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Projeto que quer melhorar o diagnóstico e o tratamento da perturbação obsessivo-compulsiva vence o maior prémio de saúde mental em Portugal

Pedro Morgado é o vencedor da primeira edição do Science Award Mental Health com um projeto sobre a perturbação obsessiva-compulsiva, uma doença "invisível", mas que pode causar "muito sofrimento".

Embora afete 4% da população portuguesa, a perturbação obsessivo-compulsiva (POC) continua a ser “negligenciada” dentro da psiquiatria. Mas Pedro Morgado, psiquiatra do Hospital de Braga e investigador da Escola de Medicina da Universidade do Minho, espera melhorar o diagnóstico e o tratamento da doença, com um projeto que foi o vencedor da primeira edição do Science Award Mental Health, promovida pela Fundação Luso-Americana Para o Desenvolvimento (FLAD), e que tem como objetivo apoiar trabalhos na área da saúde mental.

“Esta doença não tem tido muita atenção”, começa por dizer o médico, que também indica que, como a “investigação é quase toda feita nos hospitais e nas universidades”, as empresas farmacêuticas acabam por não apostar no desenvolvimento de tratamentos para a doença. “As empresas têm um maior interesse quando existe um potencial negócio”, indica Pedro Morgado, que caracteriza a POC como sendo “menos prevalente que outras doenças psiquiátricas”, o que a torna “pouco mediática”.

O financiamento de 300 mil euros atribuído pela FLAD, o maior prémio na área da saúde mental em Portugal, será, por isso, um importante marco para a investigação clínica da doença, que se começa a manifestar em “idades precoces” e que acompanha grande parte da vida dos doentes.

Chega mesmo a ter “um impacto significativo na vida dos pacientes” e pode tornar-se “incapacitante”. Os doentes veem-se enredados em “pensamentos intrusivos contra a sua vontade”, o que lhes provoca “ansiedade e muito sofrimento”. Estas “obsessões”, assinala Pedro Morgado, fazem com que os doentes tenham “comportamentos absurdos”, como, por exemplo, “evitar tocar em alguma coisa” ou “lavar as mãos constantemente”.

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Pedro Morgado reconhece que, apesar do impacto, a doença tem "pouco mediatismo" na psiquiatria

Os problemas não se ficam por aqui. Pedro Morgado considera a POC uma “doença invisível”, porque muitas vezes os pacientes “têm vergonha e têm dificuldades em reconhecer” a patologia. “Muitos sofrem sozinhos, durante muitos anos, apesar de — ao contrário da maioria dos doentes psiquiátricos — eles terem consciência do absurdo dos seus atos”, indica o psiquiatra.

"Muitas pessoas encontram estratégias que atrasam a procura de respostas mais eficazes e isto dificulta o tratamento. O prognóstico é tanto pior quanto mais tempo demorar o início do tratamento".
Pedro Morgado

A pandemia de Covid-19 também originou que muitos pacientes com POC “agravassem a sua doença”, dado que existiu uma maior “comunicação dos riscos de contágios por Covid-19”, o que teve um “impacto negativo” nas obsessões e, por consequência, nos comportamentos. Ainda assim, na generalidade da população, “os sintomas de POC diminuíram durante a pandemia”, salienta o psiquiatra.

As duas vertentes — melhorar a eficácia e o novo fármaco

Com o apoio da FLAD, o médico vai conseguir desenvolver um projeto inovador sobre a POC (A new hope for resistant Obsessive-Compulsive Disorder – innovative strategies for outcome prediction and treatment), que se divide em duas vertentes.

A primeira vertente do projeto do psiquiatra passa por entender qual é o melhor tratamento para cada caso indiviual. Pedro Morgado explica que, para tratar a doença, os pacientes ora são medicados com antidepressivos (que atuam no neurotransmissor de serotonina), ora lhes é recomendada a frequência de consultas de “psicoterapia técnica de intervenção cognitiva comportamental”. Com um destes tratamentos — ou com a combinação de ambos –, “metade dos pacientes melhoram e ficam bem”.

No entanto, para outra metade que padece POC estes tratamentos não resultam, continuando a sofrer diariamente com a doença. É-lhes então receitado “outros medicamentos e antidepressivos, como antipsicóticos, que possuem mais efeitos secundários”. Após estes tratamentos, algumas pessoas acabam por melhorar, mas ainda há algumas que “continuam a sofrer muito”, indica o psiquiatra.

Neste contexto, um dos objetivos do projeto é, através da realização de ressonância magnética funcional, “tentar prever a resposta aos diferentes tratamentos”. Isso vai permitir “reflexionar quais são os tratamentos mais diferenciados” e também “poupar tempo”, refere Pedro Morgado, uma vez que vai permitir perceber qual é a melhor opção para medicar cada pessoa, não havendo, portanto, a necessidade de experimentar diferentes métodos.

"Vai-se tentar encontrar vias para um melhor diagnóstico da perturbação obsessivo-compulsiva e também para que haja maior eficácia dos tratamentos".
Pedro Morgado

Já a segunda tarefa da investigação passa por realizar um ensaio clínico a pacientes com POC que não respondem aos tratamentos convencionais de um medicamento já existente no mercado — o Pramipexole –, mas que normalmente é administrado a doentes que sofrem de Parkinson. Este tratamento vai atuar na dopamina, contrariamente aos antidepressivos habituais — que atuam no neurotransmissor de serotonina.

Pedro Morgado diz que já se provou “a eficácia na melhoria de sintomas” deste fármaco em pessoas resistentes ao tratamento num ensaio clínico no Reino Unido. Além disso, também já se provou “atenuar doenças obsessivas hereditárias” em estudos pré-clínicos realizados em animais.

Estes ensaios clínicos para uma nova utilização de um tratamento “é algo raro em Portugal”, sendo que se “torna especialmente importante” em pacientes com POC, uma vez que “aproximadamente 50% dos pacientes têm resistência aos tratamentos de primeira linha”.

Candidatura de Pedro Morgado foi escolhida entre dezenas

A primeira edição do Science Award Mental Health recebeu dezenas de candidaturas na área da saúde mental. Pedro Morgado foi o vencedor, mas a FLAD assegura que recebeu propostas “diversas” de “alta qualidade” e que tocaram em “temas importantes”, especialmente num ano em que a pandemia de Covid-19 fragilizou ainda mais a saúde mental dos portugueses.

O projeto vencedor de Pedro Morgado "tem como objetivo caracterizar a função e a estrutura do cérebro na perturbação obsessivo-compulsiva"

“As doenças e perturbações mentais são cada vez mais comuns e incapacitantes”, sinaliza Elsa Henriques, administradora da FLAD, sendo por isso importante “contribuir para que seja mais fácil para cada um de nós assumir a vulnerabilidade, pedir ajuda, entender o outro, perder o medo de dizer que não estamos bem e queremos estar melhor” — algo particularmente importante com a POC, em que muitos pacientes têm vergonha de assumir a doença.

O projeto vencedor desta edição acabou, de acordo com Elsa Henriques, por “predizer a eficácia de diferentes tratamentos na perturbação obsessivo-compulsiva”, tendo sido avaliado por um comité científico composto por Catarina Resende de Oliveira, Miguel Xavier e Margaret Lanca.

Jurados da primeira edição do Science Award Mental Health

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Catarina Resende de Oliveira

  • Professora catedrática da Faculdade de Medicina de Coimbra;
  • Presidente da Agência para a Investigação Clínica e Inovação Biomédica;
  • Ex-Diretora do Centro de Neurociências e Biologia Celular.

Miguel Xavier

  • Professor Catedrático na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade NOVA de
    Lisboa;
  • Diretor do Programa Nacional de Saúde Mental (DGS);
  • Psiquiatra no Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental.

Margaret Lanca

  • Professora Assistente no Departamento de Psiquiatria da Harvard Medical School;
  • Presidente do Massachusetts Psychological Association;
  • Diretora do Adult Neuropsychology and Psychological Testing and Training da Cambridge Health Alliance.

Com este prémio, a fundação pretende “apoiar jovens investigadores que, desvendando a complexidade de múltiplas influências genéticas, sociais e ambientais, se proponham desenvolver e validar estratégias mais eficazes de prevenção, soluções terapêuticas e abordagens de reabilitação” em Portugal, num dos países da OCDE com maior consumo de ansiolíticos e antidepressivos e onde 1 em cada 5 portugueses sofre de perturbações psiquiátricas (uma incidência apenas ultrapassada pelas doenças cardiovasculares).

O prémio será entregue anualmente a projetos de “mérito em colaboração com centros de investigação nos Estados Unidos”. A iniciativa conta mesmo com o reconhecimento Organização Mundial da Saúde, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e também da ministra da Saúde, Marta Temido, que enalteceu o “estímulo que vem dar à investigação científica portuguesa”. “Esta é uma valiosa contribuição para a melhoria da saúde mental das populações, uma prioridade relativamente à qual não há mais tempo a perder no trabalho de políticos, dirigentes, clínicos e investigadores”, acrescentou a governante.

Para Pedro Morgado, o financiamento vai permitir “aplicar novas soluções para a perturbação obsessiva compulsiva”, para além de trazer “visibilidade” a uma doença que costuma estar marginalizada dentro das doenças psiquiátricas.

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