A CGD disse esta segunda-feira que a Autoridade da Concorrência não conseguiu provar em Tribunal uma prática lesiva da concorrência, na alegada troca de informação sensível entre bancos que levou a condenações de 225 milhões de euros, pedindo a absolvição.

Nas alegações finais, no julgamento dos recursos interpostos por 11 bancos às coimas de cerca de 225 milhões de euros aplicadas pela Autoridade da Concorrência (AdC) por partilha de informação sensível durante mais de 10 anos, que decorre desde outubro de 2021 no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, os mandatários da Caixa Geral de Depósitos, a instituição que sofreu a multa mais grave (82 milhões de euros), pediram a absolvição do banco público, ou, caso a juíza assim não entenda, uma “redução em montante expressivo”, nomeadamente tendo em conta que o resultado agregado positivo entre 2017 e 2021 ainda não compensou o resultado negativo registado entre 2011 e 2016.

Nas suas alegações, o Ministério Público pediu a manutenção da coima aplicada pela AdC à CGD, tendo o procurador Paulo Vieira afirmado que só não pedia o agravamento da coima por esta já ser elevada, depois de lamentar a “forma ligeira” como o banco público tratou a questão em causa, ao não “ter atacado o problema quando ele surgiu de forma vertical”.

Os advogados da Caixa procuraram esta segunda-feira contrariar esta ideia, apontando a adoção de um novo código de conduta com um novo artigo que especifica uma proibição da troca de informação sensível por parte dos funcionários, entrado em vigor em 2020, uma prática que, disseram, foi seguida desde as buscas da AdC em 2013, “em estrito cumprimento da última palavra do regulador até à última palavra do sistema judicial”.

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Os mandatários apontaram outras medidas, como a abordagem da matéria alvo do processo contraordenacional no relatório de governo de 2015 e a realização de ações de formação internas sobre ética, conduta e direito da concorrência, confessando “perplexidade” com a “insinuação” da AdC de que a prática se iniciou por orientações superiores e cessou por iniciativa dos funcionários, após terem conhecimento do processo, sem nunca ter analisado os processos decisórios do banco.

Nas suas alegações, as críticas da Caixa à AdC estenderam-se ao não acompanhamento pelo regulador nacional da jurisprudência europeia em relação à qualificação jurídica em causa, de objeto restritivo da concorrência, nem das novas orientações da Comissão, apontando casos de autoridades de outros países europeus que anularam as notas de ilicitude dos instrutores em processos similares.

Em particular, referiram o facto de ser “ambivalente” a apreciação quanto à troca de informação entre concorrentes, salientando que ela pode ser favorável à concorrência e que cabia à AdC provar que as práticas imputadas aos bancos neste processo foram lesivas dos clientes.

Tal como a generalidade dos outros bancos visados no processo, também a CGD insistiu na nulidade da prova apreendida pela AdC, remetendo para a decisão do Tribunal Constitucional que declarou ilegal a apreensão de correio eletrónico, bem como no facto de, na fase administrativa, terem sido inquiridas testemunhas sem a presença de advogado, “prática que a Autoridade alterou”.

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Os mandatários da CGD secundaram ainda as críticas à medida das coimas aplicadas pela AdC, insistindo que não foi fundamentada a metodologia seguida para chegar ao valor de cada coima, o que, consideraram, impede que o banco “exerça plenamente os seus direitos de defesa”.

Para a CGD, a decisão da AdC, apesar de longa e complexa, carece de uma contextualização jurídica e económica, ignorando as “vicissitudes” que marcaram o setor, nomeadamente a crise financeira iniciada em 2008.

Por outro lado, os advogados do banco público criticaram o “ruído público que tem rodeado o caso” e que “tende a distorcer a sua perceção”, insistindo que não está em causa um cartel, “particularmente lesivo da concorrência”, mas sim troca de informação comercial sem a imputação de concertação de preços nem comprovados efeitos lesivos para os consumidores.

Lembraram ainda que o pedido de clemência do Barclays, que esteve na origem do processo, aconteceu num contexto de “escândalos económicos e financeiros” envolvendo este banco, “numa amplitude que surpreendeu os reguladores nos vários países” em que opera.

O processo, em que está em causa a prática concertada de troca de informação comercial sensível, entre 2002 e 2013, nomeadamente com partilha de tabelas de ‘spreads’ a aplicar aos créditos a clientes (habitação, consumo e a empresas) e de volumes de produção, teve origem num pedido de clemência apresentado em 2013 pelo Barclays.

A AdC condenou a CGD ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI em 30 milhões, a CEMG em 13 milhões (coima reduzida em metade por ter aderido ao pedido de clemência), o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria em 2,5 milhões, o BES em 700.000 euros, o Banco BIC em 500.000 euros, o Deutsche Bank (cuja infração prescreveu em outubro de 2020) e a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo em 350.000 euros cada um, a Union de Créditos Inmobiliarios em 150.000 e o Banif (que não recorreu) em mil euros.

O Abanca, também visado no processo, viu a infração prescrever ainda na fase administrativa e o Barclays, que apresentou o pedido de clemência viu suspensa a coima de oito milhões de euros que lhe foi aplicada.

As alegações prosseguem à tarde com o Santander, seguindo-se o BPI, o BES, a UCI e a CEMG na quarta-feira.