Cerca de 14 mil pessoas fugiram da violência dos últimos dias numa das regiões que compõem o Sudão do Sul, agravando a situação humanitária do país.
Os combates regressaram ao país esta sexta-feira, quando tropas do Movimento Popular de Libertação do Sudão na Oposição (MPLS-O), liderado pelo vice-presidente Riek Machar, se envolveram em confrontos com forças que haviam desertado para o campo do seu inimigo, o Presidente Salva Kiir.
As direções militares de ambos os lados, sediadas na capital, Juba, apelaram imediatamente ao fim das hostilidades, informa a agência France-Presse.
Os combates duraram até domingo e os civis do condado de Leer voltaram a pagar um elevado preço, depois de sofrerem uma grave fome em 2017, na sequência da guerra civil que opôs Machar e Kiir entre 2013 e 2018.
Entrevistado pela agência de notícias francesa ao telefone, Detoh Rie, pai de família com 51 anos, descreveu como soldados haviam atacado as aldeias, roubado gado, matado pessoas e “deitado fogo a várias habitações”, tendo incendiado também os alimentos aí guardados, deixando os refugiados sem comida.
Num comunicado emitido segunda-feira, a missão da ONU no Sudão do Sul (Unmiss) confirmou que numerosas aldeias a sul de Leer haviam sido “pilhadas e incendiadas”, mostrando preocupação face a relatos acerca da destruição no porto de Adok, nas margens do Nilo Branco, “segundo polo económico do Estado”.
As forças de manutenção da paz “intensificaram as patrulhas”, indicou terça-feira uma porta-voz, Linda Tom, avançando à France-Presse a existência de “informações inquietantes relativas a abusos sexuais, pilhagem e destruição”.
Segundo o prefeito do condado de Leer, Stephen Taker, haviam sido contabilizados 13.930 deslocados até segunda-feira, 11 de abril.
O governante afirmou: “Tudo o que eles tinham foi pilhado. A situação é verdadeiramente grave”.
O número de deslocados pode ser muito maior, dizem as autoridades, pois alguns ainda não frequentaram as infraestruturas de ajuda e outros, como Detoh Rie, preferem o refúgio dos pântanos circundantes.
Kou Tek caminhou cerca de quatro horas com a sua família para se esconder no mais profundo dos pântanos, descreve a agência francesa, a quem o refugiado narrou a destruição da sua aldeia, Waay, onde os assaltantes violaram as mulheres e raparigas, e viu oito cadáveres de homens abatidos a tiro.
Agora longe dos confrontos, este homem de 39 anos, pai de três filhos, lamentou que as crianças tenham de beber “água dos rios que não é saudável”, pelo que muitos têm “diarreia e não recebem qualquer medicamento”, tal como as pessoas idosas, que “sofrem imenso e a maioria morre de fome”.
Segundo as Nações Unidas (ONU), os confrontos registados no norte do Sudão do Sul agravam a situação humanitária local, já antes considerada “desastrosa”.
O estado de Unidade é uma região do país mais jovem do mundo especialmente habituada à instabilidade política, económica e de segurança que impera desde a sua independência do Sudão em 2011, tendo também sido alvo, nos últimos meses, das piores cheias dos últimos 60 anos.
Além de servir de campo de batalha habitual entre as forças de Machar e Kiir, o condado de Leer, controlado pelo primeiro, é um dos epicentros da crise humanitária causada por cinco anos de uma guerra civil que fez cerca de 400.000 mortos e milhões de deslocados.
Após ter sido declarado o estado de fome entre fevereiro e junho de 2017, o Alto-Comissariado da ONU para os Direitos Humanos denunciou a ocorrência de possíveis crimes de guerra na região, em 2018.