He Jiankui é o autor de uma das experiências científicas mais arriscadas e eticamente questionáveis de sempre: em 2018, tornou-se no primeiro cientista do mundo a alterar o ADN de dois embriões, que deram origem a duas meninas. No ano seguinte, foi condenado uma pena de prisão de três anos no seu país natal, a China. Agora, já em liberdade, continua a viver no país e está a tentar angariar fundos junto de grandes empresas para levar a cabo novas experiências.

O paradeiro de He Jiankui é agora conhecido devido a uma entrevista com o El País.

Vivo muito bem agora”, diz o cientista por email ao jornal espanhol. “Passei algum tempo com a minha família e mudei-me para Pequim. Dediquei-me a um novo desporto, o golfe, e estou a gostar muito.”

A polémica experiência científica de He é ainda hoje alvo de fortes críticas por parte da comunidade científica. Há quatro anos, o cientista chinês modificou geneticamente dois embriões que viriam a dar origem a duas meninas gémeas. O objetivo, garante, era o de assegurar que os embriões desenvolviam resistência ao VIH, apesar de ambos os pais serem portadores do vírus.

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Na prática, contudo, He avançou para uma fertilização in-vitro com os embriões geneticamente modificados, cujas consequências são imprevisíveis, num estudo que não foi sequer acompanhado da habitual verificação pelos pares. He e os seus colaboradores acabaram condenados a três anos de prisão.

O Estado chinês não revela a identidade das duas gémeas que resultaram daqueles embriões, bem como de uma terceira rapariga que nasceu de outra experiência levada a cabo pela equipa de He. Não se sabe exatamente que consequências terá a experiência tido nestas crianças.

O trabalho deste cientista é tão controverso que provoca condenação praticamente unânime de toda a comunidade científica. Ao El País, o geneticista Kiran Musunuru comparou mesmo o trabalho de He com o dos médicos nazis que levaram a cabo experiências de eugenia e decretou que não deveria poder voltar a exercer. O Nobel da Medicina David Baltimore partilhou uma opinião semelhante: “Toda a gente merece uma segunda oportunidade, mas o erro de He Jiankui foi tão colossal que eu nunca mais financiaria as suas novas experiências na área da biomedicina.”

Questionado pelo jornal espanhol, He não quis comentar o seu passado.

Avancei demasiado depressa”, disse apenas. “A minha investigação futura será transparente e aberta a todos.”

O cientista tem agora um escritório no bairro de Daxing, em Pequim, onde funciona a organização não-governamental que fundou (Instituto de Investigação das Doenças Raras). O seu objetivo, diz, é curar doenças genéticas. Para isso, está a recolher fundos junto de grandes empresas e diz esperar receber mais de cem milhões de euros de Jack Ma, o fundador da Alibaba, e de outros empresários chineses.