A memória de um monarca britânico de visita à Alemanha não está longe, Isabel II e o príncipe Filipe estiveram lá em 2015. Mas para Carlos III e Camilla a viagem tem especial significado. Foram recebidos por multidões eufóricas para os ver, cumprimentaram inúmeros fãs e passaram por eventos animados e outros de pesado simbolismo da altura da II Guerra. Cada um ao seu estilo, deixaram ambos a sua marca nesta viagem: o Rei esbanjou charme intelectual, e a rainha provou que domina o uso do guarda-joias real com mestria.
O destino da primeira visita de Estado do reinado de um monarca tem muito simbolismo e, o facto dos destinos escolhidos serem França e Alemanha teve como objetivo mostrar que a Europa é a prioridade diplomática do Reino Unido. Depois da sua coroação em 1953, a primeira viagem de Isabel II foi um roteiro por países da Commonwealth.
A violência crescente das manifestações em solo francês levaram o gabinete do presidente Macron a adiar a visita dos Reis com apenas alguns dias de antecedência. Contudo, a ida à Alemanha manteve-se e, como esperado na quarta-feira, dia 29 de março, Carlos e Camilla aterraram em Berlim. Os Reis viajaram num avião da Royal Air Force (RAF) e à chegada à Alemanha foram escoltados no ar por duas aeronaves germânicas, num sinal de respeito. A viagem passou por duas cidades, começou em Berlim e terminou em Hamburgo.
Um Rei, dois discursos
Carlos III fez dois discursos que ficarão para a história do seu reinado. Primeiro, no banquete de Estado oferecido pelo presidente alemão na primeira noite da viagem. No segundo, tornou-se o primeiro monarca britânico a discursar no parlamento alemão, o Bundestag. Em ambas as ocasiões o Rei falou em alemão e foi muito elogiado.
O banquete teve lugar no Palácio presidencial Bellevue, onde estiveram dignitários de ambos os países. Neste discurso, o Rei prometeu estreitar laços com o país que o estava a acolher e elogiou a “generosidade do espírito do povo alemão” ao receber mais de um milhão de refugiados ucranianos desde o início da guerra com a Rússia, realçando os “valores democráticos partilhados”. O discurso contou ainda com um tema que lhe é especialmente querido, o combate às alterações climáticas, e com uma homenagem à Rainha Isabel II.
“Over all these years, and in so many ways, I have been struck by the warmth of the friendship between our nations and by the vitality of our partnership in countless areas.”
His Majesty addresses guests at a State Banquet at the Bellevue Palace. #RoyalVisitGermany pic.twitter.com/d0KUFISDWs
— The Royal Family (@RoyalFamily) March 29, 2023
No parlamento alemão, o Rei falou da ligação histórica entre os dois países. Disse que era “difícil expressar o orgulho” que sente na relação entre Reino Unido e Alemanha e que espera “renovar a promessa de amizade entre as duas nações”. Carlos III voltou a referir o conflito na Ucrânia e as alterações climáticas. Mencionou ainda a II Guerra Mundial e a antiga rivalidade que separa os dois países no que toca ao futebol, lembrando a final do ano passado em futebol feminino.
“Today, it gives me particular pride to be with you once again, now as King, and to renew the special bond between our two countries."
His Majesty becomes the first British monarch to address the Bundestag in session during #RoyalVisitGermany. pic.twitter.com/7zGApUsPVf
— The Royal Family (@RoyalFamily) March 30, 2023
Um banquete e várias joias
O banquete de estado em Berlim, no Palácio Presidencial, exigia um verdadeiro look real e a rainha consorte cumpriu. Na primeira noite desta visita à Alemanha, Camilla usou um trio de joias recheadas de significado. Comecemos pela tiara, uma daquelas preciosidades com nome próprio: tiara Greville, também descrita pelo seu característico efeito de colmeia. A rainha mãe era quem mais a usava, mas desde que Camilla se juntou à família real esta tornou-se uma das suas escolhas recorrentes. A escolha da rainha ganha uma dimensão sentimental quando nos lembramos que o Rei Carlos tinha uma forte relação com a avó e assim, ela marca de certa forma, presença nesta marco do seu novo reinado.
As histórias do guarda-joias da rainha: os diamantes são eternos e as pedras vieram de todo o mundo
A joia foi criada pela casa Boucheron em 1921 para a Dama Margaret Greville, filha de um magnata da cerveja e da sua amante que se viria a casar com o aristocrata Ronald Greville, em 1891, membro da Casa de Marlborough. Esta dama da alta sociedade ficou viúva 17 anos depois de casar, mas continuou a manter a sua vida ativa de socialite, filantropa e colecionadora de joias. Margaret Greville era muito amiga da amante do rei Eduardo VII, que era também a bisavó da atual rainha consorte e foi mesmo madrinha da avó de Camilla, Sonia Keppel. É uma joia com laços históricos e familiares para ambos os reis. Esta tiara foi parar ao guarda-joias da mãe da Rainha Isabel II, entre um conjunto de outras peças. A rainha lamentava ter poucas joias suas e com esta herança viu a sua coleção aumentar consideravelmente. Foi ela a responsável por mandar acrescentar um grande diamante e quatro filas de pedras de uma antiga pregadeira e as alterações forma feitas pela casa Cartier, segundo conta o Telegraph.
O colar, por seu lado, trouxe à memória a Rainha Isabel II. Embora seja uma peça do século XIX, chegou à então princesa Isabel como um presente pelo casamento com o príncipe Filipe, em 1947. O Colar Fringe da Cidade de Londres foi uma oferta de um coletivo de empresários. Nos primeiros anos de reinado, Isabel II fez deste colar uma das suas peças assinatura. Segundo conta o jornal britânico, a rainha usava joia com frequência em jantares e banquetes durante viagens a países da Commonwealth. Mas também o podemos ver à volta do pescoço da monarca em retratos da época da sua coroação (que aconteceu a 2 de junho de 1953). Camilla, recém-chegada ao papel de rainha terá escolhido trazer um pouco do brilho que iluminou a sogra também nos seus primeiros tempos como soberana. Esta terá mesmo sido a primeira vez que alguém, além de Isabel II usou este colar.
O trio de joias reais com significado fica completo com a Ordem da Família Real da Rainha Isabel II. Camilla usou também um par de brincos com diamantes e a Estrela Garter, a Grande Cruz (Classe Especial) da Ordem Federal de Mérito, que lhe havia sido dada pelo Presidente da Alemanha naquele dia, conta a Tatler. Como que pensado para destacar todas estas joias, a rainha usou um vestido preto com bordados prateados. A criação tem a autoria do designer Bruce Oldfield, que foi o escolhido para desenhar o vestido que Camilla usará na cerimónia da coroação, em maio.
A tradição das pregadeiras
Camilla parece ser a herdeira do gosto da Rainha Isabel II por pregadeiras. Ao longo desta viagem manteve a tradição da antiga monarca de passar mensagens e homenagens com as joias que leva ao peito. No segundo dia de visita à Alemanha, em que os Reis visitaram o parlamento alemão, um mercado e a ópera Komische, a rainha usou a mesma pregadeira que tinha usado no casamento do príncipe William com Kate Middleton. Camilla trouxe os príncipes de Gales para esta viagem através na peça em ouro e diamantes da joalheira Van Cleef & Arpels.
No terceiro e último dia de viagem, os Reis fizeram uma viagem de uma hora e 45 minutos entre Berlim e Hamburgo, onde foram recebidos por multidões com sorrisos, apertos de mão, um barco numa garrafa de vidro e até uma bolacha gigante. Camilla voltou a trazer a Rainha Isabel II para esta viagem com uma das pregadeira de maior significado no guarda-joias da anterior monarca. Uma pregadeira com uma grande safira azul rodeada por 12 diamantes com uma estrutura em ouro, um presente de casamento do príncipe Alberto para a Rainha Victoria. A joia foi encomendada na casa Garrard, fornecedora da coroa britânica durante muitos anos, e terá encantado a noiva que a usou no dia do casamento e fez dela uma herança da coroa, ou seja, tem passado para todas as rainhas que a seguiram (tanto a soberana como as consortes), segundo regista o Daily Mail. Esta foi também uma homenagem ao príncipe Alberto, que era de origem alemã. A joia sobressaía ainda mais no casaco azul escuro que Camilla usou, uma criação de Anna Valentine uma das designers dos seus dois looks de casamento com o príncipe Carlos, em 2005.
Outras curiosidades ficam para a história desta viagem, como por exemplo o Rei a fazer queijo. Ou o facto de ter à sua espera o Bentley do Estado, segundo conta a Hello, que terá sido transportado pela própria marca do veículo. Quando a Rainha Isabel II visitou este país em 2015, também tinha o seu carro bordeux para a transportar. Este é um dos dois carros que a Bentley ofereceu à anterior monarca por ocasião do seu Jubileu de Ouro, em 2002.
A visita dos Reis à Alemanha acabou esta sexta-feira, dia 31 de março, numa altura em que a cerimónia da coroação está a pouco mais de um mês de distância.