Demorou, foi até ao limite, a própria Juventus já considerava uma não questão mas a chegada do empresário Jorge Mendes a Turim mudou todo o cenário: apesar de ter mais um ano de contrato, Ronaldo queria sair. E começava aí uma autêntica corrida contra o tempo, com os transalpinos em busca de um sucessor (que na verdade só chegou agora em janeiro com Vlahovic) e o agente do capitão da Seleção a tentar colocar o jogador em Espanha ou Inglaterra. Dois dias depois, Inglaterra. Estava a começar mais um duelo entre os rivais de Manchester por alguém que se pensava ser apenas património do United. Talvez não, pensou o City.

Numa altura em que o conjunto de Pep Guardiola já tinha desistido pela quarta vez da contratação de Harry Kane ao Tottenham, a oportunidade de contratar Cristiano Ronaldo para dar o último passo depois da final perdida da Liga dos Campeões colocou-se e esteve muito próxima de se concretizar, com uma chamada de Alex Ferguson para o português a mudar por completo o cenário e a promover um regresso a Old Trafford. Para uns, o técnico escocês alterou a história; para outros, tudo não passou de um movimento quase que a pedir uma segunda vida nos red devils. Uma coisa é certa: Ronaldo voltou à casa de partida em Inglaterra, sendo que o tempo acabou por desenhar uma linha contrária à primeira passagem. Descendente, com mais críticas do que elogios, sem a exuberância que se esperava mesmo não mudando a opinião daquele que foi muitas vezes o seu treinador adversário em Espanha – e que podia ser agora mesmo o seu treinador.

“Tem sido um dos melhores jogadores dos últimos 15 anos a par de Lionel Messi. O que eles têm feito, não vamos voltar a ver algo assim. Quando fazes o que eles têm feito, estás sob um escrutínio constante. Tem sido muito bom o que ele tem feito. É um finalizador excecional, tem sido espetacular vê-lo jogar todos estes anos. Temos que controlar o jogo e evitar que ele se aproxime da bola. Em Old Trafford controlámos o jogo mas, na primeira oportunidade que teve, Ronaldo criou perigo. Tem muita qualidade, temos de tentar controlá-lo. É um dos melhores, uma máquina de fazer golos e tem uma mentalidade muito forte. Lida com a pressão da melhor maneira”, comentara Guardiola sobre um problema que acabou por não ter no jogo.

Na habitual concentração no Lowry Hotel, onde a equipa estagia antes dos jogos, Ronaldo foi um dos quatro ausentes entre as opções mais frequentes a par de Luke Shaw, Varane e Cavani. Mais: não existia qualquer notícia de problemas físicos e até o uruguaio já estava recuperado depois de uma lesão recente. Antes, nas conferências de antevisão, o técnico alemão Ralf Rangnick não tinha feito referência a nenhuma ausência em particular. “Vamos jogar contra uma das melhores equipas do mundo e tudo gira à volta da capacidade de controlar o jogo, não deixar jogar e ter posse sem pressão. É sempre o que eles querem e sabemos bem o que pretendem para jogar. Temos de colocá-los sobre pressão e ficar com a bola, algumas equipas fizeram isso nas últimas semanas”, comentou, recordando o triunfo do Tottenham no Etihad por 3-2.

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Não havia Ronaldo, que ficou mesmo de fora novamente por um problema na anca que já o tinha deixado de fora outros jogos, não havia Rúben Dias. Era quase ela por ela a nível de importância para cada uma das equipas. No entanto, Pep Guardiola teria de encontrar um antídoto para aquela que tem sido a sua “besta negra” desde que chegou a Inglaterra, conseguindo apenas uma vitória em seis jogos no Etihad Stadium, levando nesta fase três derrotas seguidas e não tendo marcado nos dois últimos encontros. Tudo números, tudo estatística. E para a história ficou o dia em que o Manchester United cometeu um erro crasso ao deixar o menino com mais talento entre todos os talentosos, Kevin de Bruyne, sozinho no parque de jogo.

Com Rangnick a apostar numa estratégia que abdicava de um avançado mais em posição central, juntando aos dois médios centro (McTominay e Fred) Bruno Fernandes e Pogba com possibilidade de subirem mais do que habitual e Elanga e Jadon Sancho nas alas, o Manchester United resistiu apenas cinco minutos até sofrer o primeiro golo no dérbi, com Bernardo Silva e Jack Grealish a terem uma grande combinação na esquerda mesmo em inferioridade numérica até ao cruzamento atrasado do português para o 1-0 de Kevin de Bruyne. E seria o belga a ser de novo protagonista no jogo pouco depois, obrigando De Gea a uma defesa apertada após remate cruzado na área descaído sobre a esquerda (17′). No entanto, e na primeira saída rápida que teve baliza, os red devils conseguiram o empate: grande passe de Pogba para Sancho, passagem de Bruno Fernandes pelas costas a deixar Kyle Walker na dúvida e grande remate cruzado do internacional inglês (25′).

Quem esperava um dérbi bom estava a ver um jogo ainda melhor, com essa nuance de muitas vezes entre o mérito dos visitados e o demérito dos visitantes ter apenas uma baliza. E foi esse sentido que marcou todas as incidências até ao intervalo, com uma curta paragem para assistência a um adepto: Phil Foden, num desvio de cabeça muito complicado de executar após cruzamento de Bernardo Silva, ainda acertou na parte de cima da trave; Kevin de Bruyne marcou o 2-1 na sequência de uma recarga na área num lance que começou com uma jogada de génio de Foden para grande defesa de De Gea (28′); Mahrez obrigou o guarda-redes espanhol a mais uma grande defesa após uma diagonal da direita para o meio com remate de pé esquerdo. O City explicava ao United como é jogar sem um avançado mais fixo ligando o “rolo compressor” de futebol.

Mais uma vez, Kevin de Bruyne ficou sozinho no parque e esse foi o pior filme possível para o Manchester United, que entre todas as fragilidades que foi revelando teve como principal a forma como nunca conseguiu condicionar os espaços do internacional belga que até de bola parada consegue sempre fazer a diferença: já depois de um livre em posição prometedora que acabou por não levar tanto perigo como se pensava à baliza, foi o capitão que marcou o canto na esquerda para a entrada da área onde estava Mahrez para rematar de primeira para o 3-1 (68′). E o resultado podia não ter ficado por aí, com David de Gea a impedir que o United saísse goleado do Etihad ao travar as tentativas de Mahrez e João Cancelo antes do 4-1 final de Mahrez, que recebeu nas costas da defesa e fuzilou o espanhol num lance validado pelo VAR (90′).