22 anos. Seis Europeus, cinco Mundiais. Um título europeu, uma final perdida, um quarto lugar na Alemanha, meias-finais em 2000 e 2012. Desde que falhou o apuramento para o Mundial que França organizou e conquistou, num já longínquo 1998, Portugal não voltou a falhar: seguiram-se qualificações consecutivas para todas as fases finais, entre playoffs e raras entradas diretas, muitas contas e várias noites passadas à calculadora. Esta quinta-feira, a Seleção Nacional começava a jogar um futuro que podia ser a continuação ou o fim abrupto de uma era.
Na meia-final do playoff de acesso ao Mundial 2022, contra a Turquia, Portugal sabia que uma derrota significava o adeus imediato e automático ao Qatar. Contudo, uma derrota significava muito mais do que isso: trazia consigo a quase certeza da saída de Fernando Santos, abrindo a porta a um problema de sucessão que nunca será unânime ou consensual; trazia consigo a quase certeza do abandono de Cristiano Ronaldo à Seleção, abrindo a porta ao derradeiro capítulo da carreira do avançado; e trazia consigo a quase certeza da falência de um projeto, abrindo a porta a uma obrigatória reformulação e reestruturação de uma Federação que foi campeã europeia há seis anos.
Ficha de jogo
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Portugal-Turquia, 3-1
Playoff de acesso ao Campeonato do Mundo 2022
Estádio do Dragão, no Porto
Árbitro: Daniel Siebert (Alemanha)
Portugal: Diogo Costa, Diogo Dalot, Danilo, José Fonte, Raphael Guerreiro, João Moutinho, Bruno Fernandes, Otávio, Bernardo Silva, Diogo Jota (João Félix, 71′), Cristiano Ronaldo
Suplentes não utilizados: Rui Patrício, José Sá, Nuno Mendes, Tiago Djaló, Vitinha, André Silva, William Carvalho, Rafael Leão, Gonçalo Guedes, Matheus Nunes, Cédric
Treinador: Fernando Santos
Turquia: Ugurcan Çakir, Ozan Kabak, Demiral, Söyüncü, Kutlu (Toköz, 80′), Çelik (Yusuf Yazıcı, 80′), Loku (Dursun, 90′), Çalhanoğlu, Aktürkoğlu (Enes Ünal, 67′), Cengiz Ünder, Burak Yılmaz
Suplentes não utilizados: Sinan Bolat, Altay Bayindir, Serdar Aziz, Mert Muldur, Antalyali, Caner Erkin, Abdulkadir Omur, Kaan Ayhan
Treinador: Stefan Kuntz
Golos: Otávio (15′), Diogo Jota (42′), Burak Yılmaz (65′), Matheus Nunes (90+4′)
Ação disciplinar: cartão amarelo a Çelik (35′), a Diogo Jota (35′), Çalhanoğlu (69′), a Demiral (76′), a João Moutinho (86′), a Tököz (90+6′)
Ora, nada disto se colocava — pelo menos não esta quinta-feira — se Portugal, de forma teoricamente natural, vencesse a Turquia e garantisse a presença na final do playoff, na próxima terça-feira, contra o vencedor da outra meia-final entre Itália e Macedónia do Norte. “Estamos aqui por culpa nossa e não jogámos bem contra a Sérvia mas isso faz parte do passado. Queremos estar no Mundial e temos de ganhar à Turquia. O resto passa-nos ao lado. A pressão foi sempre um sinal positivo para Portugal. Nas duas finais que disputámos, no Euro 2016 e na Liga das Nações, fomos irrepreensíveis. É o que queremos voltar a fazer, para dar uma alegria a 11 milhões de portugueses. Os nossos jogadores não se deixam influenciar pela pressão”, disse Fernando Santos na antevisão, onde também garantiu ter “poucas dúvidas” sobre o onze inicial que iria escolher.
Um onze inicial que, apesar de tudo, implicava desde logo alguns remendos. Anthony Lopes, Rúben Dias, Nélson Semedo, Rúben Neves e Renato Sanches estão lesionados, Pepe tem Covid-19, João Cancelo estava castigado e o selecionador nacional foi mesmo forçado a chamar José Sá, Tiago Djaló e Vitinha, três jogadores que não estavam na convocatória inicial, para colmatar as ausências. Desta forma, e com a única grande surpresa a ser a presença de Diogo Costa na baliza em detrimento de Rui Patrício, Fernando Santos jogava em 4x3x3 e lançava Danilo enquanto central adaptado ao lado de José Fonte, Diogo Dalot e Raphael Guerreiro nas laterais da defesa (apesar das boas exibições de Nuno Mendes no PSG) e Cristiano Ronaldo, Diogo Jota e Otávio no trio ofensivo. No meio-campo, onde existiam as maiores dúvidas, o selecionador nacional jogava pelo seguro e apostava em João Moutinho para além dos mais óbvios Bruno Fernandes e Bernardo Silva.
Diogo Costa estreia-se nesta fase de qualificação para o Mundial: é o seu 1.º jogo em competições oficiais pela Seleção????????
⚠É a 2.ª internacionalização de Diogo Costa: estreou-se em outubro, num jogo de preparação frente ao Catar pic.twitter.com/7o80LBWMf8
— Playmaker (@playmaker_PT) March 24, 2022
Do outro lado, numa Turquia orientada pelo alemão Stefan Kuntz, as atenções viravam-se obrigatoriamente para o médio Çalhanoğlu, do AC Milan, e o avançado Burak Yılmaz, do Lille, num onze que também contava com o ex-Sporting Demiral. Os turcos atuavam com uma linha clara de três centrais e Portugal procurava explorar os espaços entre linhas com as incursões de Otávio e Jota e também Bruno Fernandes e Bernardo, sendo que este último era o responsável por recuar sempre que Moutinho precisava de apoio à frente da defesa. A Seleção começou claramente melhor e por cima, com Çelik a evitar um remate de Ronaldo na grande área (2′), e anulou a Turquia quase por completo até chegar ao primeiro golo.
Ronaldo teve outra ocasião com um pontapé por cima na sequência de um passe de Dalot (9′), Diogo Jota também falhou o alvo com um desvio após um livre de Bruno Fernandes (11′) mas o golo ficou reservado para Otávio. Bernardo recebeu de Jota à entrada da grande área, atirou forte para acertar em cheio no poste e o médio do FC Porto, na recarga e totalmente sozinho, encostou para abrir o marcador (15′). Otávio fazia o segundo golo por Portugal na terceira internacionalização e colocava a equipa de Fernando Santos a vencer com apenas um quarto de hora de jogo volvido.
2.º ⚽golo de Otávio pela Seleção, na sua 3.ª internacionalização
⚠Otávio tinha marcado na estreia pela Seleção ????????, em setembro, frente ao Catar pic.twitter.com/JT4OvgJjcR
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Depois de alcançada a vantagem, contudo, a Seleção Nacional não conseguiu manter a toada ofensiva e de controlo das ocorrências e foi forçada a resguardar-se no próprio meio-campo para suster a resposta turca. Ünder foi o primeiro a avisar, com um pontapé de fora de área que Diogo Costa encaixou (21′), Kutlu cabeceou ao lado num lance em que Fonte não teve pernas para Aktürkoğlu (22′) e Orkun, na finalização de uma boa jogada de futebol ofensivo, atirou descaído na direita para mais uma defesa atenta do guarda-redes português (27′).
Ultrapassada a meia-hora e sem que a Turquia tivesse chegado ao empate nesse período de maior caudal ofensivo, Portugal recuperou algum equilíbrio e deixou de permitir tanta presença no último terço. Ainda assim, e ao contrário do que aconteceu no quarto de hora inicial, a Seleção atuava essencialmente em transição rápida e aproveitando as perdas de bola adversárias. Mesmo com a superioridade portuguesa a ficar clara em praticamente todos os setores e detalhes, Portugal ia demonstrando algumas fragilidades principalmente na reorganização defensiva depois de uma perda de bola e no corredor direito, onde Diogo Dalot não estava a ter uma noite particularmente feliz.
Mais de metade dos ⚽golos de Diogo Jota pela Seleção ???????? foram apontados de cabeça: num total de 9 golos, 5 foram de cabeça
⚠Os 5 golos de Diogo Jota nesta fase de qualificação para o Mundial foram todos apontados de cabeça pic.twitter.com/Xcp55Nuary
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Contudo, e mesmo à beira do intervalo, Portugal aumentou a vantagem. Numa jogada de insistência que envolveu um passe de calcanhar de Cristiano Ronaldo, Otávio recebeu de Bernardo à entrada da grande área e tirou um cruzamento perfeito para o poste mais distante; Diogo Jota, mesmo pressionado, voltou a mostrar que é dos melhores do mundo a jogar de cabeça e cabeceou para voltar a bater Çakir (42′). Ao intervalo, a Seleção Nacional estava a vencer a Turquia por dois golos de diferença e tinha pé e meio na final do playoff de acesso ao Mundial do Qatar — muito graças a Otávio, que era a principal ligação entre o meio-campo e o ataque e ia sendo decisivo.
???? INTERVALO | ???????? Portugal 2 – 0 Turquia ????????
???? Selecção entra e sai forte da 1ª parte ????
???? Otávio "Chora Bebé" Monteiro marcou o 1ª e assistiu o 2º ????♂️????????#PORTUR #WCQ #WCQ2022 #VamosComTudo pic.twitter.com/WtVKHpayEt— GoalPoint (@_Goalpoint) March 24, 2022
Na segunda parte, nenhum dos treinadores fez alterações e Diogo Jota teve a primeira ocasião mais perigosa, com uma tentativa de chapéu depois de uma saída mal calculada do guarda-redes da Turquia (56′). De forma natural e expectável, Portugal procurava gerir a vantagem com bola e sem grandes sobressaltos, desacelerando por completo o ritmo do jogo e esperando pelo avançar do relógio sem aplicar intensidade ou explorar verdadeiramente a possibilidade do terceiro golo. Só que, numa altura em que tudo parecia mover-se a favor da Seleção Nacional, a passividade portuguesa acabou por trair a estratégia.
Burak Yılmaz desequilibrou na esquerda, combinou com Cengiz Ünder à entrada da grande área e recebeu mais à frente, atirando rasteiro à saída de Diogo Costa e relançando o jogo (65′). Stefan Kuntz reagiu ao golo com a entrada de Enes Ünal para o lugar de Aktürkoğlu e Fernando Santos respondeu com João Félix, que rendeu Diogo Jota — apesar de, de forma clara, Cristiano Ronaldo ter sido constantemente o elemento ‘menos’ de toda a equipa ao longo do jogo, demonstrando até pouca disponibilidade para se dar aos lances.
???? 68' | ???????? Portugal 2-1 Turquia ????????
Cristiano Ronaldo é o único jogador das 2 equipas ainda sem ações defensivas#WCQ #WCQ2022 #PORTUR pic.twitter.com/3Kn5NtZKwL
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Portugal conseguiu evitar uma subida de rendimento da Turquia depois do golo, ficou até muito perto de aumentar a vantagem com um cabeceamento ao lado de Otávio (75′) mas podia ter deitado tudo a perder quando José Fonte fez falta sobre Ünal na grande área e o árbitro, depois de ir ao VAR, assinalou grande penalidade. Na conversão, porém, Yılmaz atirou por cima (85′).
William Carvalho, Matheus Nunes, Nuno Mendes e Rafael Leão entraram em campo para os últimos minutos, Portugal ainda sofreu ao longo dos cinco minutos de descontos mas, mesmo em cima do apito final, acabou por fazer xeque-mate com um golo do recém-entrado Matheus (90+4′). Num jogo em que voltou a não escapar ao stress, à pressão e ao medo, depois do golo da Turquia e face à grande penalidade de Fonte, a Seleção Nacional conseguiu capitalizar a superioridade demonstrada na primeira parte e vai defrontar a Macedónia do Norte na final do playoff de acesso ao Mundial do Qatar. Otávio foi titular, marcou, assistiu e foi o melhor jogador português — e aquele que dá a tal “alegria aos 11 milhões” que Fernando Santos havia pedido.
???? FINAL | ???????? Portugal 3 – 1 Turquia
???? Selecção assusta mas confirma ????
???? Encontro marcado com a Macedónia ????????, que eliminou a Itália ao cair do pano ????
???? Ratings, stats e xG em https://t.co/QZuwKyufuG #PORTUR #WCQ #WCQ2022 #VamosComTudo pic.twitter.com/cPu7s8Uxra— GoalPoint (@_Goalpoint) March 24, 2022