A juíza Gabriela Assunção, titular do Juiz 3 do Tribunal Central de Instrução Criminal, indeferiu a audição de 68 testemunhas e outras diligências requeridas pelos arguidos Manuel Pinho, a sua mulher Alexandra e o ex-banqueiro Ricardo Salgado. E ordenou a realização do debate instrutório no próximo dia 28 de março.
É uma decisão surpreendente que acaba por acelerar de forma significativa a fase de instrução destes autos. Assim, não será ouvida nenhuma das testemunhas que tinham sido requeridas pelas defesas, avançando-se imediatamente para a fase em que as defesas apresentam os seus argumentos finais para impedir a pronúncia para julgamento e o Ministério Público pugna pela passagem dos arguidos à próxima fase.
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Juíza recusou perícia médica a Salgado
A defesa de Ricardo Salgado alega que o seu cliente padece da doença de Alzheimer e requereu a realização de uma perícia médica. A decisão da juíza de instrução de avançar para o debate instrutório implica que tal perícia não foi deferida.
A juíza Gabriela Assunção defende no seu despacho que “não sendo invocada a possibilidade de existir uma patologia incapacitante ou anomalia psíquica aquando da prática dos factos (na perspetiva da acusação), é despicienda, nesta fase, a sua ponderação, pois tal importa especialmente à fase de julgamento e até, de um eventual cumprimento de pena ou da adequação de imposição de uma pena ou de uma medida de segurança — o que é, desde já, a premissa da norma invocada pela defesa” no seu requerimento de abertura de instrução, lê-se no despacho com data de 12 de março.
Esta decisão da magistrada do Tribunal Central de Instrução Criminal vai ao encontro da interpretação da lei defendida pelo advogado Paulo Saragoça da Matta no programa “Justiça Cega” da Rádio Observador dedicado a este tema.
Assim, a magistrada recusou a perícia médica para confirmar o diagnóstico de Alzheimer “por a mesma ser manifestamente contrária aos fins da instrução, pois independentemente do seu resultado, nunca poderia o mesmo contender com a pronúncia ou não pronúncia do arguido”.
A visão oposta à de Ivo Rosa sobre a fase de instrução
Gabriela Assunção fez ainda questão de explicar a sua visão sobre a fase de instrução criminal — que tem a particularidade de ser claramente oposta, por exemplo, à do seu colega Ivo Rosa.
“O facto de o Código de Procesos Penal estabelecer que o juiz de instrução deve proceder a uma investigação autónoma não pode ser interpretado como devendo o juiz de instrução repetir o esforço investigatório do inquérito, pois tal violaria o modelo constitucional do processo penal português”, começa por avisar a juíza.
“De igual modo, não é suposto, no modelo descrito, levar-se a cabo um esforço probatório que se assemelhe ao do julgamento, pois o juízo dirigido aos indícios suficientes é diverso do juízo dirigido a dar um facto como provado ou não”, sendo certo que este entendimento da magistrada “é seguido independentemente da extensão do inquérito e da prova da acusação, da natureza dos crimes e de quem possam ser os arguidos”.
As defesas tinham requerido a audição de um total de 68 testemunhas — Alexandra Pinho tinha pedido três, o seu marido tinha requerido 29 e Salgado tinha pedido 36 testemunhas. Foram todas recusadas com o argumento de que uma boa parte já tinha sido ouvida em fase de inquérito, sendo “a repetição da prova de cariz dilatório”. Enquanto que outras nada têm a ver com os factos em discussão na fase de instrução.
Recorde-se que os procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto acusaram Manuel Pinho em dezembro de 2022 de ter sido alegadamente corrompido por Ricardo Salgado enquanto foi ministro da Economia de José Sócrates. Estão em causa dois crimes de corrupção ativa imputados ao ex-líder do BES e dois crimes de corrupção passiva imputados a Pinho.
Manuel Pinho e a sua mulher Alexandra foram ainda acusados de crimes de fraude fiscal e branqueamento de capitais, sendo que Salgado viu ainda o Ministério Público a imputar-lhe em regime de co-autoria com o casal Pinho o crime de branqueamento.
A defesa de Manuel Pinho, a cargo de Ricardo Sá Fernandes, apenas admite a alegada prática de um crime de fraude fiscal, sendo que refuta, tal como os restantes arguidos, a alegada prática de crimes de corrupção.
Quer as diferentes nulidades, quer a prescrição de diversos crimes alegada por todas as as defesas, serão decididas pela juíza Gabriela Assunção na decisão instrutória que será lida após a conclusão do debate instrutório.