Amy Poehler não tem de pensar muito para apontar alguns nomes quando lhe perguntam quem foram as suas mentoras: Catherine O’hara, Carol Burnett, Lucille Ball. Todas elas mulheres que se destacaram na comédia quando esse terreno era ainda dominado por homens. Poehler acompanhou-as enquanto crescia, nos anos 70 e 80. “Elas faziam o trabalho que eu queria fazer.”

Hoje é a norte-americana que serve de exemplo a outras e outros. Criou o projeto Smart Girls, que se dedica a ajudar jovens a tornarem-se líderes. Foi ele que a trouxe a Portugal pela primeira vez — à Web Summit —, mas a conversa acabou por tocar outros temas: os efeitos das redes sociais que não usa, como a pandemia a pôs a (re)ver o sucesso televisivo “ER” e a “andar às voltas” com Squid Game, e porque recusa dar conselhos. Já sobre Leslie Knope — a aguerrida personagem que encarnou durante seis anos — poucas referências ficaram.

A comediante norte-americana — que integrou durante cerca de sete anos o icónico Saturday Night Live, que encarnou Knope em Parks and Recreation, ou que, mais recente, vestiu a pele de uma mãe feminista no filme Moxy, distribuído pela Netflix — veio à Web Summit para falar sobre o empoderamento da próxima geração de mulheres líderes. Poehler diz que o que as raparigas de hoje precisam é de “espaço para serem livres”, que lhes façam as “perguntas certas”. Só assim, defende, “podem tornar-se a melhor versão delas próprias”.

Poehler lembrou como as mentoras femininas lhe “mudaram a vida” e como as mulheres e as raparigas “estão habituadas a serem vistas e observadas desde uma idade muito jovem”. “No mundo tech, acho que estão muito empenhadas em garantir que a pessoa que está a transmitir a mensagem é autêntica, que não as estão a tentar enganar”, afirmou.

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Confessa cética das redes sociais — um mundo que diz não ser para ela —, Poehler mostra preocupação com o efeito das redes sociais nas raparigas, que procuram uma “validação externa”. “As redes sociais são como abrir uma janela numa rua de Nova Iorque e gritar: ‘Acham que sou bonita?’ para um conjunto de desconhecidos. E vais ter muitas respostas diferentes. Importas-te com o que pensam esses estranhos?”

Quando pensa na próxima geração de líderes, sejam eles homens ou mulheres, elogia a forma de pensar “em coisas que eu nem consigo imaginar”. “Estar aberta e flexível é o meu objetivo para me preparar para essas ideias.”

Questionada sobre que conselhos daria aos mais jovens, Poehler diz que prefere não fazê-lo. “Deixei de dar conselhos, especificamente conselhos não solicitados, que são a maioria dos conselhos”. Lembra que é de uma geração que cresceu “especialmente com muitos conselhos, nós adorávamos recebê-los e éramos viciados neles”. Mas as gerações que vieram a seguir estão “mais confortáveis com o meio termo”. Por isso, o conselho é “tentar dar menos conselhos”.

Leslie, és tu?

Para os fãs de Parks and Recreation, souberam a pouco as referências a Leslie Knope, vice-diretora do departamento de Parques e Natureza da cidade fictícia de Pawnee. Poehler responde rapidamente quando Versha Sharma, jornalista da Teen Vogue, lhe pergunta como é que Leslie teria lidado com a pandemia. “Acho que ela teria distribuído bolos aos vizinhos, quer eles quisessem ou não”. Também fugazmente lembra como ela “iria adorar estar aqui” e, já na reta final, como “adorava waffles” (quando uma fã lhe quer oferecer um).

Durante a pandemia, Poehler conta que revisitou as 13 temporadas de “ER” (Serviço de Urgência), um drama sobre o dia a dia e a vida sentimental de uma equipa de médicos e enfermeiros de um hospital em Chicago (antes de Anatomia de Grey ser o sucesso que é), e que teve George Clooney como protagonista. E também não deixou de falar em Squid Game. “Adorei, não fazia ideia do que vinha a seguir”. É isso, diz, que admira nas séries de hoje, em particular no streaming: não saber qual a que vai ter mais sucesso, agarrá-la a ela e ao mundo. “Acho que é isso que adoro, o facto de não conseguir antecipar o que vai chamar-me à atenção”.

A vinda à Web Summit significou a primeira vez em Portugal. “Estou absolutamente apaixonada por este país”, não hesita, e mais logo vai experimentar “peixe fresco”. Para o futuro, mais para o final do ano, já tem marcada a estreia, na Amazon, de uma série que realizou sobre Lucille Ball e Desi Arnez. Para Poehler, “dois “pioneiros”, “outsiders que conquistaram a indústria”. E dois mentores que o eram sem saberem.