Está aí a 75.ª edição da NBA e os olhos dos amantes do desporto, e do basquetebol em particular, vão estar em Milwaukee quando, no virar desta terça para quarta-feira, na hora portuguesa, os Bucks, campeões em título, receberem os Brooklyn Nets para o começo da maior (e, para a maioria, melhor) liga de basquetebol do planeta. Para a temporada 2021/2022, além de jogos espetaculares, triplos praticamente do meio-campo e afundanços poderosos, há um ingrediente extra, dado que pela primeira vez um português está na NBA, neste caso nos californianos Sacramento Kings: Neemias Queta, de 22 anos.

Neemias jogou três anos nos Utah State Aggies, uma equipa da NCAA (liga universitária dos EUA), e foi no passado mês de julho a escolha n.º39 no draft da NBA. Nascido em Lisboa, filho de pais guineenses, o jogador fez a formação entre o Barreirense e o Benfica antes de se mudar para os EUA em 2018. Três anos depois, deu o salto mais aguardado pelos basquetebolistas do mundo inteiro e fez história no basquetebol português.

“Estou muito contente. Foi lindo. Esperava por este dia há muito tempo e finalmente chegou o dia. Quando estive lá [em Sacramento] senti que foi um bom treino, que foi um dos melhores. E o feedback que recebi deu-me a entender que precisavam de um jogador com as minhas características. A partir daí, era só esperar e ver se era escolhido. Acho que posso ter minutos. É uma boa equipa, uma equipa jovem, precisavam de defesas e acho que consigo melhorar a equipa com a minha entrada. Já me vejo a jogar, claro, mas ainda é cedo e tenho de preocupar-me com o dia de amanhã e fazer uma boa pré-época”, disse o português então à Sport TV, minutos depois de saber que ia entrar na NBA, revelando depois que mandou bordar as iniciais da avó, da mãe e do pai, para além do código postal do Vale da Amoreira, o bairro onde cresceu, na camisa preta que usou ao longo do draft.

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Conhecido por ser forte na defesa e na luta das tabelas, Neemias, num media day dedicado a Portugal já durante o campo de treinos da equipa, afirmou ao Observador que queria ir ao encontro do que é a NBA hoje em dia. Porque se é verdade que Curry, Durant, Harden ou Lillard lançam de todo o lado, jogadores grandes e fortes como Jokic ou Giannis ainda têm lugar na liga. Sobre isso, foi claro: “Ainda não tenho capacidade para o tiro exterior, é mais uma ideia de futuro. De momento não me vejo a ir para a linha de três lançar. Mas é para isso que estamos cá a trabalhar. Para trabalharmos coisas a que não estamos habituados e chegar lá um dia. Tenho trabalhado e quero lançar efetivamente do perímetro”.

Na pré-época, Neemias teve alguns minutos e marcou os primeiros pontos com a camisola dos Kings, mas não alinhou em todos os encontros. Aliás, ao ter um two way contract (contrato que estipula que o salário de um atleta depende da liga em que joga) com a equipa, e estando “apenas” nos 17 jogadores e não nos 15 do roster final, o português deve alinhar maioritariamente pelos Stockton Kings, equipa da G League, uma liga de desenvolvimento. Pegando num exemplo português, seria como se Neemias assinasse pela equipa de futebol do Sporting e jogasse depois mais vezes pela equipa “B”, mas sempre com a hipóteses de ser chamado ao conjunto principal. Neste caso por Luke Walton, ex-jogador que orienta os californianos. Bobby Jackson, outro ex-jogador, é o timoneiro da equipa da G League.

E é precisamente nesta G League que Neemias deverá passar mais tempo. Segundo Ricardo Brito Reis, especialista e comentador da NBA na Sport TV, “a expectativa é de que faça mais jogos nos Stockton Kings”. Fala nuns Sacramento “mal construídos, porque têm muitos bases, muitos postes e muitos jogadores que podem jogar a poste e, por isso, o Neemias tem muita concorrência que parte à frente dele na hierarquia”. “O que não é mau, porque não vai ser o último jogador do banco que está lá a bater palmas e sem jogar. Assim vai estar a jogar a ganhar ritmo e a aprender. É bom para que possa evoluir. A equipa encara o Neemias como um projeto de desenvolvimento e a G League está cada vez mais evoluída e trabalha-se no desenvolvimento e no foco de os jogadores estarem preparados para jogar ‘lá em cima’”, acrescentou. Para Ricardo, o atleta português, autor de história na modalidade para Portugal, “precisa de se habituar ao ritmo da NBA, diferente de tudo o que ele conhece, e precisa de ganhar massa muscular e peso”, sendo “bom que possa fazer isso na G League a ter minutos”. Mas, obviamente, podem sempre acontecer lesões ou outras contingências do desporto que façam Neemias dar um pulo aos Sacramento Kings, até porque “Tristan Thompson [colega de equipa e concorrente à posição de poste] pode sair durante a temporada, porque é um jogador em final de contrato, apetecível e que pode chegar a um acordo de buyout [saída]”.

“Agora ninguém te trava!” Neemias Queta, “o gigante” do Vale da Amoreira que levou o bairro para a NBA

Com Neemias a ganhar ritmo e minutos na G League, os Sacramento Kings vão então, muito provavelmente, arrancar a NBA sem o português, numa época em que alguns dos principais candidatos estão com sérias dúvidas no seu seio. Um exemplo? Os Brooklyn Nets, para Ricardo Brito Reis os principais favoritos, e que são “ainda mais candidatos sem Kyrie Irving”, que está de fora por não querer ser vacinado contra a Covid-19. “É um foco de problemas e a ausência vai dar mais estabilidade. É melhor do que jogar em part time ou sair várias vezes sem justificação para tratar de problemas pessoais, como tem feito. A dupla Kevin Durant-James Harden é, a par de LeBron James e Anthony Davis, o melhor duo da NBA, e quem os tem arrisca-se a ser sempre candidato ao título”, referiu. E já esta noite, os Nets visitam os campeões Bucks, de Giannis Antetokounmpo, que deverão ser “a segunda equipa mais forte do Este”, porque “têm experiência e já chegaram lá”, conseguindo ser “campeões com mérito”. “É Nets, Bucks e depois os outros”, conclui o comentador sobre a Conferência Este.

Basquetebolista Kyrie Irving afastado dos Brooklyn Nets enquanto não se vacinar

Mas falar em basquetebol é falar também de LeBron James, que mesmo aos 36 anos mostra uma longevidade incrível na qualidade do seu jogo, e dos seus Lakers, que adicionaram peças como Carmelo Anthony ou Russel Westbrook. Questionado pelo Observador sobre este último, Ricardo Brito Reis afirma que “quem contrata Westbrook está a candidatar-se a um triplo duplo em todos os jogos mas também aos turnovers. Duvidando do “encaixe com LeBron James”, visto James ser “mais decisivo com bola”, algo que Westbrook vai acabar por “tirar”, o que pode “criar problemas ofensivos com os dois em campo”. “Estou muito curioso para ver os dois em campo. Acho que o treinador [Frank Vogel] vai tentar separar ao máximo os períodos de jogo dos dois, mas nos playoff as coisas mudam e os treinadores jogam com as figuras e as estrelas. O LeBron James até vai agradecer fisicamente por ter o Westbrook, mas nos playoff é dar a bola ao Lebron e resta saber o que vai fazer Westbrook depois de ter passado um ano sempre com a bola na mão. Vão ter um arranque difícil e não os coloco como favoritos no Oeste”, acrescentou.

Mas, se não os Lakers, quem são os candidatos da Conferência Oeste? Para o também fundador do site Borracha Laranja os Phoenix Suns ainda vão à luta, depois de o ano passado terem chegado à final “beneficiando de algumas lesões”, mas ainda mantêm a qualidade necessária para lutar pelos lugares cimeiros. Ricardo diz, contudo, que os “Utah Jazz também estão muito capacitados e mais dentro da corrida” do que, por exemplo, os Los Angeles Clippers de Kawhi Leonard e Paul George, visto que “está previsto que Leonard não jogue na fase regular”.

Sobre os Denver Nuggets do MVP da época passada, Nikola Jokic, diz que acha que vão ser “desilusão”, até porque “não fizeram adições extraordinárias e vão cair um bocadinho”. Por outro lado, acha que os Dallas Mavericks de Luka Doncic podem aparecer muito de surpresa e “eventualmente, se as peças funcionarem”, fazerem uma época muito superior à do ano passado. No entanto, o treinador é agora Jason Kidd, que Ricardo Brito Reis não acha que seja um treinador capaz de gerir bem os egos, como o de Doncic, Porzingis e etc. “Há potencial para correr bem… mas também para correr muito mal”, diz.

Para o final, o maior ponto de interrogação: os Golden State Warriors. Com Klay Thompson a voltar da grave lesão que o tem afastado da quadra apenas em dezembro ou janeiro, “todos temos curiosidade” em relação à equipa. “Como o Klay vai regressar durante a época, o Steph Curry e o Draymond Green vão tentar manter a equipa competitiva para quando o Thompson voltar poderem lugar por algo. Vai ser uma entra de super herói de Curry na época. Se tudo correr bem podem juntar-se ao topo, mas pode correr mal e andarem a lutar pelo play-in, ou o Curry lesionar-se. Eu gostava muito que voltassem a competir e a concorrer por alguma coisa. Temos de apreciar a grandeza de Steph Curry enquanto o temos“, finalizou.