A esquizofrenia é uma doença mental “bem conhecida” e que, sem tratamento, pode tornar-se “extremamente incapacitante” ao nível das interações sociais. Para minimizar estas dificuldades, Nuno Madeira, psiquiatra no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, espera acrescentar ao leque de tratamentos disponíveis a estimulação magnética transcraniana (EMT), técnica que será testada no projeto de investigação com o qual venceu a terceira edição do Science Award Mental Health, promovido pela Fundação Luso-Americana Para o Desenvolvimento (FLAD).

O psiquiatra e investigador no Coimbra Institute for Biomedical Imaging and Translational Research (CIBIT) considera que ao longo das últimas décadas os medicamentos e tratamentos para pessoas com esquizofrenia “evoluíram muito”. No entanto, aponta que ainda existe um caminho a percorrer, particularmente no que diz respeito às dificuldades na cognição social — que está relacionada com as interações sociais e a adaptação dos nossos comportamentos em função da avaliação que fazemos dos outros.

A disfunção cognitiva social pode ser “muito incapacitante” e não só agravar uma tendência para o isolamento, como também dificultar ou impedir o desempenho laboral e prejudicar as relações afetivas, explica Nuno Madeira em declarações ao Observador. “É um problema frequente nas pessoas com a esquizofrenia e que melhora pouco com os medicamentos e intervenções psicológicas disponíveis“, acrescenta.

O financiamento de 300 mil euros atribuído pela FLAD — o maior prémio em Portugal na área da saúde mental — vai permitir dar início ao ensaio clínico e testar a técnica de estimulação cerebral EMT no tratamento de dificuldades sociais em pessoas com esquizofrenia. Nas edições passadas já foram premiados o psiquiatra Pedro Morgado, com um projeto para melhorar o diagnóstico e o tratamento da perturbação obsessivo-compulsiva, e Manuela Silva, com uma iniciativa para contratar pessoas com doença mental grave para ajudar doentes psiquiátricos a voltar à vida normal.

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Manuela Silva quer contratar pessoas com doença mental grave para ajudar doentes psiquiátricos a voltar à vida normal

Estimulação magnética transcraniana: um tratamento “seguro” e “indolor” para tentar tratar a esquizofrenia

O projeto de investigação liderado por Nuno Madeira vai decorrer ao longo dos próximos três anos e deverá envolver na fase inicial do ensaio um grupo de cerca de quarenta pacientes. Mas como funciona, afinal, o tratamento de EMT? “De uma forma simplificada, a EMT recorre a um dispositivo que, colocado por alguns minutos sobre a cabeça, emite impulsos eletromagnéticos semelhantes aos da ressonância magnética, mas que nesta técnica servem para estimular determinadas áreas do cérebro”, refere Nuno Madeira. Um processo “seguro e indolor”, garante o psiquiatra.

Este processo é diferente da eletroconvulsoterapia (ETC) — vulgarmente conhecida como terapia de eletrochoques –, uma técnica mais agressiva que pode exigir uma anestesia e causar alguma confusão após o tratamento. Este risco não se verifica no caso da estimulação cerebral EMT, que, de acordo com Nuno Madeira, é uma técnica que não tem propriamente contraindicações e que, de modo geral, pode ser usada em qualquer pessoa com o diagnóstico de esquizofrenia, incluindo mulheres grávidas.

O projeto vai avançar com uma equipa de cerca de sete investigadores de diversas áreas. Vai contar com a colaboração de engenheiros biomédicos e psicólogos do CIBIT, bem como psiquiatras que desenvolvem a sua atividade principal no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra.

“Se confirmarmos a nossa hipótese e o ensaio clínico demonstrar resultados positivos, teremos uma nova arma para combater estas importantes dificuldades que as pessoas com diagnóstico de esquizofrenia enfrentam no dia-a-dia“, sublinha Nuno Madeira.

Segundo o investigador, a técnica EMT já está disponível em vários hospitais públicos portugueses e já mostrou “resultados interessantes” noutras doenças mentais, nomeadamente a depressão. O psiquiatra acredita acredita que nos próximos anos poderá ser a nova opção de tratamento acessível a pessoas com esquizofrenia.

Mental é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com a Saúde Mental. Resulta de uma parceria com a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) e com o Hospital da Luz e tem a colaboração do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Psicólogos Portugueses. É um conteúdo editorial completamente independente.

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