Dez dias, três vitórias com Grémio Novorizontino, Ponte Preta e Água Santa, um empate pelo meio frente ao São Bernardo, “prego a fundo do Palmeiras”. “Não posso mentir, logicamente pensei nisso no risco de haver lesões para o Mundial de Clubes mas não vejo outra forma de nos prepararmos a não ser com o pé no fundo. Os pilotos da Fórmula 1 nas provas de sexta, sábado e domingo pregam a fundo. Isto para estarmos mais próximos de ganhar porque nunca prometi a nenhum adepto que vamos ganhar tudo. Vamos, isso sim, fazer tudo e prepararmo-nos para ganhar. É o nosso propósito. Tenham a certeza que vamos dar o melhor de nós de forma coletiva”, comentara Abel Ferreira antes da partida dos campeões sul-americanos para Abu Dhabi.

Entre tantos nomes, podem chamar-lhe mais um: bicampeão continental. Abel faz história e ganha segunda Libertadores seguida com Palmeiras

“Podia dizer que gostava de ter três ou quatro jogos a mais, de ter tempo para descansar mas isto só serve de desculpa e não gosto de trabalhar assim. O calendário é este, estamos no Mundial de Clubes por ‘culpa’ própria. Quem mandou estes jogadores ganharem? Chegamos mais bem preparados do que no ano passado, mais experientes, mas vamos enfrentar os melhores do mundo”, acrescentou o português, descartando a possibilidade de arriscar já a utilização de Endrick, a nova coqueluche do futebol brasileiro que começa a ser disputado por Real Madrid e Barcelona. “É um menino com 15 anos. Vamos para o Mundial e se o clube achar por bem comprar uma passagem para a Disney, para ele e para a família, é o que ele precisa. É um miúdo gosto de olhar para estes jogadores a dar tempo ao tempo. Não tenham pressa”, explicou.

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As pressões de fora sempre tiveram pouco eco dentro do Palmeiras desde que Abel Ferreira assumiu o cargo e conquistou duas Taças dos Libertadores em dez meses. No entanto, há pressões e pressões, sobretudo após o último Mundial de Clubes onde a equipa perdeu nas meias com o Tigres e na luta pelo bronze com o Al Ahly. E eram os egípcios que apareciam agora de novo como adversários no acesso ao encontro decisivo, num contexto diferente marcado pelos vários jogadores que se encontraram ao serviço da seleção do Egito até este domingo, onde perderam a final com o Senegal. O técnico português analisava a questão ao contrário até pelo triunfo nos quartos com os mexicanos do Monterrey, recusando qualquer tipo de facilidades.

“Na minha terra há uma coisa que se diz: humildade e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Se com os desfalques venceram o Monterrey quando todos diziam que o Monterrey ia passar, é um sinal de alerta para nós. Ganharam por um mas poderia ser mais. Isso mostra a qualidade do Al Ahly. Por isso, e de novo, humildade e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Dentro das coisas que dão intensidade e velocidade ao jogo, uma é o relvado e este é fantástico. Vai ser um jogo complicado, contra uma equipa que tem intenções muito claras e que joga bem com as características dos seus jogadores. O futebol é mágico, não é uma ciência exata em que dois mais dois são quatro. Não ganha quem investe mais nem quem tem mais dinheiro. Futebol é vontade, é organização”, comentara o português na antevisão da partida.

Ainda assim, e por mais que tentasse fugir a esse “rótulo”, o Palmeiras partia como favorito numa preparação que incluiu até uma sessão de treino em pleno avião na viagem para Abu Dhabi. Porque chegava num outro contexto a Abu Dhabi em comparação com o ano passado, com uma equipa melhor trabalhada, com melhores jogadores, com outra experiência. E esse estatuto acabou por confirmar-se de forma natural, com o conjunto brasileiro a vencer por 2-0 e Abel Ferreira a tornar-se o segundo técnico português a marcar presença na decisão da prova no atual formato contra o Chelsea ou o Al Hilal… de Leonardo Jardim.

Se antes da partida Abel Ferreira tinha pedido humildade, no arranque foi recomendando outra coisa: muita paciência. E paciência porque, de forma mais acentuada em relação ao que tinha feito com o Monterrey, o Al Ahly (reforçado com os vários elementos que estiveram na CAN, sendo que quatro entraram logo para o onze inicial) baixou muito as linhas e tentou sem sucesso explorar transições que, pelos terrenos que ocupava, não tinham capacidade para chegar ao último terço do brasileiro. O Palmeiras pressionava alto, rodava a bola com critério e, perante a falta de espaços, tentava arriscar na meia distância de Zé Rafael e Raphael Veiga. Ficava a ideia de que estava à espera do primeiro erro dos egípcios e, assim que o mesmo apareceu, fez o 1-0: grande passe de trivela de Dudu nas costas da defesa contrária, Raphael Veiga a aparecer em jogo perante o adormecimento de El Hanafi à direita e a rematar cruzado sem hipóteses para Lofti (39′).

O máximo que o Al Ahly conseguiu foi fazer uma tentativa enquadrada à baliza que saiu sem perigo para as mãos de Wéverton (45+2′). Em tudo o resto, o Palmeiras dominava por completo a meia-final. Mas os egípcios queriam mais e, logo no minuto inicial do segundo tempo, Magdy atirou para defesa de Wéverton.

O golo 12.100 na história do Palmeiras fazia a diferença mas a história estava longe de ficar por aí, com um lance que mostrou várias faces de um jogo: 1) bastou o Al Ahly abrir um pouco para os brasileiros fazerem o 2-0 numa transição concluída com um remate cruzado de Dudu (49′); 2) Raphael Veiga voltou a ser muito importante em toda a jogada, pelo toque que deixou a bola em Dudu após o início da jogada por Rony; 3) a maneira como Veiga foi ainda a correr para a área deslizando na zona do segundo poste caso a bola caísse por ali como se fosse um jogo de futsal mostrava bem a vontade que o conjunto paulista tinha de chegar à vitória, numa festa rija feita no Al-Nahyan Stadium que mais parecia o Allianz Parque em São Paulo.

Só mesmo com dois golos de desvantagem o Al Ahly tentou discutir a partida, subindo as linhas e colocando mais unidades na frente diante de um Palmeiras a sentir também o desgaste físico dos dois grandes motores do corredor central, Zé Rafael na organização e Raphael Veiga na definição. E chegou mesmo a marcar, num lance em que Wéverton facilitou num remate que podia ter encaixado, que soltou para a frente e que Sherif aproveitou para encostar mas em fora de jogo (72′). Esse poderia ser o momento de viragem na meia-final mas acabou por redobrar a concentração dos brasileiros, com Wesley e Jailson a entrarem para as posições de Dudu e Raphael Veiga pouco antes do vermelho direto a Ashraf a nove minutos do final que quase decidiu de vez o encontro, apesar de uma bola na trave dos egípcios no quinto minuto de descontos.