Milhões, objetivos e continuidade. Esta terça-feira, no Dragão, o FC Porto jogava muito mais do que um simples jogo de futebol. Contra o Atl. Madrid, na última jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões, os dragões disputavam o apuramento para os oitavos de final, os milhões inerentes a essa qualificação, o objetivo de permanecer nas competições europeias e a continuidade garantida por uma eventual quarta passagem em cinco anos de Sérgio Conceição.

As contas, apesar de tudo, eram bastante simples: com uma vitória, o FC Porto ficava automaticamente apurado para os oitavos; com um empate, o FC Porto precisava de esperar que o AC Milan não ganhasse em Liverpool em San Siro para ficar apurado para os oitavos; e com uma derrota, o FC Porto ficava eliminado da Liga dos Campeões. Pelo plantel, pelo estatuto e pelo orçamento, Sérgio Conceição atribuiu todo o favoritismo ao Atl. Madrid — mas Diego Simeone não tinha a mesma opinião e colocou toda a pressão do lado dos dragões.

Ficha de jogo

Mostrar Esconder

FC Porto-Atl. Madrid, 1-3

Fase de grupos da Liga dos Campeões

Estádio do Dragão, no Porto

Árbitro: Clément Turpin

FC Porto: Diogo Costa, João Mário (Corona, 81′), Pepe, Mbemba, Zaidu (Wendell, 63′), Grujic (Sérgio Oliveira, 81′), Vitinha, Otávio (Fábio Vieira, 81′), Luis Díaz, Taremi (Toni Martínez, 81′), Evanilson

Suplentes não utilizados: Marchesín, Francisco Meixedo, Fábio Cardoso, Manafá, Nanu, Bruno Costa, Gonçalo Borges

Treinador: Sérgio Conceição

Atl. Madrid: Oblak, Vrsaljko, Kondogbia, Mario Hermoso, Yannick Carrasco, Koke, Rodrigo de Paul, Marcos Llorente, Lemar (Correa, 65′), Griezmann, Suárez (Matheus Cunha, 13′, Renan Lodi, 83′))

Suplentes não utilizados: Lecomte, Christian, Fran González, Ibra, Herrera, João Félix

Treinador: Diego Simeone

Golos: Griezmann (56′), Correa (90′), Rodrigo de Paul (90+2′), Sérgio Oliveira (gp, 90+6′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Taremi (32′), a Correa (67′), a Otávio (69′), a Pepe (69′); cartão vermelho direto a Carrasco (67′), a Wendell (72′), a Marchesín (75′)

“Não sei a razão de ele ter dito isso. Talvez por simpatia, por termos sido colegas de equipa na Lazio… Pode ser estratégia, também. O que sei é que vamos defrontar o campeão espanhol e, se olharmos para os nomes do plantel, nem há dúvidas sobre quem é o favorito. Depois, quando o árbitro apitar e a bola começar a rolar, o favoritismo não importa. Penso que merecíamos o apuramento. Mas, mesmo assim, estar a disputá-lo na última jornada, dependendo só de nós, já é merecedor de elogios. Vai ser um jogo muito importante para as duas equipas”, disse o treinador português, que podia chegar à 17.ª vitória com o FC Porto na Liga dos Campeões e ultrapassar assim Jesualdo Ferreira para se tornar o técnico do clube com mais triunfos na principal competição europeia de clubes.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Sem Uribe, que estava castigado, e também Marcano e Pepê, um por estar lesionado e outro por ter testado positivo à Covid-19, Sérgio Conceição tinha a boa notícia dos regressos de Pepe, João Mário e Grujic, que estiveram em dúvida até à última hora mas acabaram por ser titulares. Vitinha continuava a ser aposta no meio-campo, Evanilson e Taremi tinham o apoio de Luis Díaz e Otávio e Zaidu era o dono da esquerda da defesa. Do outro lado, num Atl. Madrid em crise de resultados e vindo de uma derrota com o Maiorca, Diego Simeone deixava João Félix no banco e lançava Lemar, Griezmann e Suárez no ataque. Savic e Giménez estão lesionados e Felipe estava castigado e, assim, o treinador argentino era obrigado a adaptar Kondogbia e Vrsaljko para formar o inovador trio defensivo com Mario Hermoso, o único central de raiz disponível no plantel.

De forma expectável, a primeira parte foi quase integralmente equilibrada. O FC Porto teve sempre mais bola e maior presença no meio-campo adversário, rendilhando o jogo para conseguir avançar e criar ligações, mas o Atl. Madrid defendia bem e o sistema de três centrais com os dois alas nos corredores permitia obter uma largura que causava obstáculos à mobilidade de Luis Díaz ou Otávio. Os espanhóis atuavam essencialmente em contra-ataque e transição rápida, com poucos passes e um futebol muito direto, e procuravam sempre as costas da defesa dos dragões.

Ainda antes de estar cumprido um quarto de hora e ainda antes de aparecer qualquer oportunidade de golo, o Atl. Madrid sofreu uma contrariedade considerável. Suárez, a referência ofensiva da equipa, saiu lesionado e em lágrimas e teve de ser substituído por Matheus Cunha. Contudo, e mesmo com menos bola  — ou praticamente sem ela –, os espanhóis acabaram por conseguir desenhar a primeira verdadeira ocasião de perigo da partida: Yannick Carrasco fez o que quis de João Mário na esquerda e cruzou rasteiro para a grande área, onde Matheus Cunha e Griezmann falharam o desvio e Llorente apareceu a rematar para uma defesa atenta de Diogo Costa (22′).

O lance acordou o FC Porto e o Dragão e, a partir daí, a equipa de Sérgio Conceição não só cerrou fileiras e deixou de permitir transições adversárias como passou a chegar com mais frequência a zonas de finalização. Luis Díaz foi o primeiro a ficar perto do golo, com um remate rasteiro na grande área que Oblak defendeu (31′), e atirou por cima pouco depois na sequência de um livre (38′). Lemar esteve quase a assinar um autogolo, ao desviar um pontapé de canto para perto da própria baliza (40′), e Grujic teve a última ocasião da primeira parte ao surgir na cara do guarda-redes depois de uma combinação com Otávio, com Oblak a levar novamente a melhor (43′).

Ao intervalo, os dragões estavam virtualmente apurados para os oitavos de final da Liga dos Campeões graças ao empate entre AC Milan e Liverpool em San Siro mas a verdade é que transparecia a ideia de que nada estava garantido: porque o FC Porto ainda não tinha conseguido marcar, porque o Atl. Madrid podia fazer um golo a qualquer momento e porque o AC Milan ia mostrando que também estava dentro da luta. Ainda, a equipa de Sérgio Conceição ia realizando uma exibição positiva, tombada essencialmente para o corredor esquerdo e para os desequilíbrios de Luis Díaz, e assumia um claro ascendente na partida.

Na segunda parte, sem que nenhum dos treinadores fizesse qualquer alteração, o FC Porto entrou melhor e recuperou por completo o ritmo com que tinha saído para o intervalo, conquistando o meio-campo adversário e encostando o Atl. Madrid ao último terço. Taremi teve duas oportunidades praticamente consecutivas, atirando por cima numa primeira ocasião (47′) e forçando Oblak a uma enorme defesa logo a seguir (52′), mas o desperdício dos dragões foi derrotado pela crueldade do pragmatismo dos espanhóis.

Ainda antes de estar cumprida uma hora de jogo, na sequência de um canto batido na direita, Taremi desviou de cabeça ao primeiro poste, Otávio não percebeu que tinha Griezmann nas costas e o francês teve todo o tempo do mundo para encostar para a baliza deserta (56′). O FC Porto ficava a perder num lance em que ninguém ficou bem na fotografia, desde a abordagem de Diogo Costa à passividade defensiva nas marcações, e era obrigado a correr atrás do prejuízo para continuar na Liga dos Campeões. Já depois de Pepe evitar o segundo golo dos colchoneros, com um corte capital em cima da linha depois de um remate de Matheus Cunha (60′), Sérgio Conceição tirou Zaidu para lançar Wendell e tentar obter superioridade no corredor esquerdo e soltar Luis Díaz, que ia tendo menos espaço do que havia tido na primeira parte.

Simeone respondeu a Conceição com a entrada de Correa para o lugar de Lemar e o momento coincidiu com a fase mais caótica da partida: Carrasco foi expulso depois de agredir Otávio e Wendell foi expulso depois de fazer o mesmo a Matheus Cunha, com o FC Porto a não ter sequer tempo para aproveitar a superioridade numérica que teve durante breves instantes. Sem que existisse jogo propriamente dito durante cerca de 10 minutos, os dragões perderam-se por completo e iam deixando o relógio avançar — Sérgio Conceição agarrou no leme nos últimos instantes e fez quatro substituições de uma vez, lançando Corona, Fábio Vieira, Sérgio Oliveira e Toni Martínez para ir à procura do golo que podia garantir o apuramento.

O discernimento, porém, não regressou. O FC Porto expôs-se por completo e abriu a porta ao segundo golo do Atl. Madrid, com Correa a ficar isolado depois de um passe de Griezmann (90′), e ainda sofreu o terceiro por intermédio de Rodrigo de Paul depois de uma perda de bola de Mbemba (90+2′). No último lance do jogo, Sérgio Oliveira reduziu as contas de grande penalidade (90+6′), depois de uma falta de Mario Hermoso sobre Evanilson no interior da área espanhola, mas de nada valeu — o FC Porto perdeu com o Atl. Madrid no Dragão, está fora dos oitavos de final da Liga dos Campeões e caiu para a Liga Europa, falhando os milhões, os objetivos e a continuidade.

Num jogo em que teve sempre mais bola, em que podia ter marcado tanto na primeira como na segunda parte enquanto o marcador ainda estava a zeros e em que cometeu erros defensivos a que normalmente é imune, o FC Porto caiu. E caiu, principalmente, por falta de juízo: falta de juízo na hora de finalizar oportunidades, falta de juízo na hora de atacar com tudo mas não destapar a manta atrás e falta de juízo de Wendell, que até pode não ter merecido o cartão vermelho mas colocou-se a jeito. E quando a cabeça não tem juízo, é Pepe — que defendeu, atacou, evitou golos e acalmou ânimos — que paga.