O cruzamento da obra artística de Júlio Pomar com as das pintoras Menez e Sónia Almeida são o mote de uma nova exposição do Atelier-Museu Júlio Pomar, em Lisboa, que vai estar patente a partir de 11 de novembro.
Intitulada “Imagem em Fuga: Júlio Pomar, Menez e Sónia Almeida”, esta mostra artística tem curadoria de Sara Antónia Matos e dá seguimento ao programa de exposições deste museu, que procura “cruzar a obra de Júlio Pomar com a de outros artistas, de modo a estabelecer novas relações entre a obra do pintor e a contemporaneidade”, anunciou esta quinta-feira o atelier.
Trata-se de uma exposição que pretende pensar o modo como o trabalho de Júlio Pomar se cruza com o trabalho de Menez, com quem manteve uma relação artística de cumplicidade e admiração, e de uma pintora de uma geração mais nova, Sónia Almeida, para quem o trabalho de Menez foi referência no tempo de faculdade.
“Em torno da ideia de influência e contaminação em arte (tomando o entendimento desses conceitos como produtivo e não pejorativo), procura explorar-se o modo como as imagens se fixam e simultaneamente nos fogem”, explica o museu, em comunicado.
O título para a exposição nasceu do interesse que Sónia Almeida mostrou pela obra de Júlio Pomar, nomeadamente os painéis do Cinema Batalha, no Porto, frescos pintados sobre a parede, no final da década de 1940, e mandados destruir logo de seguida pela PIDE, fazendo daquelas “imagens desaparecidas, apagadas, inacessíveis desde então”.
“Dessas imagens que nos fogem e das quais hoje resta apenas documentação (fotografias, desenhos, projetos e cartas que testemunham a censura a que a obra foi sujeita) nasceram contágios que remanescem agora no projeto de Sónia Almeida para o Atelier-Museu”, revela o comunicado.
A peça que esta artista desenvolveu integra composições de pintura, realizadas sobre faixas de papel, aplicadas sobre prismas de base triangular, formando “estruturas ou ‘paredes rotativas’, que podem rodar sobre si, pondo a imagem em movimento, em fuga, em transformação”, exigindo do espetador um exercício ativo na observação.
Os painéis do Cinema Batalha de Pomar eram alusivos às festas de S. João do Porto, pelo que Sónia Almeida faz também uma referência a essas festas, ao movimento e à dança a elas inerentes, através de elementos gráficos utilizados pelos coreógrafos na marcação de passos de dança: desenhos de sapatos.
A artista portuguesa apresenta ainda uma obra que releva do seu interesse por frisos e painéis, numa peça que realizou para revestir o friso arquitetónico do mezanino do Atelier-Museu, a partir da imagem/ilustração que Júlio Pomar realizou para a capa do livro “Bichos Bichinhos e Bicharocos”, de Sidónio Muralha, em 1949.
A partir dos frisos e das estruturas rotativas, prismáticas, que Sónia Almeida construiu para esta exposição, o Atelier-Museu estabelece também uma relação com as pinturas sobre paralelepípedos de Menez.
Uma dessas obras de Menez, “Objecto (Paralelepípedo)”, de 1969, plasma uma primeira tentativa de fuga ao plano bidimensional.
Na exposição, esta peça de Menez, proveniente da coleção da Fundação Calouste Gulbenkian, “parece ser a chave para estabelecer a ‘ponte’ entre os dispositivos criados por Sónia Almeida e os painéis do Cinema Batalha de Júlio Pomar, reforçando a sensação de que a imagem, sempre em fuga, não se deixa fixar”.
Nos três artistas encontra-se a natureza abstrata da imagem, no caso de Sónia Almeida, as “formas diluídas”, no caso de Menez, e a fusão entre camadas e cores no caso de Pomar.
A cor foi, de resto, o que motivou a escolha de obras de Júlio Pomar — entre a figura e o abstrato – que integram a exposição: “Belle Isle en Mer”, de 1976, “Fruit, Barque II”, de 1977, “La Nef”, de 1977, e “Le plomb et la Pierre”, de 1977.
No decurso da exposição, que vai estar patente ao público até ao dia 10 de abril de 2022, será publicado um catálogo com textos de Ricardo Nicolau e Maria Quintãs (edição do Atelier-Museu Júlio Pomar/Documenta) e imagens das obras instaladas no espaço, e um livro com a relação epistolar de Júlio Pomar e Menez.