Depois de Nova Iorque e Londres, o testemunho passou como habitual para as mãos de Milão, com os motores a aquecerem na quarta-feira passada com o luxo da Fendi. Numa edição da Semana da Moda que contou maioritariamente com desfiles presenciais, incluindo dos pesos pesados Prada, Versace, e Dolce & Gabbana (e com a escala da portuguesa Alexandra Moura), menos esperada no calendário foi a guerra que assombra a Europa, e que logo ao segundo dia deixava uma sombra a pairar. Entre a passerelle e a dança das cadeiras na primeira fila o espectáculo tem de continuar? Pois sim, houve até tempo para ver Kim a despedir-se da Balenciaga, saudar mais uma aparição de Rihanna e planear um retumbante baile de máscaras com curadoria de Jeremy Scott. A tesourada na indiferença chegou quase ao cair do pano, este domingo, pelo mão de um dos decanos. Armani baixou o volume até ao nível do zero e, pelo menos por momentos, o protesto calou o  barulho das armas. Ficam os destaques das coleções para o próximo outono-inverno.

Armani

“Não estou interessado na preguiça. Podemos sempre vestir-nos um pouco melhor, sem grande esforço, como sempre apreciei”, descrevia na passada semana o criador, citado pela Vogue. O conteúdo desse email foi conhecido antes do eclodir da guerra mas continuaria a fazer sentido depois do estalar das notícias mais negras — em Milão, qual lobo solitário, coube ao criador 87 anos levantar os braços contra o torpor generalizado. Giorgio Armani manteve a apresentação da coleção outono-inverno, mas ceifou a música do programa, com as manequins a desfilarem sob um simbólico silêncio, em homenagem às vítimas. Elegantes e graciosas como sempre, as propostas no feminino e masculino tornaram-se ainda mais eloquentes. “O melhor a fazer é transmitir uma mensagem de que não queremos celebrar porque há algo muito perturbador a acontecer à nossa volta”, leu-se no Twitter do criador.

Gucci X Adidas

Um emblema cruza-se com um monograma e o resultado é uma aguardada coleção Exquisite com o selo de Alessandro Michele. O encontro da Gucci com a Adidas aconteceu na passada sexta-feira ao som de ritmos ora melancólicos ora a chamar com urgência para uma pista de dança dos anos 80. O figurino estaria mais que composto para esse exercício nostálgico sintonizado com o presente — e o cenário espelhado não lhe ficaria atrás. Apareceria Tyler? Minaj? Zendaya? Os palpites multiplicavam-se na caixa de comentários — tudo errado, amigos, afinal quem apareceu para ocupar a fila da frente foi Rihanna. Para esta parceria entre os cortes luxuosos da casa italiana e a descontração urbana do gigante alemão do desporto, os protagonistas foram as boinas, bonés e balaclavas; gravatas, luvas e cinturões; jumpsuits metalizados e acessórios maxi. Ah, e xadrez e coleiras com picos, claro, para rematar este registo cyber preppy/punk.

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Fendi

“O melhor sítio para explorar os arquivos da Fendi é através do guarda-roupa Fendi. Algumas coleções apesar de virem do passo parecem muito de agora”, escreveu nas notas do seu desfile o diretor criativo Kim Jones, que recuou especificamente até duas coleções desenhadas pelo seu antecessor Karl Lagerfeld, a de primavera-verão de 1986 e a de outono-inverno do ano 2000. A viagem nostálgica, situa a Reuters, patente num desfile aberto por Bella Hadid, começou quando Jones viu a designer de joias Delfina Dekettrez a vestir uma antiga blusa Memphis materna. Slip dresses em chiffon, casacos cropped e longas luvas de caxemira verde água deram o mote, encontrando-se pelo caminho com calças de xadrez, saias de cintura subida, camisas-corpete, e bolsos preparados para transportar telemóveis. Nos acessórios, não faltaram edições especiais da icónica Baguette, lançada há 25 anos por Silvia Venturini Fendi, que desenhou a coleção de carteiras.

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Prada

Tudo leva a crer que o momento é de viragem, depois de muitas opções coleantes — e acima de tudo depois do agudizar da relação com o ex-marido Kanye West. Pronta para abraçar o super, mega, oversized (e para cair nos braços de Miuccia e Raf Simons, despedindo-se assim de Demna Gvasalia, diretor criativo da Balenciaga e parceiro do rapper), Kim Kardashian assistiu ao desfile da Prada em Milão. Enquanto a irmã Kendall desfilava, Kim manteve as lentes escuras e antecipou o fato de pele verde lima e o longo casaco cinzento da próxima coleção masculina outono-inverno da casa italiana. Indiferente a litígios, a passerelle reclamou espaçou para ombros desmesurados e para a elegância enquanto atitude.

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Del Core

Corte moderno e impecável, porque se é para festejar a vida que o façamos de forma graciosa, qual bater das asas da borboleta. O lema de Daniel Del Core envolve mangas ultra avantajadas, transparências e mais ombros XXl tailor made, numa gentil metamorfose inspirada numa viagem recente do criador à Tailândia. Del Core (o homem de quem se falou quando a pandemia atirou para o meio digital as apresentações dos designers e mostrou ao que vinha ao vivo e a cores) arrancou com uma tela negra que se deixou aquecer pelo cor de rosa e fantasia seguiu o seu caminho entre plataformas, botas/ligas, combinações cromáticas improváveis.

Moschino

Gigi Hadid vestiu-se de noiva e as comparações nostálgicas não tardaram. Será que Jeremy Scott também era fã de Gossip Girl? Há uma década os fãs da série viam  Serena Van der Woodsen, aka Blake Lively, a casar com Dan Humphrey e entre o Upper East Side e Milão as semelhanças não são descabidas. O resto da parada aplica-se como luva a uns loucos anos 20 e apesar de não ser o mais vestível para uma reunião zoom, ou regresso em pessoa ao escritório, não faltam soluções um pouco mais convencionais na lista do designer — ainda que um clássico tailleur consiga incorporar duas aldrabas como ninguém.

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Gabriele Colangelo

Sensibilidade, bom senso e uma fornada de looks intemporais. Num movimento orgânico sob o balanço da seda, da caxemira e da organza, a coleção Giada deixa, mais uma vez, a certeza de ser absolutamente vestível. Elegância e alta qualidade dos materiais definem o trajeto de Gabriele Colangelo, cuja carreira no design começou em marcas como Versace e Cavalli, deixando para trás o estudo do grego e do latim. Familiarizado com o negócio paterno do curtume, cedo se aventurou no trabalho dos têxteis. Acabaria por lançar a sua marca em nome próprio em 2008, em Milão, depois de vencer o prémio da Vogue Itália ‘Who’s on next’.

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Bottega Veneta

Depois da Balenciaga, de Raf Simons, Maison Margiela, Celine, Calvin Klein, o dia D para Matthieu Blazy haveria de chegar — e se a guerra, sempre a guerra, não tivesse entrado em cena, depois de sábado à noite só se falaria deste debute. Com a partida abrupta em novembro de Daniel Lee, o belga de 35 anos saltou da direção do design de pronto a vestir da Bottega Veneta para o cargo de diretor criativo e a viragem revelou-se nesta edição. Por definição uma marca de luxuosas carteiras, a Bottega, afirma Blazy, é feita para circular, mesmo com a simplicidade desarmante de uma combinação tank top + jeans. Para um pouco mais de sofisticação intemporal, conte com várias notas de artesania, uma passagem tão fresca quanto segura pelo alfaiate e, claro, os acessórios certos para triunfar, como a novíssima Kalimero.

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