Havia um verdadeiro aparato nas proximidades do armazém em Montemor-o-Velho, distrito de Coimbra, onde ficarão guardadas as vacinas contra a Covid-19 enviadas para Portugal. A vacina da Pfizer/BioNTech, que será administrada a partir de domingo, chegou a Portugal via Vilar Formoso, na fronteira com Espanha, e foi transportada numa carrinha de transporte especial, escoltada por carrinhas da Guarda Nacional Republicana (GNR). Daqui seguirá para o resto do país, mas não se sabe quando ou como. Mas sabe-se que a primeira vacina vai ser administrada no Hospital de São João, no Porto, às 10h de domingo. No primeiro dia prevê-se a vacinação de 2 mil profissionais de saúde daquela unidade.
Os camiões refrigerados a -80ºC, selados, com as doses previstas para países da União Europeia (UE) saíram na quarta-feira de manhã da fábrica belga da farmacêutica norte-americana, situada em Puurs, no nordeste da Bélgica, sob fortes medidas de segurança, com dois veículos das forças policiais a escoltar cada um dos três veículos pesados depois do carregamento.
As duas caixas, com um peso total de 41 quilogramas, entraram no perímetro da unidade de armazenamento, na freguesia de Arazede, por volta das 09h45. Marta Temido estava à espera delas. Em declarações aos jornalistas, a ministra da saúde falou de “uma janela de esperança” na batalha contra a pandemia de Covid-19:
“É um marco histórico para todos nós, um dia importante depois de um ano tão difícil. Foi difícil lidar com a incerteza nos tempos em que foram pedidos tantos sacrifícios”, admitiu a ministra da saúde, recordando, no entanto, que “há um combate muito difícil para fazer”.
Foi um alerta que o primeiro-ministro António Costa, em isolamento após ter estado com contacto com o presidente francês Emmanuel Macron, que testou positivo, deixou nas redes sociais. O líder governamental assumiu que “agora temos a certeza de que há luz ao fundo do túnel”, mas logo de seguida avisou: “Ainda não saímos do túnel”. Por isso, apesar de “bem planeado”, há “vários meses de trabalho pela frente”. Num domingo de atenuação das medidas de restrição, Costa assume que “ainda é cedo para baixar a guarda e relaxar nas medidas de proteção”.
Chegou hoje o primeiro lote da vacina anti #COVID19. Um extraordinário esforço da Ciência, uma coordenação exemplar da União Europeia. Temos pela frente vários meses de trabalho bem planeado. Agora temos a certeza de que há luz ao fundo do túnel.#VacinaCOVID19 #Covid19Vaccine
— António Costa (@antoniocostapm) December 26, 2020
O primeiro lote de 9.750 vacinas foi guardado em Montemor-o-Velho por trabalhadores do Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH) sob supervisão da ministra da saúde, que, de luva posta nas câmaras frias, segurou um dos delicados frascos entre o indicador e o dedo médio. Cada um deles tem cinco doses de 0,3 mililitros e precisa de estar sob temperaturas gélidas, num ambiente acondicionado, antes de ser descongelado até à temperatura ambiente poucas horas antes da administração.
Daquele armazém em Coimbra, os frascos vão ser distribuído por cinco hospitais em três pontos do país: o Hospital de São João, o Hospital de Santo António (Porto), o Hospital de Coimbra e o Centro Hospitalar de Lisboa Norte e Lisboa Central (Lisboa). Uma operação que teve lugar já durante este sábado, como se viu durante a tarde no Hospital de São José, em Lisboa, quando uma carrinha de transporte escoltada pela polícia chegou à unidade hospitalar onde este domingo também serão administradas vacinas.
Marta Temido — que garantiu esta manhã que houve uma adesão em massa dos profissionais de saúde ao plano de vacinação — estará no primeiro às 10h para assistir à administração número um da vacina em Portugal. Depois vai deslocar-se até ao segundo hospital, pelas 11h30.
Mas nem ela, nem Rui Santos Ivo revelaram como (ou sequer quando) é que as vacinas seriam transportadas para aqueles centros hospitalares. O presidente da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed) descreveu apenas que se aplicou “um conjunto de regras que são as relacionadas com a distribuição de medicamentos, que se iniciam na fábrica, na Europa, e se mantêm durante o transporte e durante o armazenamento”.
“Todas as normas previstas são mantidas, desde o fabrico, transporte e armazenamento. Hoje, uma equipa de inspeção do Infarmed acompanhou todo o processo aqui”, descreveu Rui Santos Ivo, “estamos a assegurar todas essas condições para que as vacinas cheguem, desde o ponto de fabrico ao ponto de administração, nas condições em que têm de estar”.
Parte das vacinas ficará guardada no armazém, para garantir que há doses suficientes para a segunda administração dos primeiros inoculados dentro de três semanas. Mais do que isto as autoridades de saúde não avançam. Foi Marta Temido quem explicou porquê: “Não estamos livres de determinados movimentos” e “há um conjunto de aspetos que temos de manter com uma certa salvaguarda”.
Operação em São João durará 10 horas
Quanto ao Centro Hospitalar e Universitário de São João, prevê vacinar 2 mil profissionais no domingo, terá 25 postos de vacinação contra a covid-19 e “uma larga equipa de enfermeiros” dedicada à operação, avançou fonte hospitalar à Lusa.
“Será uma operação muito complexa e exigente, que durará cerca de 10 horas [das 10:00 às 20:00], contando com 25 postos de vacinação durante todo o período, englobando uma larga equipa de enfermeiros”, refere informação remetida à agência Lusa por fonte do CHUSJ.
O Centro de Ambulatório, área normalmente dedicada às consultas externas, será dedicado à operação, aproveitando-se um espaço que está livre ao domingo.
Segundo a mesma fonte, “o Serviço de Sistemas de Informação criou uma solução específica de convocatória, registo e monitorização do processo, que permitirá ter online dados sobre o desenrolar da operação”. Já os Serviços Farmacêuticos do CHUSJ “funcionarão todo o domingo, preparando as doses a serem administradas, de acordo com o consumo que será realizado em cada posto”.
A operação de vacinação dos profissionais de saúde do Hospital de São João conta com o apoio do Serviço de Saúde Ocupacional para esclarecimento de dúvidas, avaliação de eventuais reações adversas, isto em articulação com a Unidade de Farmacologia Clínica do mesmo centro hospitalar.
Já ao Serviço de Imunoalergologia caberá “a abordagem a reações alérgicas”, enquanto a equipa da Emergência Intra-Hospitalar terá a missão de monitorizar eventuais “reações graves”.
“Até o voluntariado, no apoio de cafés, chás e bolachas, prestará apoio”, lê-se na mesma informação que especifica que o estacionamento do hospital estará todo o dia aberto aos funcionários, permitindo estacionar gratuitamente as viaturas, enquanto “o Serviço de Comunicação tem montado uma abordagem de sensibilização e informação dos colaboradores”.
Também está prevista a presença de elementos do Agrupamento de Centros de Saúde Porto Ocidental para “apoio nos registos eletrónicos das vacinas”, existindo “reforço da segurança interna, desde o local de preparação na farmácia aos locais de administração das vacinas”.
“Numa operação com risco associado, pretende-se que o sistema funcione de forma muito ágil e efetivo, pelo que o plano prevê desde logo medidas de contingência em caso de algum dos setores ou áreas tenha constrangimentos, para que o processo não seja suspenso”, acrescenta o CHUSJ que terá “uma célula de crise instalada no conselho de administração, para acompanhar online toda a operação”.
Artigo entretanto atualizado com imagens da chegada das primeiras doses da vacina a Lisboa.