Um dirigente da associação ambientalista GEOTA defendeu esta quarta-feira a importância de se definirem rapidamente estratégias para enfrentar as situações de maior vulnerabilidade face ao mau tempo, para reduzir os riscos ou a gravidade das consequências.

A propósito da situação de chuvas intensas e inundações vivida na última semana, nomeadamente em Lisboa, João Joanaz de Melo, do Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA), disse à agência Lusa que existem “vários tipos de mecanismos que podem ser definidos para reduzir o risco ou a gravidade das consequências nas áreas que já estão neste dia vulneráveis” e em relação às quais não é viável alterar a ocupação do solo.

“Pessoas a residirem em caves (em zona de risco de inundação), é uma situação de uma vulnerabilidade altíssima”, adiantou, considerando que “essas situações não deviam existir” e que deviam ser encontradas alternativas de habitação para esses cidadãos.

Em estabelecimentos comerciais nas mesmas zonas “ter portas estanques é um mecanismo de proteção possível” e os seguros são “uma forma mais expedita de compensar danos”, indicou o professor de Engenharia do Ambiente na Universidade Nova de Lisboa.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Tais “medidas de prevenção mais proativas” têm de ser preparadas com antecedência, disse, considerando que face à “situação trágica” da última semana “as forças de emergência, de segurança responderam o melhor que podiam“, mas que perante “fenómenos desta magnitude ou há uma grande preparação prévia e há prevenção a sério” ou o que se pode fazer “é simplesmente remediar os estragos”.

Aquelas medidas podiam ser concretizadas no curto prazo, tendo em conta que o plano de drenagem de Lisboa levará anos a construir. Caso já existisse, este sistema “não teria eventualmente resolvido todos os problemas, mas teria de certeza minorado muito a dimensão dos danos que houve“.

De acordo com João Joanaz de Melo, as “disfunções de ordenamento” do território “que desprezaram totalmente os fatores de risco, têm naturalmente um contributo muito importante para a gravidade das situações” vividas “nas últimas semanas”.

Por um lado, existe uma “construção excessiva ou indevida em leitos de cheia”, por outro, “no caso de Lisboa e de alguns outros sítios há uma excessiva impermeabilização das bacias hidrográficas”.

O especialista disse que em algumas das áreas afetadas “os problemas são recorrentes desde há alguns anos”, mas atribuiu parte da sua dimensão ou gravidade à conjugação com o processo em evolução da “alteração do clima”.

Uma das consequências do aquecimento global do planeta nas latitudes médias, como a de Portugal, são os “chamados fenómenos meteorológicos extremos, episódios seja de secas, seja de chuvas de grande intensidade e inclusive muito localizadas”, que “foi o que aconteceu em Lisboa nas últimas semanas“.

João Joanaz de Melo salientou que a situação “não é uma surpresa”, já que era prevista pelos climatólogos desde há várias décadas.

“Agora começa a verificar-se esta situação com cada vez mais frequência. Há 30 anos isto era uma teoria, hoje em dia isto é uma realidade”, afirmou, adiantando que “as previsões que existem é que esta situação tenderá a agravar-se no futuro”.

O académico pediu que a “principal função” da Reserva Ecológica Nacional (REN), “prevenir riscos para as pessoas”, seja mais reconhecida e respeitada e que das cartas de risco, dentro das cidades, sejam “tiradas consequências” e se tomem as necessárias decisões.

A questão do aumento do nível do mar e da subida da água nos estuários é outro dos fatores a ter em conta, referiu, acrescentando que as pessoas têm de se adaptar face às consequências do aquecimento global e também de contribuir para diminuir as emissões de gases com efeito de estufa, na sua origem.

“Temos de fazer, nós Portugal, nós Europa, a nossa quota-parte para diminuir este impacto a nível mundial. (…) Não podemos ignorar este assunto”, declarou.

A chuva intensa e persistente que caiu na terça-feira causou mais de 3.000 ocorrências, entre alagamentos, inundações, quedas de árvores e cortes de estradas, afetando sobretudo os distritos de Lisboa, Setúbal, Portalegre e Santarém. A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) registou 83 desalojados.

Há uma semana, o mau tempo, sobretudo nos distritos de Lisboa e Setúbal, causou a morte de uma mulher, tendo a ANEPC registado 849 ocorrências, a maioria inundações, entre as 00h00 de dia 07 e as 07h00 do dia seguinte.