O coletivo de juízes do Tribunal de Santarém, que está a julgar o caso Tancos, decidiu fazer alterações à acusação do Ministério Público tendo em consideração os depoimentos de alguns dos 23 arguidos do processo, entre eles o ex-ministro da Defesa, Azeredo Lopes. Para que os advogados se pronunciem sobre essas alterações, o coletivo, presidido pelo juiz Nelson Barra, optou por adiar a leitura da decisão para o dia 28 de outubro.

Uma das alterações que os magistrados fizeram depois de ouvirem os arguidos e várias testemunhas ao longo do último ano é precisamente em relação ao ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, que o Ministério Publico acusou de prevaricação para agora pedir a sua absolvição. O Ministério Público acusou-o de ter sido informado pelo então diretor da Polícia Judiciária Militar, Luís Vieira, de esta polícia ter conduzido uma “uma investigação em curso que funcionou paralelamente à da Polícia Judiciária, ou seja, uma construção da realidade, uma encenação”.

Depois de acusar Azeredo, MP pede agora que seja absolvido

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Agora o tribunal veio alterar esse ponto do despacho de acusação dando-lhe outra narrativa: a de que Luís Vieira disse ao então governante algo bem diferente e que dificilmente podia fazer o ministro pensar que a PJM tinha cometido um crime. Segundo esta alteração, a que o Observador teve acesso, para o tribunal Luís Vieira disse a Azeredo Lopes que o material furtado em Tancos não tinha sido “recuperado com base numa chamada anónima, mas antes através da indicação de um informador da PJM que estava com receio da Polícia Judiciária e não quis ser identificado”. Por isso, tinha a PJM transmitido no Comunicado oficial a existência de “uma chamada anónima para proteger a identidade do informador”.

Além disto, o tribunal também alterou outro ponto de acusação relativamente a um encontro entre Luís Vieira e o ministro a 3 de julho de 2017, pelas 20.10 horas. O Ministério Público dizia que ambos se tinham encontrado na casa do governante, mas, depois dos seus testemunhos, o tribunal vai considerar para a sua decisão que, afinal, este encontro se deu na rua, perto da casa do ex-ministro.

Ao longo do julgamento, a defesa tem também tentado provar que tanto a PJM como a GNR de Loulé não sabiam que João Paulino tinha afinal sido o cérebro do assalto a Tancos e pensavam que ele apenas tinha informações. A acusação do Ministério Público afirma mesmo que a certa altura, em finais de julho de 2017, Paulino disse mesmo a Bruno Ataíde — o militar da GNR de Loulé que conhecia desde criança — que tinha participado no crime e na ocultação das armas. Agora o tribunal recusa que Paulino o tenha dito, reescrevendo na acusação o que ele disse a  “Ataíde: “não estava envolvido, mas sabia onde estavam as armas”.

Tancos. Azeredo acusa MP de tê-lo posto como uma “espécie de poste” a ouvir a “descrição de um crime”

O tribunal também colheu a versão de Luís Vieira e Vasco Brazão quanto ao seu papel na PJM. Se a acusação dizia que este porta-voz era quem “controlava” toda a investigação, já o tribunal está a considerar a tese de Brazão: de que ele passou a “integrar” a investigação” e não a “controlar”.

O coletivo de juízes também acolheu a tese do próprio Paulino, usando o seu depoimento para alterar a acusação, de que a droga apreendida na sua casa servia em parte (a cocaína) para consumo próprio), enquanto as mais de uma centena de haxixe serviam para um amigo que iria buscar-lhe o produto. Será por estas circunstâncias que irá ser julgado, e não por liderar um grupo que traficava a droga e que ele lhes vendia, como dizia o Ministério Público.

Tancos. Azeredo acusa MP de tê-lo posto como uma “espécie de poste” a ouvir a “descrição de um crime”

Também o grupo de Paulino não tem os elementos que o MP diz ter. Na acusação lê-se que ele e cinco outros arguidos se juntaram para vender droga e para executar o plano do assalto. Mas a narrativa de Paulino parece ter vingado em tribunal e, afinal, no crime participaram apenas três. E mesmo o alicate que o Ministério Público diz terem usado foi utilizado por Paulino e já depois de estar no interior das instalações, graças a um buraco na vedação.