“Não podem passar. Estão a decorrer os ensaios.” Quase todo o edifício onde decorre o Portugal Fashion parou ao início da tarde desta quinta-feira para o ensaio do desfile de Marques Almeida. Ao longe, vislumbravam-se tonalidades fluorescentes, chapéus de cowboy, tie dye e algum pelo.
Depois do ensaio seguimos as modelos até aos bastidores e, por trás da cortina, entramos no universo Marques’Almeida. Entre filas de charriots várias pessoas andavam de um lado para o outro. Destacavam-se as modelos por serem altas e vestirem cores fortes enquanto se fotografavam umas às outras, punham a conversa em dia sentadas no chão, bebiam kombucha e trincavam uma peça de fruta — houve até quem desse uns passos de dança. Fita cola dupla para colar a roupa ao corpo e atacadores de ténis para ajustar sandálias tornaram-se ferramentas de último recurso.
Enquanto Paulo Almeida fazia os ajustes finais nas roupas de algumas modelos, Marta Marques preparava as pequenas manequins desta apresentação. Modelos de palmo e meio, entre eles as duas filhas dos designers, que percorreram a passerelle de mão dada com algumas modelos a usar criações Marques’Almeida Kids e até tiveram direito a um pouco de blush antes do desfile.
Com tudo a postos, os convidados rumaram aos seus lugares na sala de desfiles e arrancou o espetáculo. O ponto de partida foi o início dos anos 2000, a época em que os próprios designers começaram a consumir moda, e levaram-nos até lá. O sports wear das calças com muitos bolsos e os looks em cabedal contrastaram com saias de cauda e corpetes. À ganga juntaram-se os vibrantes tons de verde ácido e rosa choque e o desfile acabou com looks bem peludos em cores fluorescentes. Nos acessórios, que sempre foram uma questão fundamental para a dupla, destacaram-se as perneiras, em mood desportivo com atilhos e ilhós, e a cobrir o calçado. E ainda os chapéus de cowboy, o resultado de uma colaboração com a marca portuguesa de acessórios Hurricane.
Embora as criações Marques’Almeida já tenham sido usadas por várias celebridades de fama mundial, a dupla continua a ver as pessoas comuns como a melhor montra do seu trabalho. “Fico muito contente quando vejo alguém completamente desconhecido na rua a usar [peças da marca]. É muito gratificante”, confessa Paulo Almeida e explica que no toca às celebridades, o processo de escolha das peças passa por stylists e nem sempre é uma escolha pessoal. “As primeiras vezes que entrávamos num autocarro e víamos uma pessoa a usar uma coisa nossa era das coisas mais gratificantes que podia haver”, conta o designer. “Cada vez que cai uma order na online shop vamos ver o que é que encomendaram, para onde foi e quem será a pessoa. Isso para nós dá muito mais gozo”, acrescenta Marta Marques. Em Portugal ainda não têm ponto de venda, mas a loja online está à distância de alguns cliques.
As memórias tricotadas por Susana Bettencourt e o foco no brilho de Nopin
Susana Bettencourt foi outro dos destaques do dia e é também um dos nomes na loja pop up do Portugal Fashion no El Corte Inglés de Gaia, ao lado de Diogo Miranda e Pé de Chumbo. Na sala de desfiles a designer levou-nos à boleia pelo seu universo encantado das malhas. A coleção chama-se “Pechisbeque”, contudo nada tem a ver com dourados ou joias, mas sim com a criatividade da ilusão. Nas peças em malha, este conceito traduziu-se num jogo de ilusão de ótica em que um padrão abstrato era, na verdade, a ilusão de um drapeado bidimensional. Juntam-se também os losangos típicos das camisolas dos avôs traduzidas em esburacados, crochets e outros efeitos. O fio condutor da coleção são as memórias de infância da designer, por isso brotam também por toda a coleção pequenas flores feitas em crochet pela equipa da designer, mas que foram também as primeiras coisas que fez em pequena, segundo contou ao Observador.
A paleta de cores contou com vibrantes tons de azul e laranja. Enquanto o primeiro é uma das cores assinatura da marca, a segunda é uma cor que a designer associa aos coletes clássicos dos avôs. As peças deste desfile chegam à loja online da marca já no dia seguinte. Primeiro apenas cinco peças e, ao longo dos próximos dois meses, chegará o resto da coleção, dividida por cores e temas. Este desfile não foi, portanto, uma apresentação de propostas para o outono/inverno 2023/24 porque a designer optou por ignorar as estações. “O meu objetivo é que isto chegue cada vez mais ao público e que o público não tenha de esperar seis ou sete meses para adquirir as nossas peças.”
Deste segundo dia de Portugal Fashion destacamos ainda o desfile de Nopin. Catarina Pinto apresentou uma coleção recheada de brilhos. As peças de estrutura rígida inspiradas em alfaiataria contrastaram com efeitos de folhos, franjas e drapeados. Entre ganga, veludo e texturas acetinadas o brilho foi uma presença obrigatória, nos tecidos, ou nas costuras. A paleta de cores contou com preto e ganga escura, mas foram o vermelho, o rosa choque e o verde alface que se destacaram. A coleção chama-se Olympia, um nome que resulta da desconstrução da palavra Myopia, uma inspiração na disfunção ocular que dificulta o foco. Pode recordar neste link o artigo para o qual o Observador acompanhou a Nopin nos bastidores antes do desfile na edição de outubro de 2022.
Na galeria, veja as melhores imagens que marcaram o calendário de quinta-feira.