Enviado especial do Observador, em Tóquio

O início da presença portuguesa em Tóquio até teve logo um quinto lugar de Catarina Costa na categoria de -48kg do judo que prometia altos voos na modalidade mas nem tudo correu bem nos primeiros dias, entre alguns resultados que podiam não ser propriamente cataclismos mas que sabiam a pouco como a passagem de Telma Monteiro pelos -57kg de judo, sem conseguir defender a medalha de bronze conquistada no Rio de Janeiro, as derrotas da equipa de andebol ou os lugares fora dos diplomas do ciclismo na prova de estrada e no contrarrelógio, percetíveis pelo nível da concorrência mas abaixo do que era antes apontado.

Mais do que alguns resultados aquém, os discursos que se seguiam também nem sempre deixavam a melhor imagem. A falta de apoios, as diferenças de adaptação logística, a escassez de cultura desportiva no país. Não foi assim com Gustavo Ribeiro no skate, que fez a final em esforço por uma lesão que lhe condicionou toda a preparação nos últimos meses, foi assim com João Pereira no triatlo ou Paulo Pereira no andebol. E ainda houve exemplos, bons exemplos, de atletas que descreveram situações complicadas no caminho feito nestes últimos anos que valorizaram o que têm e até onde chegaram, como Yolanda Hopkins no surf.

Depois, a medalha de bronze de Jorge Fonseca no judo foi uma espécie de ponto de viragem na participação portuguesa, uma viragem que todos sabiam que estava para a acontecer tendo em conta o calendário de todas as provas. Mais do que isso, o judoca que foi terceiro na categoria de -100kg demonstrou que ir a um pódio olímpico não é por si só um fim, tendo em conta a vontade de ser campeão já a apontar para 2024. Foi essa forma de pensar, de verdadeiros campeões com ou sem medalha, que se assistiu mais a partir daí.

Patrícia Mamona conquistou a medalha de prata numa final do triplo salto em que a venezuelana Yulimar Rojas bateu o recorde do mundo, superando o seu melhor registo e marca nacional em 35 centímetros (e chegando à fasquia dos 15 metros). Fernando Pimenta juntou-se ao lote de atletas com duas medalhas nos Jogos, mesmo considerando que poderia ter feito mais do que o bronze no K1 1.000. Pedro Pablo Pichardo sagrou-se o quinto campeão olímpico português, coroando no triplo saltos aquela que foi a melhor participação de sempre numa edição dos Jogos com quatro medalhas em três modalidades diferentes.

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Perante este cenário, José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico de Portugal, não teve dúvidas em fazer um balanço muito bom da participação nacional, onde conquistou o dobro das medalhas que tinham sido apontadas (duas), mais diplomas do que os esperados (15) e muitos mais top 16 (36).

“O balanço em termos gerais foi positivo. Todos conhecemos os problemas que havia sobre a realização dos Jogos, as dúvidas que existiam. Apesar de todas as limitações e constrangimentos, todas as circunstâncias adversas, valeu a pena. As competições não tiveram fatores alheios à naturalidade daquilo que são as competições desportivas, as federações internacionais estiveram à altura e, apesar de não ter havido público, o que se lamenta, viu-se nas provas realizadas na rua um número significativa de japoneses nos eventos. Os voluntários tiveram uma colaboração profícua, muita disponibilidade e simpatia, por vezes em condições difíceis mostraram uma enorme disponibilidade. Vamos partir com a sensação de que se abriu uma esperança para reverter a situação que ainda vivemos de pandemia”, começou por dizer.

“Não tenho muita experiência de Aldeias Olímpicas, apenas de Atenas, do Rio de Janeiro e agora de Tóquio, e considero que esta era uma boa Aldeia. A nível de construções, de mobilidade, de confraternização que foi muito além do que era esperado. Sempre de máscara, é certo, mas senti entre os atletas de diferentes países uma convivência, uma confraternização maiores do que esperado. A primeira semana é sempre crítica, até na questão dos veículos, mas correu bem, até nos espaços, nos quartos”, prosseguiu, fazendo um balançado positivo da organização entre elogios a todo o trabalho feito pela Missão para que nada faltasse.

“Em relação aos objetivos propostos, foram plenamente atingidos, em alguns pontos até quase todos ultrapassados. Tínhamos o objetivo de duas medalhas, conseguimos quatro; tínhamos objetivos de chegar a um número nunca inferior de 12 diplomas, conseguimos 15; tínhamos objetivos de conseguir 26 lugares entre os 16 primeiros, conseguimos 36. Houve um aumento da pontuação, queríamos mais de 40 e conseguimos 55. Contabilizámos três recordes nacionais, cinco pessoais, 17 melhores marcas em Jogos e 26 melhores classificações. O que não atingimos? A participação feminina prevista, que era de 40%, foi 39,11%; queríamos estar em 19 modalidades mas conseguimos apenas 17. Queríamos um rácio de atletas apoiados pelo COP e outros que se conseguem só apurar depois de 80% mas ficámos nos 75%, embora mais 25%. Assim, foram objetivos que ficaram próximos do que se tinha previsto”, destacou na análise global.

Saímos satisfeitos e esperamos que este esforço possa ter ganhos do ponto de vista da concentração de apoios, recursos e medidas que ajudem ao desenvolvimento do desporto nacional. No contexto do sistema internacional, tivemos um valor e uma competitividade como nunca tínhamos registado antes. Agora é importante não regressarmos ao que tínhamos.”

Em paralelo, José Manuel Constantino falou também das negociações para Paris, para a importância dos clubes no desporto nacional e para a importância dos resultados alcançados para o próprio país.

“Quatro medalhas? Havia objetivos contratualizados e outros expectáveis… Sim, posso dizer que estes são os melhores Jogos de sempre de Portugal, é um facto. Para Paris-2024 as negociações ainda não se iniciaram, da parte do presidente do IPDJ já houve um contacto para terem início logo a seguir a estes Jogos em Tóquio e os resultados alcançados são uma boa almofada. Se ficasse aquém, poderia ser mais complicado. Há um reforço do compromisso pelo governo, um aumento do apoio à preparação olímpica. Era bom que todos estes resultados fossem aproveitados mas o maior reconhecimento tem de ser feito aos atletas”, frisou, deixando para mais tarde a questão das eleições no Comité e uma possível recandidatura à liderança.

“Não houve desilusões pela entrega de todos os atletas mas houve resultados que ficaram aquém do que era esperado e foram os próprios atletas a assumir isso. No entanto, estes resultados transmitem aos portugueses uma melhoria de auto estima, de nos valorizarmos. Isso é positivo, dar alento aos portugueses para que se sintam orgulhosos a ver o hino a ser cantado num tempo difícil, traz um efeito positivo para a sociedade em geral. Nos últimos dois ciclos olímpicos Portugal deu um passo significativo em termos de organização interna e resposta aos desafios, quaisquer que sejam. Mas, como tinha dito, nunca iria imputar os resultados às condições, fossem quais fossem”, destacou, antes de falar também da importância dos clubes, da introdução de novas modalidades nos Jogos e da questão da paridade na delegação nacional.

“É necessário ceder mais ao desporto, que tem um papel cada vez mais presente, de modo a que se possa exponenciar. Medidas? Há um elemento fundamental, que é o centro do desenvolvimento desportivo: os clubes. Sem clubes não há atletas, deve incidir-se no sentido de vitalizar os clubes que são as estruturas base do tecido associativo. Depois, há novos desportos a surgirem que são novos desafios a que é preciso haver uma adaptação. Portugal teve resultados excelentes nas novas modalidades em que participou e é preciso apostar também nesses novos desafios e que são as tendências dos mais jovens”, referiu. “Portugal tem de fazer um esforço para aumentar o leque de modalidades presentes nos Jogos, deve haver um esforço de consolidação dessas modalidades. Karaté, golf, tiro, pentatlo, esgrima…”, concluiu de seguida.