Num país como Portugal, sem uma indústria cinematográfica devidamente estruturada e a funcionar com regularidade e variedade em termos de produção, é natural que seja para a televisão, que fornece trabalho regularmente — em especial nas telenovelas –, paga bem e dá exposição pública e popularidade, que se virem muitos dos mais destacados atores e atrizes, e a marca que deixam no cinema seja escassa, pouco relevante ou muito espaçada. Rogério Samora foi daqueles que, fazendo sempre muita televisão, ainda apareceu em bastantes filmes, mesmo que em vários deles apenas em papéis secundários ou intervenções pontuais. Eis seis das suas participações mais importantes e expressivas no cinema do ator que faleceu esta quarta-feira aos 63 anos. 

“Matar Saudades”

De Fernando Lopes (1988)

O primeiro papel mais significativo no cinema de Rogério Samora foi-lhe dado por Fernando Lopes neste filme e o ator viria a trabalhar por várias vezes com o autor de “Belarmino” nas décadas seguintes. Samora interpreta, com segurança e autoridade, um homem endurecido pela vida, que combateu em África e esteve emigrado em França, e regressa à aldeia natal para reencontrar a família, matar os pretendentes à mão da mulher que sempre amou e também esta.

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“O Delfim”

De Fernando Lopes (2002)

Este é talvez o melhor papel de Rogério Samora no cinema, nesta adaptação por Fernando Lopes do romance alegórico de José Cardoso Pires sobre a decadência do regime derrubado pelo 25 de Abril. Samora personifica intensamente, numa mistura de arrogância, raiva, insegurança e desespero, a personagem do engenheiro Tomás Palma Bravo, um rico e poderoso senhor rural, casado com uma mulher belíssima mas estéril, que vê o mundo onde sempre viveu e que sempre dominou e lhe obedeceu, começar a desabar em seu redor.

“Os Imortais”

De António-Pedro Vasconcelos (2003)

Os “Imortais” do título deste filme de António-Pedro Vasconcelos são um punhado de amigos, veteranos da guerra do Ultramar, que se juntam todos os anos para recordar os velhos tempos, até que decidem roubar um banco. Rogério Samora é um deles, Horácio Lobo, e o facto de “Os Imortais” assentar muito no trabalho coletivo e de interação dos seus vários intérpretes, nem por isso o impede de deixar a sua personagem bem caracterizada e definida no conjunto, ao lado de nomes como Joaquim de Almeida ou Nicolau Breyner.

“Lá Fora”

De Fernando Lopes (2004)

Mais um filme realizado por Fernando Lopes, mais um papel exigente e complexo para Rogério Samora, do qual se sai mais do que convincentemente. Ele é José Maria, um corretor da Bolsa, homem solitário e em surda convulsão interior, que vive num luxuoso condomínio fechado e está fascinado por uma vizinha, Laura (Alexandra Lencastre), jornalista na televisão, que vigia sem ela saber. Até que um dia, observador e observada encontram-se, devido a um programa de televisão.

“O Fatalista”

De João Botelho (2005)

Esta adaptação livre e modernizada do livro Jacques, o Fatalista, de Diderot, por João Botelho, tem Rogério Samora na figura de Tiago, um desembaraçado e loquaz motorista que conduz o seu abastado e enigmático patrão (André Gomes) pelas estradas de Portugal, e que vão protagonizando uma série de situações entre o banal e o estranho, ao mesmo tempo que têm conversas que abrangem dos temas mais corriqueiros aos mais filosófico. É um dos papéis mais bem conseguidos do ator.

“98 Octanas”

De Fernando Lopes (2006)

Tal como “O Fatalista”, “98 Octanas” é também um filme on the road, mas sem as aspirações intelectuais e filosofantes daquele. A história centra-se em duas personagens, Diniz (Rogério Samora) e Maria (Carla Chambel). Não se conhecem, ele dá-lhe boleia numa estação de serviço da auto-estrada onde se encontraram, ela pede-lhe que a conduza a casa da avó, algures na província. Um filme de tantas palavras como de silêncios e subentendidos, que Samora e Chambel, levam, sozinhos e sobriamente, a bom destino.