Constança Braddell, de 24 anos, lançou um apelo nas redes sociais para que seja aprovado em Portugal a utilização de um novo medicamento que pode melhorar a sua qualidade de vida. A jovem sofre de fibrose quística, uma doença crónica e hereditária. O seu estado de saúde piorou drasticamente nos últimos seis meses e Constança acredita que pode morrer se não tiver acesso ao Kaftrio, “já disponível em vários países”.
A fibrose quística, uma doença “mortal e incurável, afeta múltiplos órgãos do aparelho digestivo mas essencialmente os pulmões”, explica a doente numa publicação do Instagram, onde relata a sua situação e dá conta do pouco conhecimento que existe em Portugal relativamente a esse problema de saúde.
https://www.instagram.com/p/CMBGuo0jZt3/?igshid=1rj551ae4ycb3
A situação de Constança Braddell piorou “drasticamente” em setembro de 2020. “Tenho vindo a morrer lentamente. Perdi 13 quilos no espaço de três meses”, declara a jovem, que se encontra atualmente a oxigénio 24 horas por dia e ligada a um ventilador não invasivo para dormir, “porque é a única maneira de conseguir respirar”. “Uma simples ida à casa de banho parece impossível. Uma simples chamada ao telefone deixa-me exausta.”
Constança diz que tem visto a sua vida “a terminar lentamente”, mas que a situação tem “uma solução”, um novo medicamento, o Kaftrio, já disponível em vários países mas ainda indisponível em Portugal, onde carece de autorização para ser administrado. Segundo a doente, o Infarmed, organismo que regula medicamentos e produtos de saúde no país, “está ciente da eficácia deste medicamento e continua em negociações intermináveis para aprovação do financiamento do mesmo”.
A publicação, feita durante a madrugada desta sexta-feira, tem à data da publicação deste artigo mais de 136.706 likes e mais de nove mil comentários.
Infarmed diz que não foi requerida Autorização de Utilização Especial do medicamento
Num comunicado emitido durante a tarde desta sexta-feira, o Infarmed adianta que está a acompanhar o caso desde sexta-feira da semana passada, quando foi contactado por Constança Braddell, à qual diz ter explicado que poderá ter acesso ao Kaftrio através da Autorização de Utilização Especial (AUE), que deve ser solicitada pelo hospital onde é seguida, neste caso o Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
“No caso concreto deste medicamento, e enquanto decorre a sua avaliação (cujo objetivo é garantir o acesso de todos os cidadãos, quer às terapêuticas inovadoras, quer aos demais cuidados que necessitem no contexto do SNS), existe a possibilidade de acesso ao medicamento, da iniciativa do hospital, através de Autorização de Utilização Especial (AUE), ao abrigo de um Programa de Acesso Precoce (…). Os pedidos de AUE são fundamentados pelo hospital requerente, e incluem informação clínica detalhada do doente para o qual é solicitado o tratamento. Essa informação é depois avaliada caso a caso por peritos clínicos (médicos), pertencentes à Comissão de Avaliação de Tecnologias de Saúde do Infarmed”, explica.
Apesar dos pedidos de AUE “serem anónimos”, o Infarmed diz ter entrado em contacto com o hospital “no sentido de verificar se existia de facto um pedido pendente e, se necessário, apoiar o hospital nesse processo”. A Autoridade Nacional do Medicamento garante que, até esta sexta-feira, não lhe foi submetido “pedido de AUE para esta doente, tendo ese facto sido confirmado pelo hospital”.
“O Infarmed tem toda a disponibilidade para analisar o processo a fim de ser disponibilizado o medicamento à doente no mais curto espaço de tempo, apenas quando o pedido for submetido tal será possível.”
Já o Hospital de Santa Maria diz que pretende incluir “a doente numa segunda fase do Programa de Acesso Precoce (PAP) a Medicamentos ainda sem autorização de introdução no mercado”, à semelhança do que fez com dois outros doentes durante a primeira fase.
PS pede ao Governo rápida aprovação do remédio pelo Infarmed
O PS entregou uma resolução no Parlamento apelando ao Governo para acelerar o processo de aprovação de um medicamento para a fibrose quística (fq) pela da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed).
No projeto de resolução, os deputados socialistas recomendam “ao Governo que adote as medidas necessárias para que as terapias inovadoras, que aguardam aprovação pelas entidades competentes, sejam disponibilizadas aos doentes de fq, que delas necessitem, assegurando a respetiva autorização de comercialização no mercado e o seu financiamento público, de forma rápida e eficiente, evitando constrangimentos no acesso às mesmas”.
Ainda segundo o texto dos socialistas, “a fq, cujo nome deriva do aspeto quístico e fibroso do pâncreas, (…) estima-se que a nível mundial existam sete milhões de pessoas portadoras da anomalia genética da fq e cerca de 75.000 com a doença. (…) Em Portugal, estima-se que nasçam por ano cerca 30 a 40 crianças com fq”.
PSD pede a Comissão de Saúde da Assembleia da República que oiça Hospital Santa Maria e Infarmed
Também na sequência desta situação, o grupo parlamentar do PSD requeriu durante a tarde desta sexta-feira que a Comissão da Saúde da Assembleia da República “delibere ouvir” duas associações de fibrose quística, o conselho de administração do Hospital de Santa Maria e o Infarmed.
No requerimento dirigido à presidente da Comissão de Saúde, Maria Antónia Almeida Santos, os deputados democratas Ricardo Baptista Leite, António Maló de Abreu, Cláudia Bento e Márcia Passos apontaram que, nos “últimos cinco anos”, “surgiram novas terapêuticas para tratamento da fibrose quística”, mas que estas “ainda não se encontram disponíveis em Portugal”. Entre estas conta-se “um novo fármaco” que “demonstrou melhorar significativamente o prognóstico da fibrose quística”.
“Este fármaco, apesar de se encontrar já aprovado em vários países Europeus (Inglaterra, França e Suíça) e dispor de parecer favorável da Food and Drug Administration e da European Medicine Agency, ainda continua a aguardar a respetiva aprovação em Portugal”, lembraram.
“Recentemente têm sido noticiados casos de grave sofrimento humano associado à inacessibilidade dos doentes às referidas novas terapêuticas, ao mesmo tempo que se avolumam dúvidas no que se refere aos procedimentos de autorização de administração desses novos fármacos, designadamente envolvendo o INFARMED e o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte.”
Por essa razão, o PSD consideram importante que a comissão oiça sobre o assunto a Associação Nacional de Fibrose Quística (ANFQ), a Associação Portuguesa de Fibrose Quística (APFQ), o conselho de administração do Hospital de Santa Maria e o Infarmed.
Artigo atualizado às 19h11 com o requerimento do PSD