Era o segundo incêndio que Nuno André Ferreira estava a cobrir naquele dia, 7 de setembro de 2020, no concelho de Oliveira de Frades, em Viseu. Numa estrada municipal, ainda com alguma distância do incêndio, um casal olhava, apreensivo, para as chamas ao fundo. Ao lado, e dentro de um carro, um bebé distraído de tudo o que o rodeava olhava diretamente para a câmara fotográfica do fotojornalista da Agência Lusa. Nuno André Ferreira percebeu que a imagem seria diferente. Com essa fotografia — “Fogo na floresta” — venceu o terceiro prémio na categoria “Spot News” do World Press Photo deste ano.
“É uma imagem tirada durante a noite, numa estrada onde normalmente encontramos pessoas a fugir ou apreensivas ou só a ver o desenvolver do incêndio. Não é uma fotografia que estamos habituados a ver, nem que eu estou habituado a fazer porque não se trata de um popular desesperado a fugir do incêndio, de um bombeiro a combater as chamas ou de uma imagem onde se vejam as chamas mesmo diretamente”, explica o fotojornalista ao Observador.
A fotografia, acrescenta Nuno André Ferreira, representa precisamente um contraste entre os dois planos captados: “Uma criança que, com aquela idade, não tem a noção do que é um incêndio, que não tem a perspetiva dos pais — que estão apreensivos com o que se está a passar. Aquela criança está completamente descontraída, com um ar ternurento. É uma expressão que contrasta muito com o que acontece na parte de fora do carro, ainda que algo distante”.
O prémio atribuído na categoria referente às melhores fotografias do ano em cobertura de acontecimentos noticiosos inesperados ou de última hora, acrescenta, “significa muito” e é “uma felicidade imensa”, ainda que considere que o facto de ter sido um dos nomeados “já bastava”. “Entrar no World Press Photo, para mim, não é um objetivo, mas é o sonho de qualquer fotojornalista. Não persigo este prémio, mas toda a gente sonha ser nomeado ou distinguido“, sublinha, acrescentando que vai “continuar a trabalhar da mesma maneira”.
Para o repórter, a distinção tem também outro peso por mostrar que boas histórias podem acontecer em qualquer lado, mesmo longe “dos grandes centros, onde muita gente pensa que tudo acontece”, e mesmo ao lado de eventos com maior destaque mundial, como as eleições dos Estados Unidos, o terrorismo e o desporto.
Tem um sabor diferente quando consegues ser distinguido e estás num sítio em que supostamente 70, 80% das pessoas acharia que isso nunca seria possível. Uma boa história e uma boa fotografia não tem um sítio específico para acontecer. Posso sair de casa, descer as escadas e andar 20 metros na minha rua, numa aldeia com quatro, cinco casas e posso ter uma boa história”, sublinha ao Observador.
Nuno André Ferreira começou o seu percurso no fotojornalismo depois de estudar Comunicação Social, em Coimbra. Nunca teve raízes ligadas à área, mas sempre nutriu uma paixão pela fotografia. Depois de Coimbra, o repórter regressou a Leiria, onde começou a trabalhar como freelancer. “A minha primeira fotografia foi publicada no Notícias de Leiria, em 2002, na altura em que o petroleiro Prestige se afundou na costa espanhola”, revela. Mais tarde, o fotojornalista voltou para Viseu, onde trabalha com a agência Lusa desde 2009.
O prémio no World Press Photo não é a primeira distinção atribuída ao fotojornalista natural de Leiria. Em 2010, Nuno André Ferreira venceu o prémio nacional Estação Imagem, na categoria “Ambiente”, e em 2019 conquistou o Prémio Rei de Espanha de Jornalismo, com a fotografia “O Nosso Presidente Marcelo”.