A televisão estatal chinesa CCTV está a censurar imagens das bancadas nos jogos do Mundial, depois de a visão de milhares de adeptos sem máscara ter acirrado o descontentamento popular com a estratégia “zero covid”.

Numa comparação feita pela agência Lusa, durante o jogo França – Dinamarca deste fim de semana, entre a transmissão da CCTV e a de uma emissora estrangeira, verifica-se que o órgão estatal chinês está a substituir as imagens de adeptos nas bancadas com imagens de jogadores ou da equipa técnica, recorrendo a um atraso de cerca de 30 segundos.

Durante a transmissão na passada quinta-feira do jogo Portugal — Gana pela CCTV, por exemplo, a seleção portuguesa surgiu a cantar o hino por duas vezes, visando também substituir as imagens de adeptos nas bancadas.

A cerimónia de abertura do Mundial de futebol do Catar, seguida por milhões de chineses, evidenciou o contraste entre a China, que mantém a estratégia “zero casos” de covid-19, e o resto do mundo, com internautas a questionarem, sarcasticamente, se estarão a viver noutro planeta.

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“O Mundial arrancou e Pequim está em silêncio absoluto”, descreveu Jessica, uma hospedeira de bordo chinesa a residir na capital da China, num comentário difundido na rede social WeChat. “Sinto-me como se estivesse no fundo de um poço, a contemplar um mundo maravilhoso, com o qual não posso interagir”, acrescentou. “Qual é então o propósito de viver?”.

Protestos na China contra política Covid Zero já são também contra Xi Jinping. O que se sabe das raras manifestações contra o regime

Isto deu origem ao tema #SeráQueEstamosNoMesmoPlaneta, nas redes sociais chinesas. Muitos chineses, até então limitados à informação vinculada pelos órgãos oficiais, que continuam a descrever o mundo exterior como “devastado pelo vírus”, em contraposição com uma China segura, revelaram-se estupefactos com a ausência de regras de distanciamento social e adeptos sem máscaras.

Isto ocorre numa altura em que surtos de covid-19 obrigaram à imposição de novos bloqueios altamente restritivos em Pequim, Cantão e dezenas de outras cidades menores da China. A estratégia de “zero casos” de covid-19 inclui o bloqueio de cidades inteiras, testes em massa constantes e o isolamento de todos os casos positivos e respetivos contactos diretos em instalações designadas, muitas vezes em condições degradantes. A China mantém, também, as fronteiras praticamente encerradas desde março de 2020.

Este fim de semana, centenas de grupos de moradores em Pequim saíram dos seus condomínios, rompendo de facto com as medidas de prevenção epidémica vigentes na China, enquanto manifestações se alastram por várias cidades do país asiático, contra a imposição de medidas de confinamento. Em alguns casos, os manifestantes lançaram palavras de ordem contra o líder chinês, Xi Jinping, e o Partido Comunista da China. Protestos em larga escala são extremamente raros no país asiático.

As manifestações foram sobretudo pacificas. No entanto, em Cantão, a maior cidade do sul da China, o distrito de Haizhu tem sido palco de violentos confrontos entre trabalhadores migrantes e forças de segurança. Na cidade de Zhengzhou, no centro do país, numa fábrica da Foxconn, o grupo que monta os iPhone da norte-americana Apple, episódios de violência entre operários e forças de segurança irromperam também na semana passada.