O escritor britânico John le Carré, um dos mais importantes autores de romances de espionagem, morreu este sábado à noite aos 89 anos. O autor de obras como “Fiel Jardineiro” ou “O Espião que Saiu do Frio”, morreu de pneumonia no Royal Cornwall Hospital.

“É com uma enorme tristeza que tenho de partilhar a notícia de que David Cornwell, conhecido para o mundo como John le Carré, morreu após uma curta doença (sem relação com a Covid-19) na Cornualha, no sábado à noite”, pode ler-se no comunicado do CEO da agência Curtis Brown, Jonny Geller. Descrito como um “gigante incontestável da literatura britânica”, Geller acrescenta que Le Carré “definiu a era da Guerra Fria e destemidamente combateu o poder pela palavra nas décadas que se seguiram”. “Os nossos pensamentos estão com os seus quatro filhos, as suas famílias e com a sua querida mulher Jane”, escreve.

John le Carré, pseudónimo de David Jonh Moore Cornwell, nasceu em Poole, Inglaterra, em 1931. O pai associou-se a mafiosos e passou algum tempo na prisão por fraude. “Manipulador, poderoso, carismático, inteligente, indigno de confiança”, descreveu o autor, conta o The New York Times. Anos mais tarde, o seu pai começou a persegui-lo para lhe pedir dinheiro e, apresentando-se como Ron le Carré, chegou mesmo a ameaçar processá-lo. Quando morreu, o escritor pagou pelo seu funeral, mas não foi. Já a sua mãe abandonou a família quando John le Carré tinha apenas cinco anos. Só aos 21 é que viria a contactá-la novamente.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Frequentou a escola privada de Sherborne. Depois, mudou-se para  Suiça aos 16 anos e matriculou-se na Universidade de Berna para estudar literatura moderna. Foi lá que, no final da década de 1940, foi recrutado por um espião britânico. O autor foi ainda professor de francês e alemão no colégio privado de Eton, Reino Unido, altura em que começou a trabalhar como agente secreto. Enquanto estudante em Oxford, para onde foi logo depois de ter estado na Universidade de Berna, espiava possíveis simpatizantes soviéticos.

O autor trabalhou para os serviços de inteligência britânicos de 1950 a 1964, — o que viria a inspirar a sua escrita — a partir de uma escritório no prédio do MI5, na Cruzon Street, em Londres, escreve o The Guardian. Em 1960, mudou-se para a Alemanha, fazendo passar-se por um diplomata britânico. O seu trabalho incluía conduzir interrogatórios, fazer escutas telefónicas ou dirigir agentes.

De “O Espião que Saiu do Frio” à “Toupeira”: John le Carré tinha tudo o que o cinema e a televisão queriam

John le Carré dedicou-se depois à escrita a tempo inteiro, após o sucesso de “O Espião que Saiu do Frio”, publicado pela primeira vez em 1963. Foi este livro — a sua terceira obra — que o lançou mundialmente. Numa entrevista em 2013, ao The Guardian, o escritor explicou que o seu livro fora aprovado pelos serviços secretos porque era “pura ficção do início ao fim” e, por isso, não representava riscos de segurança. Ainda assim, foi-lhe exigido que usasse um pseudónimo para não ser reconhecido.

Seguir-se-iam outras obras: “O Alfaiate do Panamá”, “Single & Single”, “O Fiel Jardineiro”, “Amigos até ao Fim”, “O Canto da Missão” e “Um Homem Muito Procurado”. O livro “Um Legado de Espiões” foi editado em 2017, tendo recuperado o agente George Smiley, personagem de várias das suas obras, entre as quais, “O Espião que Saiu do Frio”, precisamente.

Em Portugal, tem um total de 25 obras publicadas desde os anos 69, por várias editoras. Muitos dos seus livros foram adaptados para o cinema ou a televisão: “A Gente de Smiley” e “A Toupeira”, com Alec Guiness no papel de agente Smiley. O seu último livro, “Agente em Campo”, foi publicado em 2019.

“Agente em Campo”: o último livro de John le Carré e a ficção da “resistência”

O The New York Times conta que John le Carré recusou que seus livros fossem inscritos em candidaturas para prémios literários. No entanto, muitos críticos consideraram que as suas obras são uma literatura de primeira linha.