Os planos eram relativamente ambiciosos. Segundo escreve a WWD, a histórica maison tencionava convidar cerca de duas centenas de pessoas para assistir ao desfile da coleção Métiers d’Art 2021, marco anual que enaltece a excelência dos ateliers através de bordados, pedraria e manipulação dos materiais mais nobres. Os planos foram traídos pelo segundo confinamento em França e aquele que foi o primeiro desfile de Virginie Viard fora de Paris (a solo, entenda-se), contou apenas com uma pessoa na assistência, a atriz Kristen Stewart.
O local não foi escolhido ao acaso. Falamos do Castelo de Chenonceau, cuja história se interliga com a de poderosas mulheres francesas, relação que lhe valeu o cognome de Château des Dames (ou Castelo das Senhoras). Mas há nos anais um nome que se destaca — o de Catarina de Médici, viúva de Henrique II, protagonista do Renascimento francês e, muito possivelmente, alvo da admiração de Coco Chanel.
“Sempre tive um estranho sentimento de simpatia e admiração pelas mulheres que viveram entre Francisco I e Luís XIII, talvez por considerá-las grandiosas, de uma simplicidade magnífica e de uma majestade repleta de deveres onerosos”, referiu a própria designer numa entrevista à Revue des Sports et du Monde em 1936, como recorda a revista Vogue.
Separadas por quatro séculos, viriam a encontrar-se num mesmo monograma. O dois cês entrelaçados fazem até hoje parte do palácio que Catarina modificou ao seu gosto, em meados do século XVI, ignorando que, no século XX, a insígnia se tornaria o símbolo máximo do luxo, no que à moda diz respeito. Mesmo sem público no salão, foi precisamente esse o posto reclamado pela Chanel de Virginie Viard. Num longo e ritmado desfile (do qual escasseiam os registos fotográficos), a maison voltou a exibir o trabalho das suas 38 oficinas especializadas.
À coleção, não faltou nenhum dos ingredientes palacianos: silhuetas alongadas por saias e casacos compridos, coletes, jaquetas, peças acolchoadas e mangas balão. À transposição história, feita a partir de elementos de vestuário de uma dama renascentista, Viard adicionou sensualidade e contemporaneidade através de jaquetas em tweed cortadas nas laterais (no desfile, deixaram a pele das manequins a descoberto), mas também com a utilização de ganga, e de macacões de calção também eles em tweed.
Uma mostra que foi também ao detalhes, com bordados em strass com a forma de um castelo encantado, laços, pedraria, botões com acabamentos em ouro e pérolas surpreendentemente distribuídas ao longo de um vestido de tweed. Embora sem perder de vista o pragmatismo que pauta a sua visão do estilo Chanel, houve um lado de Virginie que se permitiu brincar às princesas.