Inspetores da Autoridade da Concorrência, com mandado judicial, fizeram buscas na sede da SIBS, empresa privada que é dona da rede Multibanco, no início deste ano, apurou o Observador junto de múltiplas fontes com conhecimento do processo.
Segundo a informação recolhida, estas buscas da Autoridade da Concorrência partiram do facto de o supervisor ter indícios fortes de práticas anti-concorrenciais – um tema sobre o qual o supervisor tem feito várias declarações públicas, relativamente à SIBS. Como é comum nestes processos, um juiz autorizou que fossem feitas buscas para tentar obter provas que poderão, ou não, levar a um processo concreto de contraordenação. Ao que o Observador apurou, nesta fase não estará iminente a conclusão desse processo.
O “raid” aconteceu no início do segundo confinamento, em pleno pico da pandemia de janeiro e, por isso, numa altura em que poucas pessoas estavam no edifício.
Embora não haja uma ligação direta, as buscas terão sido um fator determinante a levar a SIBS a não se candidatar ao concurso para a gestão do programa governamental IVAucher, um concurso que parecia “feito à medida” da SIBS, mas que acabou por cair no colo do único outro concorrente, a Saltpay (empresa dona do Pagaqui).
Contactada, a Autoridade da Concorrência não faz comentários. O Observador ainda não obteve resposta de fonte oficial da SIBS – esta notícia será atualizada assim que essa resposta chegar.
A SIBS, que tem como acionistas os principais bancos em Portugal, tem sido nos últimos anos muito pressionada pela Autoridade da Concorrência, supervisor liderado por Margarida Matos Rosa. O supervisor tem recebido várias queixas ao longo dos anos e chegou a considerar a SIBS “quase monopolista” e responsabilizá-la publicamente pelas “barreiras à inovação e à entrada” no mercado de serviços de pagamentos.
O processo do IVAucher terá sido uma das piores derrotas sofridas pela SIBS, que estava bem posicionada para vencer o concurso porque um dos principais critérios era a existência de uma rede que desse o maior grau possível de acesso da população. Mas a Autoridade da Concorrência sublinhou que esse programa devia ser ganho por uma empresa (a SIBS ou outra) que garantisse a interoperabilidade. Nos termos em que o concurso estava a caminhar, a Autoridade da Concorrência via risco de o programa ser desenvolvido “em torno de uma solução fechada” sem que fossem “acauteladas obrigações de não-discriminação e de abertura”.
“Caso estes riscos se venham a concretizar, podem resultar em distorções de concorrência ao nível dos serviços de pagamento”, referiu a AdC num parecer enviado ao Governo também nesse mês de janeiro. O concurso para gerir o IVAucher, que quer incentivar o consumo nos setores da restauração, alojamento e cultura, acabou por ir para a empresa que comprou a rede Pagaqui.
O responsável dessa empresa, João Barros, comentou em entrevista recente ao jornal Público que o facto de o IVAucher ter ido para uma empresa que não a SIBS poderá ter “um impacto grande no sector dos pagamentos em Portugal, que tem tido pouca abertura nos últimos anos”.
Na altura, a Autoridade da Concorrência também criticou o Governo, pela forma como foi montado o concurso e recomendou que se “ponderasse se o estabelecimento de critérios menos restritivos em termos da solução a implementar permitiriam prosseguir os objetivos de política pública inerentes ao programa IVAucher”.