“Time to Accelerate” é o título do evento (ao qual pode assistir) que vai reunir, dia 30 de junho, especialistas convidados e quadros da Mastercard, para debater e refletir sobre o atual momento da convergência digital e a transformação pós-COVID no setor do turismo, entre outros temas como a cibersegurança e a sustentabilidade.

A propósito deste momento de partilha de experiências e de conhecimento, em que serão analisadas as principais tendências de futuro no domínio das tecnologias de pagamentos, conversámos com a Country Manager da Mastercard, Maria Antónia Saldanha. A executiva, com mais de 20 anos de experiência na área dos serviços de pagamentos, considera que a inclusão e a diversidade são as duas palavras-chave na cultura Mastercard, e defende que a mentalidade das lideranças na próxima década deve incluir uma noção de planeamento com flexibilidade e inclusão, para conseguir reagir e adaptar, de um dia para o outro. A trabalhar, diariamente, com uma equipa espalhada pela Europa, valoriza a oportunidade de lidar com pessoas de diferentes nacionalidades e de perceber como as diversas abordagens e formas de analisar problemas constituem uma vantagem competitiva.

Quais são os principais desafios que se colocam, neste momento, à Mastercard?

Estão muito relacionados com os novos mundos dos dias digitais. Na verdade, a aceleração e a transformação digital trouxeram-nos o grande desafio de acompanhar os novos comportamentos dos utilizadores e as necessidades dos comerciantes. A maior parte dos comerciantes, que vivia apenas no mundo físico, precisara de evoluir para o digital, e esta é uma evolução que representa 20 a 30% daqueles empresários. Muitos deles, no futuro, já vão ser nativos digitais e, portanto, também temos de os acompanhar.

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O segundo desafio passa por um conjunto de soluções tão vasto que permita endereçar estes temas da aceleração digital, com novas plataformas, novas soluções que estão disponíveis e que podemos tornar acessíveis a quem precisa delas.

Um terceiro desafio é a aceleração da transformação do dinheiro físico em digital. A economia está muito mais rápida, a velocidade é muito maior e, portanto, é um desafio ter soluções que também se compatibilizam com essa velocidade e até ajudem a impulsionar uma economia saudável e mais dinâmica.

Como está a Mastercard a responder aos desafios do Open Banking? E que impacto tem a PSD2 [Diretiva Europeia de Serviços de Pagamentos] na atividade?

O Open Banking é, para nós, um eixo estratégico. É uma oportunidade para desenvolver novas soluções, e o nosso foco, inclusivamente, tem sido recorrer ao Open Banking para torná-lo tangível, permitindo que as PME tenham uma gestão financeira mais ágil, processos de decisão de crédito mais rápidos e novos métodos de iniciação de pagamento. Há um conjunto de oportunidades que o Open Banking trouxe, permitindo o desenvolvimento de soluções e serviços que estão disponíveis. A Mastercard adquiriu, recentemente, a Finicity — que é uma plataforma de Open Banking —, precisamente para complementar as soluções e serviços, assegurando o desenvolvimento de novidades que estão alinhadas com os mercados atuais.

Imagine que temos um processo mais antiquado, com muita papelada e muita burocracia, para conseguir uma aprovação de crédito. Com a padronização de API, que nasceram ou que foram vulgarizadas com o Open Banking, podemos transformar um processo outrora muito burocrático num processo muito ágil, muito rápido e que até reduz os tempos de resposta ao utilizador, economizando tempo e recursos.

A PSD2 é muito mais abrangente que o Open Banking e funciona como um grande incentivo à digitalização dos pagamentos. Nós sabemos que a pandemia veio intensificar, aliás contribuiu de forma crítica, para o aumento da adoção de comportamentos como o contactless, que já existia e não tinha sido adotado massivamente por uma questão cultural. Outro fator muito relevante, que foi trazido pela PSD2, é o da segurança nas operações. E aqui sempre num binómio entre a conveniência e a segurança. Oferecemos novas metodologias de segurança que permitem aumentar o conforto e a segurança na utilização de novos serviços e novos métodos de pagamento. É impossível falar em pagamentos sem falar em segurança, porque sem segurança, não há confiança. Portanto, creio que a PS2 representa uma grande oportunidade para Mastercard.

No quadro da segurança e deteção de fraude, quais têm sido os desenvolvimentos feitos pela Mastercard na área da cibersegurança?

A Mastercard tem vindo a trabalhar muito neste domínio, inclusivamente há relativamente pouco tempo, adquirimos a NuData, que desenvolve o serviço NuDetect, o qual permite trabalhar com sistemas de biometria passiva, sistemas de reconhecimento de comportamentos, seja o modo como pegamos no smartphone, a forma como digitamos o PIN ou como iniciamos o dispositivo. O sistema vai ajudar-nos a reconhecer um conjunto de padrões de comportamento e, portanto, identificar se somos o proprietário daquele equipamento e verificar se está protegido para ser usado como um meio seguro.

Temos, portanto, um conjunto de novidades que integramos nos nossos serviços e colocamos à disposição de clientes, de comerciantes e de entidades financeiras ou bancárias, para que possam integrar nos serviços disponibilizados aos consumidores e dar-lhes a confiança adicional para os usarem. O relatório do World Economic Forum ainda há pouco tempo dizia que há dois temas críticos para a segurança no mundo: as quebras nas infraestruturas de tecnologias de informação e as falhas cibernéticas. A cibersegurança é um tema incontornável, e no caso da Mastercard, disponibilizamos um vasto número de soluções e de serviços para que todos os operadores na rede possam integrar a melhor segurança, transmitindo a confiança necessária aos clientes.

O uso de Machine Learning e de tecnologias de Inteligência Artificial constitui uma ameaça ou uma oportunidade?

Claramente, uma oportunidade. O Machine Learning e Inteligência Artificial são tecnologias que complementam perfeitamente os sistemas de deteção e de prevenção de fraude, tornando-os mais robustos e mais resilientes. São vistos como uma oportunidade de melhoria ou de aperfeiçoamento dos serviços e soluções de segurança.

Têm de ser integrados e utilizados na devida proporção para que os utilizadores destes serviços, ou dessas funções, não tenham receio de usar uma tecnologia que desconhecem, porque, muitas vezes, associado a estas tecnologias de ponta, surge um conjunto de mitos que dificulta a adesão.

Fotografia: Eduardo Ribeiro

Um estudo recente da Truata, entidade à qual a Mastercard recorre para fazer análises e estudos de mercado, concluiu que a maior parte dos utilizadores e consumidores de produtos online considera que as empresas são responsáveis pela proteção de dados, pela segurança nos serviços e pela criação de ambientes seguros e saudáveis para utilizarem os seus serviços e soluções. Portanto, as empresas devem assegurar esses recursos, como a Mastercard tem feito, de modo a aumentar a segurança dos sistemas e das transações.

Como olha para o aumento do número de fintech, no mundo e em Portugal, em particular?

É muito positivo, muito saudável e, felizmente, notamos que vão crescendo continuamente. Muito positivo, porque as startups, ou as fintechs em particular, vêm trazer alguma disrupção no dia a dia. Ou com tecnologia ou com modelos de negócio, porque trazem soluções, por exemplo, de sustentabilidade ambiental ou de sustentabilidade económica. E, de facto, são muito interessantes, porque vêm mostrar que o mundo não tem de ser feito da mesma maneira. E depois têm uma forma de trabalhar muito dinâmica. Portanto, para qualquer sociedade e qualquer economia que tenha recurso a soluções tecnológicas, ser desafiada por uma fintech é muito positivo. Para a Mastercard, em Portugal, o crescimento das fintech é visto com muito bons olhos. Internacionalmente, temos um programa chamado StartPath, que é um acelerador de startups e fintechs num programa de seis meses que, como o próprio nome indica, acelera os negócios ou as tecnologias e que permite ou captar parceiros através da nossa rede ou captar investimento. Portanto, nós capacitamos as startups para preencher um gap que possam ter. Pode ser a nível de investimento, a nível de conhecimento ou da definição da estratégia de internacionalização. Costumo dizer que eventos como a Web Summit causaram a aceleração que faltava. Se calhar colocou o país no radar, o que por um lado também é interessante porque isso tem permitido o aparecimento de imensas startups e fintechs que vêm para desafiar o mercado, com novas soluções.

Como analisa o atual nível de transição digital no mercado português?

Portugal sempre foi pioneiro na adoção de tecnologias. Por outro lado, é um país que, pelo facto de ser pequeno, também torna mais fácil a adoção de novas tecnologias. A pandemia veio criar aqui uma oportunidade, como no caso do contactless. A tecnologia já existia há anos, todavia foi preciso uma pandemia de efeitos catastróficos para acelerar a adoção de alguns comportamentos. Não havia nenhuma barreira tecnológica nem nenhuma barreira de negócio, o que havia era uma barreira cultural. Bastou desbloquear aquele elemento cultural para incentivar a adoção. A transição digital nota-se mais nos centros urbanos, onde é mais visível o volume de comerciantes que viviam no mundo físico e que agora passaram a ter uma loja online. Passaram a viver num ecossistema de convergência digital, que é um mundo onde o conceito de lugar não é relevante. O cliente quer o produto, encomenda e aguarda a entrega. Pode ser em casa ou na loja, numa convergência digital que também está a acelerar. Há cada vez mais comerciantes a adotar perfis digitais e a aceitar pagamentos instantâneos. O próprio mundo da pandemia acelerou aquilo que se chama gig economy, que é uma economia que os pagamentos instantâneos também aceleraram. Portanto, diria que vejo que a transição digital está muito no bom caminho. Uma das minhas missões é, aliás, continuar a acelerar essa transição digital, nomeadamente identificar quais são os setores e segmentos onde ela pode ser exponenciada e contribuir para isso através de parceiros locais e de redes de colaboração. O objetivo é fazer com que Portugal continue na vanguarda da transição digital.

Qual o impacto do e-commerce, que registou um crescimento durante a crise pandémica, na estratégia da Mastercard?

Não foi preciso alterar a estratégia. Apenas veio confirmar a estratégia que já estava decidida. Falamos há pouco dos investimentos no Open Banking, que a Mastercard já tinha iniciado e já tinha identificado como estratégicos. É um dos eixos que se manteve e se confirmou. Outro eixo relacionado com a estratégia é o “multirail” [uma única infraestrutura que mantém conectados todos os tipos de pagamentos e de informações, garantindo confiança, flexibilidade e liberdade de escolha], sistema que torna irrelevante a forma como a transação é gerada, onde ela acaba ou onde ela termina. Ou seja, se a transação é iniciada por um cartão, mas termina numa conta ou se é iniciada numa conta e termina num cartão — que rails ou que canais é que ela usa para se materializar. Isto já era uma estratégia iniciada pela Mastercard e na qual tinha investido, inclusivamente, com a aquisição da Vocalink, em 2017, e da Nets, uma plataforma estratégica que adquiriu mais recentemente, exatamente para reforçar esta estratégia multirail.

O que importa é que as transações sejam efetuadas com total segurança, eficiência e de acordo com as necessidades de quem recebe e de quem paga. Além destes dois eixos estratégicos, que já estavam a ser desenvolvidos e que fazem parte da base da Mastercard, um outro eixo estratégico é o da sustentabilidade e o da promoção da inclusão. Porque tudo o que fazemos, e como fazemos, pretende, de facto, promover uma maior inclusão digital e financeira.

Qual a estratégia da Mastercard para responder às tendências dominantes no mercado dos meios de pagamento?

Relacionada com a variedade de canais, é assegurar que as pessoas tenham acesso aos meios de pagamento como lhes for mais cómodo. Podemos hoje falar do smartphone, porque é uma ferramenta social e de trabalho. Mas podemos falar do tradicional cartão que não deixou e não vai deixar de existir. Mas também podemos falar dos equipamentos que eram apenas relógios de pulso e que hoje são muito mais do que isso: podem servir para fazer pagamentos, para as pessoas poderem fazer o seu trabalho. No fundo, assegurar que independentemente do tipo de comportamento que a pessoa tenha ou de como é que se organiza no seu dia a dia, assegurar que as soluções estão presentes e estão disponíveis para cada um, adaptadas às suas necessidades.

Qual a visão da Mastercard para os novos mercados das criptomoedas e criptoactivos (DeFi, NFT’s)?

A pandemia também acelerou muito o crescimento das criptomoedas. Para nós, é um mundo normal, agora. Assim como falamos há pouco, que uma pessoa podia fazer um pagamento de um cartão para uma conta, ou de uma conta para um cartão, é indiferente A mesma coisa se passa com as criptomoedas; isto é, nós já temos utilizadores que transformam criptomoedas em moedas de câmbio regulado, vamos chamar assim, ou o inverso.

O que é importante é que se os utilizadores quiserem recorrer a esses métodos de pagamento, os tenham disponíveis. Desde já, suportamos, na nossa rede, um conjunto de criptomoedas selecionadas, porque o mundo acelerou muito a variedade. O que no fundo temos vindo a fazer é analisar quais são as que têm tido referências para poderem ser aceites, integramos esse tipo de aceitação na nossa rede e um regular utilizador se quiser recorrer às suas criptomoedas para fazer um pagamento a algum comerciante, pode fazer, ou o inverso — receber de alguém moedas criptográficas. Trata-se de integrar como mais um método de pagamento e mais um instrumento que disponibilizamos.

A blockchain vai mesmo provocar uma revolução nos hábitos e na forma de fazer negócios?

Tem potencial para revolucionar, sem dúvida. A blockchain em si é uma tecnologia fantástica, porque permite, por exemplo, estabelecer cadeias de rastreabilidade com imenso rigor. É uma tecnologia que permite uma pegada — que até é curioso, porque os ambientes em que, às vezes, é usada poderiam ser incompatíveis com isso. Somos uma empresa com mais de 250 pedidos de patentes, temos 89 concedidas, o maior número de patentes relacionadas com blockchain. Estudamos avidamente a tecnologia, temos inclusivamente uma solução que é a Mastercard Provenance Solution, que permite definir cadeias de rastreabilidade. Fizemos um caso de estudo com a empresa agrícola, a GrainChain para lhe permitir estabelecer um processo de rastreabilidade na sua cadeia de distribuição. É uma tecnologia interessantíssima que tem um potencial imenso e para nós, claramente é uma tecnologia que vale a pena não só investir como continuar a estudar.

Fotografia: Eduardo Ribeiro

O número de pessoas a fazer pagamentos com o smartphone está a crescer. Será que algum dia vamos deixar de usar “dinheiro vivo”?

Há todas as condições para isso. Não é por falta de tecnologia ou de empresas que investem todos os dias nesse objetivo, como a Mastercard, que não se torne uma realidade.

Temos de ter em conta que o país não tem todo — aliás, o mundo não tem todo — o mesmo nível de desenvolvimento, nem tecnológico, nem económico, nem financeiro. Portanto, por muito que substituir as transações de dinheiro tradicional por transações eletrónicas seja também uma missão da Mastercard, na verdade não é possível estimar se e quando poderá acontecer. Também faz parte da missão da Mastercard, e isso é um tema particularmente sensível, a inclusão financeira e social. Nós não podemos fazer com que a aceleração na adoção de tecnologias crie grandes diferenças culturais ou até acentue os gaps que já existem em algumas geografias do mundo. Pelo contrário, temos de assegurar que nessas geografias conseguimos fazer saltos qualitativos para que as comunidades possam sentir-se incluídas e, de facto, envolvidas, numa evolução tecnológica. Introduzir melhorias pela adoção de métodos de pagamento eletrónico, por exemplo desde as tecnologias digitais ao recurso a serviços financeiros. Quando ou como é que isso pode acontecer? Essa é a pergunta à qual, provavelmente, ninguém arriscará dar uma resposta exata.

Como vê o futuro da Mastercard?

Vejo um futuro muito próspero. Como digo sempre, porque é um motivo de orgulho, a Mastercard tem, acima de tudo, uma forma de trabalhar muito orientada para a inclusão, englobando as vertentes social e financeira, e para diversidade.

Isto passa por proporcionar os serviços financeiros e a transacionalidade com um volume de transações crescente. Temos, naturalmente fruto da pandemia, um número de oportunidades ainda maior ao nosso dispor para crescer, apresentar soluções e mostrar como somos relevantes. Em particular no que me diz respeito em Portugal, esse é o meu desafio: mostrar como é que podemos ser relevantes, como é que podemos marcar a diferença no dia a dia de um pequeno comerciante ou de um grande retalhista, acelerando aquilo que são os seus processos, acelerando os seus negócios e proporcionando condições ideais para que mais utilizadores tenham acesso a serviços e a soluções. Portanto vejo um futuro muito próspero, felizmente.

Portugal tem todas as condições para se manter na vanguarda, tem sido reconhecido como um país extremamente inovador nos serviços financeiros e na sua adoção. Nós dinamizamos a utilização de sistemas, como os dos relógios para pagamentos, e vemos que a adoção das pessoas foi muito rápida, porque é fácil de usar, com confiança. Sentir que as pessoas confiam na Mastercard, que é uma marca que lhes inspira confiança, é muito bom. Aliás, o facto de ser reconhecida há tantos anos como uma marca de excelência é um fator de satisfação exatamente por isso, pelo facto de nos reconhecerem como empresa segura, fiável e de confiança para utilizar os serviços.