Magnus Carlsen tinha acabado de fazer a primeira jogada contra Hans Niemann. Num jogo online de xadrez, a contar para a Julius Baer Generation Cup, o primeiro desligou o ecrã e abandonou a partida sem qualquer explicação. “Vamos tentar dar atualizações sobre isto. Ele desistiu. Levantou-se e foi embora, desligou a câmera e é só isso que sabemos neste momento”, disse a comentadora que estava a acompanhar a transmissão em direto. Mas porque é que Magnus Carlsen, cinco vezes campeão mundial de xadrez, deixou um encontro de um momento para o outro?

Para responder a essa pergunta é preciso, primeiro, perceber quem é Magnus Carlsen. Aos 31 anos, o norueguês natural de Tønsberg é o líder do ranking natural de xadrez desde julho de 2011, detém o recorde do rating mais elevado que um jogador alguma vez teve na classificação da FIDE, a Fédération Internationale des Échecs (2882 pontos, em 2014) e tem também a maior série vitoriosa da história do xadrez de elite. Denominado o “Mozart do xadrez”, é um admirador de Napoleão Bonaparte, adora futebol e é adepto do Real Madrid e ostenta uma personalidade complexa que não prima propriamente pela modéstia ou a humildade.

Magnus Carlsen, o “Mozart do xadrez” que admira Napoleão e é fã do Real Madrid

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No início deste mês de setembro, Magnus Carlsen cruzou-se pela primeira vez com Hans Niemann — um norte-americano de 19 anos, Grandmaster (o título mais elevado que um jogador de xadrez pode atingir durante a carreira) desde 2021 e uma personalidade particularmente relevante no universo da rede social Twitch. Na Sinquefield Cup, em Saint Louis, aconteceu o impensável: Niemann venceu Carlsen, o que levou o norueguês a desistir de um torneio pela primeira vez na carreira. 

Na altura, Magnus Carlsen confirmou a desistência através do Twitter. “Desisti do torneio. Sempre gostei de jogar em Saint Louis e espero voltar no futuro”, escreveu, acrescentando à publicação um vídeo de José Mourinho nos tempos em que treinava o Chelsea, numa flash interview, a dizer “If I speak, I am in big trouble” — ou seja, se falar, meto-me em problemas. Depressa surgiram rumores sobre o facto de o norueguês suspeitar de que Hans Niemann fazia batota. E depressa o norte-americano reagiu a esses mesmos rumores assumindo que fez batota entre os 12 e os 16 anos mas que “aprendeu com o erro”.

“Estou a dizer a minha verdade porque não quero abrir a porta a interpretações erradas. Tenho orgulho no facto de ter aprendido com esse erro e atualmente dou tudo o que tenho ao xadrez. Sacrifiquei tudo pelo xadrez. Toda a comunidade das redes sociais, assim como todo o universo do xadrez, está a atacar-me e a inferiorizar-me. Ver o meu herói a tentar atacar-me, a tentar arruinar a minha reputação, a tentar arruinar a minha carreira e a fazê-lo de uma forma tão frívola é uma grande, grande desilusão”, disse Niemann em entrevista ao St. Louis Chess Club.

Certo é que, na sequência dos rumores, o norte-americano acabou por ser removido do popular site Chess.com, que defendeu a decisão em comunicado. “Já partilhámos com ele provas detalhadas sobre a nossa decisão, incluindo informação que contradiz as suas declarações sobre a extensão e a gravidade da batota. Convidámos o Hans para apresentar explicações e para dar uma resposta na esperança de encontrar uma solução que lhe permita participar novamente no Chess.com”, podia ler-se na nota.

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O escândalo alargou-se de tal forma que até surgiram teorias menos ortodoxas. Nas redes sociais, começou a circular a possibilidade de Hans Niemann fazer batota através da utilização de um brinquedo sexual anal com ligação wireless que recebe informação de uma terceira pessoa que está a assistir à partida e envia indicações transmitidas através de certas vibrações.

E é aqui que chegamos a esta segunda-feira e ao reencontro entre Magnus Carlsen e Hans Niemann na Julius Baer Generation Cup. Quando todo o mundo do xadrez parou para ver o novo confronto entre os dois jogadores — ainda que online e não pessoalmente –, o norueguês fez uma jogada e retirou-se da partida. Ao contrário do que aconteceu no início do mês, porém, não desistiu do torneio e ainda está em competição, tendo derrotado os dois adversários seguintes. Se Niemann faz ou não batota, ninguém sabe. Que Carlsen acha que Niemann faz batota já toda a gente percebeu.