Liderança isolada do Campeonato a menos de um mês do Mundial? Check. Primeiros 19 jogos da temporada sem qualquer derrota? Check. Vitória no Dragão mais de três anos depois e no primeiro Clássico da época? Check. Esta terça-feira, no Estádio da Luz, o Benfica disputava mais do que um jogo contra a Juventus: disputava a possibilidade de fazer mais um check, mais um certo, mais um sinal verde. Desta feita, o check que assinalava o apuramento para os oitavos de final da Liga dos Campeões com ainda uma jornada da fase de grupos por cumprir.

Poucos dias depois da sempre importante vitória no Dragão contra o FC Porto, a primeira desde março de 2019, a equipa de Roger Schmidt recebia a Juventus que derrotou em Turim há mais de um mês e tinha a possibilidade de carimbar desde logo a presença na fase seguinte da Liga dos Campeões. Para isso, não podia perder — e tinha de esperar que, à mesma hora e em Paris, o PSG também não perdesse com os israelitas do Maccabi Haifa. Na ótica do treinador alemão, porém, jogar para o empate nunca seria uma opção.

Ficha de jogo

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Benfica-Juventus, 4-3

Fase de grupos da Liga dos Campeões

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Srđan Jovanović (Sérvia)

Benfica: Vlachodimos, Alexander Bah (Gilberto, 81′), António Silva, Otamendi, Grimaldo, Florentino, Enzo Fernández, João Mário (Chiquinho, 90+4′), Rafa (Musa, 87′), Fredrik Aursnes, Gonçalo Ramos (David Neres, 87′)

Suplentes não utilizados: Helton Leite, Ristic, John Brooks, João Victor, Lucas Veríssimo, Diogo Gonçalves, Henrique Araújo, Paulo Bernardo

Treinador: Roger Schmidt

Juventus: Szczesny, Danilo, Bonucci (Alex Sandro, 60′), Gatti, Cuadrado (Miretti, 60′), Locatelli, McKennie, Rabiot, Moise Kean (Milik, 45′), Kostic (Iling-Junior, 70′), Vlahovic (Soulè, 70′)

Suplentes não utilizados: Pinsoglio, Mattia Perin, Rugani, Fagioli

Treinador: Massimiliano Allegri

Golos: António Silva (17′), Moise Kean (21′), João Mário (gp, 28′), Rafa (35′ e 50′), Milik (77′), McKennie (79′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Danilo (62′), a Enzo Fernández (84′)

“Não somos uma equipa que saiba jogar para o empate. Quando entramos no relvado, o nosso objetivo é ganhar o jogo. Amanhã será igual. Temos de acreditar em nós, ser corajosos e aproveitar o fator casa. Todas as equipas ainda podem qualificar-se e a Juventus é a Juventus. É um grande clube, com grandes jogadores, com um treinador muito experiente. Também querem continuar na Liga dos Campeões depois da fase de grupos, por isso, temos de esperar a melhor Juventus e estar preparados para jogar ao nosso melhor nível”, atirou Schmidt, que na passada sexta-feira viveu um dos dias mais marcantes desde que chegou à Luz, na antevisão.

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Assim, neste contexto, o técnico encarnado só não podia contar Draxler, que saiu lesionado do Dragão e era baixa para esta quarta-feira. Roger Schmidt não surpreendia e repetia a titularidade de Fredrik Aursnes, deixando David Neres novamente no banco — e proporcionando o regresso aos convocados de Lucas Veríssimo, que no fim de semana voltou à competição ao atuar na equipa B. Do outro lado, Massimiliano Allegri via a Juventus algo limitada pelas lesões de Di María, Pogba, Paredes, Chiesa, De Sciglio, Bremer, Kaio Jorge e Aké e lançava Locatelli, Rabiot e McKennie no meio-campo, com Vlahovic a ser a natural referência ofensiva.

Numa primeira parte intensa e em que raramente houve tempo para respirar, o Benfica depressa impôs um ascendente claro que acabaria por prolongar-se até ao intervalo. Os instantes iniciais demonstraram desde logo que a equipa de Roger Schmidt iria apostar principalmente nos desequilíbrios provocados por João Mário na direita, explorando depois a presença na grande área ou as linhas mais recuadas que pudessem ter espaço para o remate, aproveitando as subidas de Kostic e a inexperiência de Gatti nestes palcos. O primeiro aviso foi ainda dentro dos primeiros cinco minutos, com João Mário a cruzar para a área à procura da cabeça de Gonçalo Ramos e Cuadrado a intercetar (3′).

Rafa teve uma boa situação para abrir o marcador, com um pontapé rasteiro que passou ao lado depois de um erro crasso da defesa adversária (12′), Enzo atirou contra um adversário na sequência de uma grande transição rápida (14′) mas o golo, esse, estava reservado a um menino. Canto cobrado à maneira curta na esquerda, João Mário combinou com Enzo e o argentino cruzou de forma perfeita para a área, onde António Silva apareceu a desviar de cabeça para se estrear a marcar pela equipa principal do Benfica (17′). O jovem central, que nem sequer era nascido quando o Estádio da Luz foi inaugurado, fazia o primeiro golo pelos encarnados no dia em que esse mesmo estádio assinalava 19 anos de existência.

A vantagem encarnada, porém durou muito pouco. Também na sequência de um canto na esquerda e depois de um desvio inicial de Danilo, Vlahovic começou por forçar Vlachodimos a uma grande intervenção e Moise Kean aproveitou a recarga para marcar (21′) — o golo ainda foi anulado por fora de jogo mas, depois de ouvir o VAR, o árbitro da partida reverteu a decisão e declarou o lance como válido. Cinco minutos depois, a sorte voltou a cair para os que estavam a ser mais audazes. Cuadrado tocou com a mão na bola no interior da grande área italiana quando dividia uma jogada com Aursnes e João Mário, na conversão da grande penalidade, repôs a vantagem do Benfica e recuperou alguma justiça no marcador (28′).

Vlahovic ainda desperdiçou a melhor oportunidade da Juventus à exceção do golo, ao atirar ao lado na sequência de uma grande investida de Kostic na esquerda (34′), mas o Benfica respondeu da melhor forma possível. Rafa acelerou pelo corredor central, abriu na direita em João Mário e o internacional português devolveu ao avançado, que desviou de calcanhar para aumentar a vantagem encarnada (35′) e assumir o estatuto de melhor elemento da equipa de Roger Schmidt na primeira parte. Ao intervalo, o Benfica estava a vencer a Juventus na Luz. Mais: ao intervalo, o Benfica estava a anular a Juventus na Luz.

Só Massimiliano Allegri mexeu ao intervalo, trocando Moise Kean por Milik para estimular o ataque da Juventus. A lógica da primeira parte, contudo, manteve-se — e o Benfica só precisou de cinco minutos para carimbar a goleada. Grimaldo descobriu Rafa na grande área, tirou um passe perfeito e isolou o avançado português, que esperou pela saída de Szczesny para picar a bola e bisar (50′). O treinador italiano reagiu com mais duas alterações, lançando Alex Sandro e Miretti, mas a desorientação bianconeri mantinha-se e os encarnados iam aproveitando para asfixiar por completo o adversário, impedindo qualquer esboço de resposta ou transição.

O Benfica foi gerindo a vantagem com naturalidade, criando várias oportunidades não só para aumentar os números no resultado no geral como para oferecer o hat-trick a Rafa em particular, mas acabou por cometer na defesa os pecados que não estava a cometer no ataque. Milik reduziu a desvantagem já dentro do último quarto de hora, com um pontapé de primeira na grande área (77′), e McKennie fez o terceiro da Juventus escassos instantes depois (79′), aproveitando uma recarga depois de uma defesa de Vlachodimos a um remate de Vlahovic. Os dois lances tiveram em comum uma assistência de Iling-Junior, jovem inglês de 19 anos que entretanto tinha entrado e estava a brilhar na ala esquerda, e Schmidt reagiu ao trocar Bah por Gilberto.

Os encarnados sofreram nos minutos finais, até porque as alterações de Allegri tiveram impacto e a Juventus parecia uma equipa totalmente diferente no último quarto de hora, mas conseguiram segurar a vantagem — e ainda podiam ter marcado novamente, com Rafa a acertar em cheio no poste quando já só tinha o guarda-redes pela frente (86′). No fim, o Benfica voltou a vencer a Juventus e beneficiou também da goleada que o PSG aplicou ao Maccabi Haifa, em Paris, para chegar aos oitavos de final da Liga dos Campeões pela segunda temporada consecutiva.

Num dia em que a Juventus chegou a assustar com uma espécie de renascimento italiano que quase estragou a festa encarnada, a equipa de Roger Schmidt não vergou e voltou a mostrar que é muito mais um coletivo do que um conjunto de individualidades. Rafa bisou e teve momentos de brilhantismo, Alexander Bah fez das melhores exibições desde que chegou a Portugal, João Mário voltou a ser crucial e António Silva até se estreou a marcar — e nada disso, nem um bocadinho, é show off. É só show de bola.