A Associação Nacional dos Cuidados Continuados (ANCC) denunciou, esta sexta-feira, o encerramento de 220 camas na Rede Nacional de Cuidados Continuados (RNCCI) nos últimos dois anos, imputando ao Governo a responsabilidade do “subfinanciamento” que levará ao “colapso final” da estrutura.
Em declarações à agência Lusa, o presidente da ANCC disse que a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados “está subfinanciada há vários anos”, situação para a qual a ANCC vem alertando e que já levou ao encerramento de diversas unidades “por não conseguirem suportar os custos”.
“Tem havido aumentos de salário mínimo, aumento do custo de vida em geral, aumento do rácio de recursos humanos que o Governo obrigou por decreto, aumento da taxa social única em 2,7% ao longo dos anos, fora outros aumentos de custos. Mas depois não tem havido aumentos do laço da receita”, apontou José Bourdain.
Segundo o responsável, este aumento dos custos não tem sido acompanhado por um aumento dos preços pagos pelo Estado às unidades de cuidados continuados, o que “causa um enorme subfinanciamento, que faz com muitas unidades fechem a porta”. “Umas porque tomam a decisão de fechar, outras porque simplesmente vão à falência porque não conseguem aguentar”, revelou.
José Bourdain deu como exemplo que em janeiro de 2022, “no espaço de uma semana, foram à falência duas unidades de cuidados continuados”. Os dados da ANCC dão conta do encerramento de 220 camas nos últimos dois anos, havendo uma instituição associada que “anunciou que vai encerrar neste ano as suas 35 camas”, o que vai elevar o número total para 255 camas fechadas.
O responsável chamou também a atenção para o facto de o Governo ter incluído no Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) 5.500 novas camas para cuidados continuados. “Qual é a lógica de ir construir novas camas se o Governo deixa fechar uma boa parte das já existentes, e provavelmente em 2023 irão fechar mais”, questionou o presidente da ANCC.
Acrescentou que o dinheiro que está inscrito no PRR representa “mais ou menos 30% a fundo perdido do custo real do investimento”, o que leva o responsável a questionar que instituições terão disponibilidade para “ir à banca endividar-se em vários milhões de euros, sabendo à partida que vai começar a funcionar com prejuízo”.
Por outro lado, o presidente da ANCC compara os valores pagos pelo Governo central e do Governo da Região Autónoma dos Açores, que “paga muito melhor pelos cuidados continuados”, acusando o Executivo de António Costa de “não estar atento ao problema, deixa encerrar camas e deixa que as unidades entrem em dificuldades”.
Segundo José Bourdain, o setor está à beira da rotura, salientando que nos últimos 13 anos o Governo atualizou apenas duas vezes os valores pagos, apesar de a legislação determinar “que todos os anos os preços dos cuidados continuados são atualizados com base na inflação do ano anterior e que os preços são revistos a cada cinco anos”.
O responsável garantiu que há unidades “desesperadas”, confrontadas com valores de eletricidade que custam três vezes mais, gás que aumentou cinco vezes, e que têm agora uma despesa de luz de 9 mil euros mensais quando antes pagavam 3 mil euros, fora os aumentos de salários ou de restantes bens e serviços.
“Há unidades à beira da falência e muitas optam por fechar para não arrastar o resto da instituição”, afirmou, acrescentando que “vão haver muitas mais unidades a fechar” durante 2023.
Para definir uma proposta de valor justo a pagar, José Bourdain disse ainda que passaria por juntar profissionais do setor da saúde e elementos da área da RNCCI, para, em conjunto, olharem para o quadro de recursos humanos necessário em cada tipologia, ver quanto custa alimentação, higiene, medicamentos, e de seguida definirem um preço e acordar entre todos os parceiros que esse é o valor cobrado.