves, pediu o arquivamento do processo, não só em relação a Sikander Sattar, mas também em relação a todos os arguidos/recorrentes.

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Também Vânia Costa Ramos, advogada de defesa de Inês Filipe, responsável pela KPMG Angola, alegou que esta não se encontra abrangida pelas infrações em causa no processo, já que não foi auditora do BES, mas sim do BESA, entidade de direito angolano, que “não tinha linha de reporte ao Banco de Portugal”.

Frisando que Inês Filipe reportava à entidade supervisora angolana (Banco Nacional de Angola, BNA), a mandatária acrescentou que, ao contrário da KPMG-Portugal, a KPMG-Angola não é visada no processo.

Vânia Ramos destacou que Inês Filipe, “reputada especialista”, com mais de 20 anos de experiência, “não teria tido qualquer problema em emitir opinião de reserva se tivesse motivo para isso”, dando como exemplos o ter colocado reservas às contas do BNA, do qual é atualmente auditora, em abril deste ano, e nunca ter sofrido “qualquer processo sancionatório” em Angola, onde trabalha desde 2011.

A advogada apontou vários “absurdos” ao processo, como o de Inês Filipe ser acusada de ter ocultado informação que na verdade revelou e de ter praticado as infrações com dolo.

Matos Viana questionou igualmente a condenação por dolo de todos os arguidos, sublinhando ainda que “não há nenhuma prova de que as irregularidades” descritas nas atas da assembleia-geral do BESA realizada em outubro de 2013, e que vieram a ser manchete no Expresso mais de sete meses depois, “correspondam à verdade”, havendo mesmo “provas em contrário”.

Como exemplo citou o relatório emitido pelo BNA em maio de 2014, resultante de uma inspeção ao BESA que decorreu nos primeiros três meses desse ano, em que apenas são apontadas situações “que não podem ser consideradas graves”.

“Nada factual comprova as supostas irregularidades”, declarou, acrescentando que, com a existência, a partir de janeiro de 2014, da garantia soberana do Estado angolano à carteira de crédito do BESA, no valor de 5,7 mil milhões de dólares, “não havia nenhum facto suscetível de gerar reservas” às contas consolidadas do BES e, “portanto, não havia nada a comunicar” ao supervisor.

Na decisão de 22 de janeiro de 2019, o BdP condenou a KPMG ao pagamento de uma coima de 3 milhões de euros, o seu presidente, Sikander Sattar, de 450.000 euros, Inês Neves (425.000 euros), Fernando Antunes (400.000 euros), Inês Filipe (375.000 euros) e Sílvia Gomes (225.000 euros), de que todos recorreram.

Na quinta-feira, prosseguem as alegações da mandatária de Inês Filipe, concluindo-se esta fase final do julgamento com as alegações de Rogério Alves, advogado de defesa de Sílvia Gomes.